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Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

Esporte brasileiro carece de um LeBron James

O maior jogador atual de basquete se tornou uma das principais vozes de apoio ao movimento negro nos EUA. Brasil precisa de ídolos que não se escondam atrás da fama

Lebron James politica Trump racismo
Lebron James veste camisa em protesto de jogadores da NBA contra violência policial.

Após o assassinato de George Floyd, um homem afro-americano asfixiado em abordagem de um policial branco em Minneapolis, os Estados Unidos entraram em convulsão social sob uma potente onda de indignação contra o racismo que dizima vidas negras. Não demorou nem um dia para que estrelas do esporte fizessem coro às manifestações, entre elas LeBron James, maior jogador de basquete da atualidade, que, ao utilizar seu prestígio para confrontar a violência de Estado, se tornou uma das principais vozes de suporte ao movimento negro nas redes sociais.

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FILE PHOTO: Soccer Football - Coupe de France - Semi Final - Olympique Lyonnais v Paris St Germain - Groupama Stadium, Lyon, France - March 4, 2020  Paris St Germain's Neymar celebrates scoring their second goal from the penalty spot    REUTERS/Benoit Tessier/File Photo
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Há quem diga que LeBron poderia fazer mais, tal qual a tenista japonesa Naomi Osaka, que, além de apoiar os protestos, saiu às ruas para engrossá-los. Mas o simples gesto de demonstrar empatia pela causa, por parte de um astro com projeção universal, revela a grandeza de um atleta com histórico de posicionamentos políticos contundentes. Como ativista pelos direitos de minorias étnicas, sempre externou seu repúdio a políticos ultraconservadores como Donald Trump. Participou de comícios do Partido Democrata e doou recursos para a campanha de Barack Obama. Em 2017, teve a casa atacada por pichações racistas. Nada que o intimidasse em sua jornada combativa.

“Não importa quanto dinheiro você tenha, o quão famoso você seja ou quantas pessoas te admirem. Ser negro nos Estados Unidos é difícil”, disse o jogador em um pronunciamento. “O ódio contra afro-americanos acontece todos os dias. Temos um longo caminho a percorrer como sociedade até nos sentirmos realmente iguais.” Criado pela mãe em um bairro onde o massacre de negros era parte da rotina, LeBron James quer ser uma referência para seus filhos e os jovens pobres atendidos nos projetos sociais que financia não só pelo que faz em quadra, mas, acima de tudo, pela maneira como se comporta fora dela.

Desde o início da carreira, ele tem marcado posição sobre a opressão racial no país. Em 2014, encabeçou um ato de jogadores da NBA indignados com o não indiciamento de um policial que assassinou o afro-americano Eric Garner — que assim como George Floyd, também morreu por asfixia. LeBron entrou em quadra vestindo a camisa I can’t breathe! (Não consigo respirar), em alusão ao homicídio por sufocamento. Três anos depois, manifestou apoio irrestrito ao quarterback Colin Kaepernick, jogador de futebol americano que se ajoelhava durante a execução do hino nacional em protesto contra a violência policial.

Boicotado por franquias da NFL após levantar voz, Kaepernick, um dos inspiradores do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), virou ativista antirracista em tempo integral e, recentemente, criou um fundo para contratar advogados em defesa de manifestantes detidos nos Estados Unidos. Iniciativa também apoiada por LeBron James, que, em sua primeira postagem sobre o assassinato de Floyd, relembrou os gestos de Kaepernick com uma provocação oportuna: “Entendem o porquê agora? Ou não está claro para vocês?”. Ainda compartilhou uma mensagem do ex-quarterback rebatendo a frieza dos que condenam as manifestações que se espalharam pelo país por causa dos episódios de vandalismo: “Quando a civilidade leva à morte, revoltar-se é a única reação lógica. Temos o direito de revidar”.

A partir do momento em que o melhor jogador de uma modalidade amplifica os anseios de seus iguais, que, por não terem os mesmos privilégios de atleta famoso, acabam aniquilados pelas forças policiais, todo o esporte se sente impelido a tomar partido. Cobrado por raramente se manifestar nos tempos em atividade, o ex-superstar do Chicago Bulls, Michael Jordan, divulgou um comunicado no último domingo expressando seu descontentamento com os frequentes assassinatos de homens afro-americanos. Na Fórmula 1, o hexacampeão mundial e único piloto negro da categoria, Lewis Hamilton, se mostrou revoltado com a passividade dos colegas de profissão sobre os protestos nos EUA. Imediatamente, outros pilotos e até mesmo sua equipe, a Mercedes, adentraram o debate racial.

No Brasil, as manifestações contra o racismo entre jogadores do esporte mais popular do país ainda são raras e isoladas. Casos de Bruno Henrique, Gabriel, Vinicius Jr., Paulinho e Richarlison, que se pronunciaram nos últimos dias sobre a morte do garoto João Pedro, de 14 anos, assassinado em uma operação policial no Complexo do Salgueiro. Taison, que reagiu a ofensas racistas de torcedores ucranianos. Everton Ribeiro, que revelou disposição de aprender mais sobre racismo estrutural com ativistas negros. Tchê Tchê, que apoiou os protestos em Minneapolis. Igor Julião, Elias, Junior Urso e Ludmila, que abordam temas raciais com admirável frequência. Ou Lucas Santos, jovem revelação do Vasco que aponta o dedo em direção a governos por políticas genocidas nas favelas.

Entretanto, a regra ainda é o silêncio, sobretudo entre os jogadores de maior visibilidade da seleção. Neymar foi cobrado por posicionamentos depois de postar foto com um figurino cor-de-rosa. Nesta terça-feira, publicou uma imagem no Instagram com a hashtag #blackouttuesday. Ao longo de sua carreira, o craque, que já disse não se reconhecer como negro, evita temas considerados espinhosos, à la Michael Jordan e Pelé. Instigado por uma agência de publicidade, emplacou em 2014 a campanha “Somos Todos Macacos”, sugerindo não levar tão a sério ofensas e deboches racistas. Passado o burburinho, o melhor jogador brasileiro da atualidade, alvo constante de insultos discriminatórios em estádios pela Europa, nunca mais se portou como um militante combativo contra o racismo. Nem mesmo em ocasiões especiais, como o Dia da Consciência Negra, se sente à vontade para sair da zona de conforto.

Nos Estados Unidos, jogadores precisam ter boas notas na escola para seguir no esporte. Muitos terminam a faculdade antes de chegar a equipes profissionais. Por aqui, há pouco interesse pela formação cidadã dos atletas. Manifestações sobre o que acontece além do campo são desencorajadas desde as categorias de base, perpetuando o pensamento despolitizado de que as contribuições sociais possíveis para um esportista de alto rendimento se restringem a institutos filantrópicos ou ações pontuais de caridade. O jogador é induzido a presumir que qualquer fala que saia do script imposto pelo sistema pode ser prejudicial à carreira e aos negócios.

Disposto a se expor aos críticos e opositores de suas ideias, LeBron James continua sendo o jogador mais bem pago e com o maior número de patrocinadores da NBA. O líder do Los Angeles Lakers prova que é viável associar uma trajetória lucrativa no esporte ao ativismo. Seria fundamental ao esporte brasileiro, principalmente neste cenário de ascensão dos movimentos de extrema direita, contar com uma voz tão representativa e influente contra o racismo como a de LeBron. Não se trata de complexo de vira-lata. Somente uma constatação de que o país que já teve figuras politicamente engajadas do naipe de Sócrates e Reinaldo hoje carece de ídolos que não se escondam atrás da fama e da alienação.

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