O tabuleiro eleitoral em 10 grandes capitais e os desafios dos blocos políticos nacionais
Bloco liderado pelo presidente Bolsonaro entra nas eleições de 2020 sem organização partidária capaz de organizar inúmeros candidatos em um projeto político de maior fôlego
Grandes cidades constituem importantes bases eleitorais, em que os principais partidos ou blocos partidários apresentam e defendem suas ideias e formam novas lideranças. Isso é verdade, em particular, para os partidos que têm pretensões de disputar a presidência da República em 2022, pois eles enfrentam nas eleições municipais o desafio de manter a lógica eleitoral nacional mesmo com o predomínio de temas e lideranças locais. Analisamos aqui o posicionamento, no tabuleiro eleitoral de algumas das maiores cidades do país, de quatro dessas forças políticas nacionais: PT e Bolsonaro, que estiveram no segundo turno de 2018; a coligação PSDB/DEM, que busca recuperar seu prestígio na centro-direita; e a coligação PSB/PDT, articulada por Ciro Gomes (PDT) e outras lideranças de centro-esquerda, que questionam o protagonismo petista. As cidades analisadas são as 10 maiores (censo 2010), excluída Brasília: São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Belo Horizonte, Manaus, Curitiba, Recife, Porto Alegre e Belém.
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Embora tenha chegado ao segundo turno nas eleições presidenciais de 2018, o PT vem de um abrupto fracasso nas eleições municipais de 2016, quando elegeu apenas um prefeito dentre as 92 maiores cidades do país, e chega a 2020 com sua liderança contestada na esquerda. Isso ocorre mesmo entre partidos estritamente de esquerda, como o PSOL, ou que foram aliados eleitorais de primeira hora nas últimas décadas, como o PCdoB. Motivados pela crise do protagonismo petista e pelo fim das coligações em eleições proporcionais, essas agremiações concorrem diretamente com o PT em quase todas as dez cidades analisadas, com exceção de Recife, onde Marília Arraes (PT) conseguiu obter o apoio do PSOL, e o PCdoB declarou apoio a João Campos (PSB).
Ainda assim, é importante destacar que o PT lançou candidato próprio em oito das dez principais cidades do país, sendo as únicas exceções: Porto Alegre, onde apoia Manuela D'Ávila (PCdoB) e Belém, onde apoia Edmílson Rodrigues (PSOL), antigo prefeito petista, que migrou para o PSOL já depois de ter deixado o cargo. Desse modo, o PT realiza um esforço significativo para defender seu programa e seus feitos nas principais cidades brasileiras.
Não é somente o PT que tem um grande desafio pela frente. Na centro-esquerda, Ciro Gomes (PDT) e algumas lideranças do PSB tentam concertar esforços para fazer frente à liderança petista. Na centro-direita, PSDB e DEM se articulam para tentar recuperar o espaço perdido para a extrema direita em 2018. Os partidos de cada um desses dois blocos apresentam comportamento bastante similar no Congresso Nacional. Entretanto, a organização de coligações eleitorais mais sólidas e com pretensões nacionais se mostra tarefa árdua. A coligação PSDB/DEM lançou candidatos em quatro das dez cidades, enquanto a coligação PSB/PDT em cinco. É importante observar que estão aqui desconsiderados os casos em que os partidos não conseguiram se coligar em torno de candidato próprio, ou apoiam um terceiro candidato, em geral lançado por um partido do “Centrão”. Isso se justifica porque, nessas duas situações, há clara prevalência da lógica local sobre a nacional.
Sobre a força política de Jair Bolsonaro, cabe notar que ele parte de uma dificuldade inicial, já que fracassou em criar, a tempo hábil para as eleições municipais, o partido Aliança pelo Brasil. O que temos, assim, é uma imensa pulverização de candidatos que ou receberam apoio do presidente, ou em favor dele se manifestaram, na esperança de receber dividendos eleitorais. Das 10 cidades, apenas em Porto Alegre não há, por ora, candidato evocando ligação com o presidente. Em Curitiba, Salvador, Fortaleza e Recife, há pelo menos um candidato bolsonarista, enquanto em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Manaus e Belém há dois ou mais. As candidaturas de apoiadores de Bolsonaro estão dispersas em inúmeros partidos, que vão desde o Novo e PSL, até partidos do “Centrão”, como PRTB (também do vice-presidente Hamilton Mourão), PROS e Patriota. É importante frisar que não se consideram aqui as candidaturas de extrema direita críticas de Bolsonaro, como é o caso de Joyce Hasselman (PSL) em São Paulo.
Um destaque cabe ao Republicanos, partido historicamente associado à Igreja Universal e que abriga as duas principais candidaturas apoiadas pelo presidente: Celso Russomano, em São Paulo, e Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro. Ambos aparecem bem posicionados em suas respectivas cidades. Elas mostram, ao mesmo tempo, a força e a fraqueza do movimento liderado por Jair Bolsonaro: importante respaldo eleitoral, mas ainda dependente de outras organizações para defender e ampliar seu projeto. Assim, o presidente e seu grupo político mais próximo entram nas eleições de 2020 sem uma organização partidária capaz de organizar os inúmeros candidatos e grande apoio eleitoral em um projeto político de maior fôlego. Será difícil, por conta disso, efetuar o cálculo do sucesso ou fracasso do presidente nas eleições municipais.
Todas as quatro forças políticas aqui analisadas enfrentam desafios. As pesquisas divulgadas pelo Ibope até dia 7 de outubro mostram que, em comum, todas têm de enfrentar uma disputa fundamentalmente centrada em lideranças e temas locais. Nenhuma das quatro prevalece de forma clara no tabuleiro das dez principais cidades do país. A maior relação com a política municipal, precisamente, é o que garante, por ora, o melhor desempenho da coligação PSDB/DEM, que lidera as pesquisas em três cidades e está em segundo em outras duas. Seus candidatos são, via de regra, lideranças já consolidadas em suas cidades, como é o caso de Bruno Covas (PSDB) em São Paulo, Eduardo Paes (DEM), no Rio de Janeiro, e Bruno Reis (DEM), apoiado pelo atual prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM). O desafio dessa coligação é o de construir pontes entre essas lideranças locais e o projeto nacional que planeja para 2022.
Para o PT, o desafio maior é o de usar sua densa organização partidária para construir novos quadros e tentar afirmar sua liderança em bases eleitorais urbanas, que cumpriram papel fundamental na história de crescimento do partido. Já o Bolsonaro, inversamente, corre o risco de ver a onda de extrema direita fazer espuma nos próximos anos, se não conseguir organizar minimamente as diversas candidaturas (e eventuais prefeitos) que o apoiam em um projeto de maior fôlego. Esse será o preço de sua incapacidade de liderar organizações partidárias capazes de sustentar as pautas que hoje mobilizam parte do eleitorado.
Leonardo Martins Barbosa é cientista político na Poliarco Inteligência Política. Doutor em Ciência Política pelo IESP/UERJ. É pesquisador do Núcleo de Estudos sobre o Congresso (NECON) e do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), tendo ampla experiência em análise de cenários políticos, com foco em comportamento partidário e arena legislativa.
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