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Marília Arraes: “Estar no PT hoje é um ato de resistência”

Após ter sua candidatura ao Governo de Pernambuco sacrificada por acordo entre PT e PSB, neta de Miguel Arraes explica suas razões para ter continuado no partido

Marina Rossi
Marília Arraes, em ato de campanha.
Marília Arraes, em ato de campanha.Arthur Marrocos (Divulgação)
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No último sábado, o candidato à Presidência do PT, Fernando Haddad, esteve pela segunda vez, em menos de um mês, em Pernambuco. Passou pelo Recife, Caruaru e Petrolina, consolidando sua presença entre um eleitorado já amplamente conquistado. Haddad tem no Estado 24% de intenções de voto, o que o coloca na liderança da corrida, segundo o Datafolha desta semana. Com tanta popularidade, o palco do presidenciável é praticamente irresistível para os candidatos locais que querem associar sua imagem a dele, e, como consequência, ao maior cabo eleitoral do Nordeste, o ex-presidente Lula. Mas a oportunidade não atrai Marília Arraes (PT), candidata a deputada federal. Ela se recusa a subir nesse palanque. “Se Paulo [Câmara, governador e candidato à reeleição pelo PSB] estiver, eu não vou”, disse ela ao EL PAÍS dois dias antes do evento. “Não posso estar no mesmo palanque que ele”. No sábado, Arraes cumpriu a promessa. Não compareceu em nenhuma das atividades de campanha do presidenciável por seu Estado.

Paulo Câmara já havia confirmado presença nas três cidades, assim como fez quando Haddad esteve pela primeira vez em Pernambuco, no início do mês. Na ocasião, o governador grudou no presidenciável, gravou com ele um programa de Governo em Caetés, participou ao lado dele de caminhada por Garanhuns, subiu ao palco, e só saiu de perto de Haddad quando o petista partiu, já à noite, para Maceió. No último sábado, isso se repetiu e o governador esteve ao lado de Haddad em toda a agenda do petista pelo Estado. Em Pernambuco, o PT é um dos 13 partidos que fazem parte da coligação na chapa do candidato do PSB. Uma aliança que só foi possível pela retirada da candidatura de Marília ao Governo, à revelia dela. Em troca, o PT garantiu a neutralidade dos socialistas na campanha nacional e um outro acordo regional em Minas Gerais.

Marília tinha fortes chances de desbancar a reeleição do governador, aparecendo tecnicamente empatada com Câmara nas pesquisas locais. Apesar disso, a neta de Miguel Arraes diz que não tem mágoa. Em entrevista concedida ao EL PAÍS em seu comitê no Recife na última quinta-feira, a vereadora afirmou que vinha trabalhando já de olho no Palácio do Campo das Princesas, sede do Governo pernambucano, desde que fora reeleita à Câmara Municipal em 2016. Mesmo assim, ela sustenta uma posição firme diante da rifada de sua candidatura por seu próprio partido. “Política não se faz perdoando ou com mágoa, é uma questão de coerência. Todo mundo sabe que Paulo Câmara não tem posicionamento fixo, ele vai de acordo com a conveniência”, diz. Então, ressentimento não tem, mas eu espero que o partido aprenda com esse episódio".

A candidata argumenta que o PSB não só apoiou Aécio Neves (PSDB) no segundo turno das eleições de 2014, como também foi a favor do impeachment de Dilma Rousseff em 2016. E que, por isso, é incoerente que o PT divida hoje o palanque com o partido cujo um dos fundadores foi seu avô. Para ela, o PSB ficaria neutro de qualquer maneira, ainda que sua candidatura fosse mantida, e não faria aliança com Ciro Gomes, algo que o PT temia. “O PSB não ia decidir tomar posição por nenhum dos lados", diz. Perguntada por quê seu partido não teve essa percepção, afirmou “não saber”. “Acho que a percepção do PT em relação ao PSB foi equivocada nesse processo”.

Apesar das críticas à sua sigla, onde está desde 2016 após uma briga política no PSB envolvendo seu primo, Eduardo Campos, ela diz que não pensou em sair do PT quando sua candidatura fora suspensa. “Acredito que hoje estar no PT é um ato de resistência a tudo o que está acontecendo”. Para além das razões ideológicas nas quais Marília se debruça, há uma questão prática: se quisesse lograr alguma candidatura, ainda que a deputada, deveria se manter onde estava. Os prazos para filiação partidária já haviam se esgotado quando tudo aconteceu. Ou seja, se ela mudasse de sigla, só conseguiria concorrer nas próximas eleições.

Herança política

Seja porque realmente não teve mágoa, seja porque os prazos legais haviam chegado ao fim, a vereadora se manteve no PT. E contrariando o diretório estadual, mantém a posição de não subir no mesmo palco que Paulo Câmara e tampouco declarar voto nele. Deixa no ar a pergunta sobre em quem votará para governador, afirmando que “pode ser” que se posicione em favor de outro candidato, o que deve acontecer na próxima semana, já que faltam menos de três semanas para o pleito.

De acordo com as pesquisas locais, a disputa em Pernambuco está entre o atual governador (35% das intenções de voto, segundo o Datafolha desta semana) e Armando Monteiro, do PTB (31%). Os demais candidatos não passam de 2%. Em um cenário em que há 24% dos votos brancos ou nulos, algumas artimanhas utilizadas pelos postulantes confundem ainda mais o eleitor. Julio Lóssio (Rede), por exemplo, anunciou aliança com dois dos principais cabos eleitorais de Jair Bolsonaro (PSL) no Estado —e acabou expulso da sigla. Nessa esteira, Armando Monteiro usa como símbolo da campanha uma estrela laranja, remetendo ao símbolo do PT. Questionada, Marília joga a responsabilidade para o candidato. “Tem que perguntar sobre isso para ele”, diz. E por que seu partido não contesta? “Aí tem que perguntar ao PT”, afirmou, claramente enrubescida.

Não deve ter sido a primeira vez que Marília se envergonhou da situação política em seu Estado envolvendo sua sigla. Nas ruas, ela afirma que os eleitores perguntam “o tempo todo” sobre o apoio do PT ao PSB e a suspensão de sua candidatura ao Governo. Sobre a aceitação de Haddad no Estado, Marília diz que, no corpo a corpo, a resposta é positiva. Mas graças a Lula. “As pessoas votam em que Lula indicar. Votam no 13”, afirmou quando perguntada se os eleitores com quem ela conversa conhecem Fernando Haddad.

Neta de Miguel Arraes e prima do ex-governador Eduardo Campos, Marília rejeita o rótulo de política hereditária. Quando comparada a seu primo de segundo grau, João Campos (PSB), filho de Eduardo Campos e também candidato a deputado federal, diz que a sua situação não tem “nada a ver” com e dele. “Sou a neta mais velha de Arraes e convivi muito com ele. Faz parte da minha formação a convivência, mas não significa que para mim política seja um assunto de família”.

Mas é difícil desassociar a família da política. Além do sobrenome que Marília carrega, a foto do avô está presente em parte do seu material de campanha. Por outro lado, Miguel Arraes é evocado também nas campanhas de João Campos e até de Paulo Câmara. “Muitos podem usar a figura de várias pessoas. Mas poucos são referenciados com atitudes que lembrem as atitudes daqueles com quem você aparece na publicidade”, critica a vereadora. "Colocar a imagem lá, qualquer um pode colocar até a Justiça mandar tirar. Mas ser associado por outras razões, poucos são como a gente é”.

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