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Morte da irmã de Evo Morales por coronavírus aprofunda a divisão política na Bolívia

Esther Morales morreu no domingo, aos 70 anos, em Oruro. Exilado na Argentina, ex-presidente boliviano não poderá se despedir dela

Esther Morales, irmã de Evo Morales, durante uma entrevista com à agência Efe em Barcelona, em 2012.
Esther Morales, irmã de Evo Morales, durante uma entrevista com à agência Efe em Barcelona, em 2012.Marta Perez (EFE)

A morte por covid-19 da irmã mais velha do ex-presidente Evo Morales, Esther Morales de Willcarani, aos 70 anos, na cidade do Oruro, provocou uma nova polêmica entre os seguidores e os detratores do líder boliviano. “Por que tanto ódio, racismo e perseguição política que me impedem de ver, pela última vez, a minha única irmã. Para mim, Esther foi minha mãe. A história julgará”, escreveu Evo Morales em um dos vários tuítes que dedicou ao falecimento. O político está exilado na Argentina. O Governo da presidenta interina Jeanine Áñez – que manifestou suas condolências – move seis processos judiciais contra o seu antecessor que o impedem de retornar ao país sem ser preso. Outros rivais políticos de Morales, embora lamentando sua perda, recordaram que eles tampouco puderam acompanhar os enterros de seus parentes quando estavam exilados ou com liberdade de movimentos restringida dentro da Bolívia durante o Governo dele.

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Os principais jornais bolivianos, como El Deber e Página Siete, noticiaram que Esther morreu porque os hospitais onde poderia ter recebido terapia intensiva careciam de oxigênio, devido a bloqueios rodoviários mantidos por seguidores de Morales desde a semana passada. Essa informação, porém, não pôde ser verificada. Estes protestos foram protagonizados pelos sindicatos pertencentes ou vinculados ao Movimento ao Socialismo (MAS), o partido de Morales, em protesto contra o adiamento das eleições presidenciais, justificado pela pandemia.

“Queimaram a casa dela tentando matá-la, insultaram-na a vida toda, e agora que finalmente morreu dizem que descanse em paz, mas não deixam de repetir que morreu por culpa do seu irmão, porque na verdade não querem que descanse em paz, querem continuar a humilhá-la morta como fizeram em vida”, escreveu José Daniel Llorenti, um dos seguidores de Morales com grande visibilidade nas redes. Outros militantes do MAS recordaram que as UTIs estão saturadas desde muito antes dos protestos.

Esther era a principal referência feminina na vida do ex-presidente, pois muito cedo ele foi afastado da sua mãe por razões econômicas. Além disso, as meninas camponesas bolivianas contribuem fundamentalmente para a criação de seus irmãos mais novos. Martín Sivak, biógrafo de Morales, conta que Esther deveria se chamar Estefanía, mas seu pai, Dionisio Morales, mudou o nome no último momento, assim como fez com Evo, que era para ser Evaristo. Esther “muitas vezes se encarregava dos menores Evo e Hugo e dos animais. Enchiam a pança de milho torrado, às vezes pamonha e chuño [batata desidratada]”, escreve Sivak. Sua mãe, María, tinha ensinado aos filhos sobre a necessidade de viverem com o que tinham. “Se temos, fazemos; se não temos, não fazemos”, recordava Esther de ter ouvido da sua mãe, quando precisou trabalhar numa casa de classe média, em Oruro, onde que não lhe davam de comer suficientemente.

Esther se casou com Ponciano Willcarani, com quem viveu em Oruro, dedicada ao comércio. Teve três filhos. Quando seu irmão se tornou dirigente camponês, foi várias vezes obrigada a pedir sua liberdade. “Quando eu era dirigente e me detinham e confinavam, ela me defendia e reclamava pela minha liberdade. Ela me acompanhou nos momentos mais duros sem se importar com represálias. Nunca ocupou cargos públicos, e apesar disso, no golpe de 2019 queimaram sua casa e a perseguiram”, recordou o ex-presidente depois de sua morte.

Por causa do ataque à sua casa, horas antes da renúncia de Evo Morales, em 10 de novembro do ano passado, Esther teve que fugir para o México, como também fez seu irmão, mas depois retornou ao seu país. “A Bolívia é uma só, mas aqui parecem duas Bolívias. Por meu irmão darei a vida, não vou permitir que toquem nele”, disse em sua última aparição pública. Quando seu irmão estava no auge de seu poder, quis ser a primeira-dama da Bolívia, ou seja, assumir as honras cerimoniais em geral reservadas às esposas dos presidentes, mas Evo recusou o pedido, argumentando que essa função deveria desaparecer, por ser machista.

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