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Abel Ferreira, o sucessor de Jesus que tem a chance de estabelecer ‘soberania’ portuguesa na América

Palmeiras enfrenta o Santos na final da Libertadores, após 20 anos sem chegar à decisão do torneio. Pela segunda vez consecutiva, a competição continental pode ser conquistada por um técnico de Portugal

Abel Ferreira Palmeiras final Libertadores
O treinador português Abel Ferreira conduziu o Palmeiras à final da Libertadores.Sergio Moraes

Quando o Palmeiras entrar em campo para enfrentar o Santos neste sábado, no Maracanã, pela final da Copa Libertadores, haverá do outro lado do Atlântico um país novamente atento à disputa do título mais cobiçado da América. Pela segunda edição seguida, o torneio pode ser conquistado por um treinador português. Em menos de quatro meses no comando do time palmeirense, Abel Ferreira já superou, inclusive, números do compatriota Jorge Jesus, campeão continental com o Flamengo em 2019.

“Não gosto de fazer comparações. Acredito que o melhor de mim está para chegar”, frisou o técnico ao rechaçar paralelos com a trajetória de Jesus no Brasil. “Não vivo do trabalho dos outros. Minha preocupação é olhar para dentro, corrigir os meus erros. Com minhas virtudes e meus defeitos, só penso em dar o melhor de mim para ajudar o Palmeiras e os jogadores.” O discurso motivacional, que parece ter sido importado das dinâmicas de coaching, surtiu efeito imediato, encantando elenco, diretoria e torcedores. Em seus primeiros 20 jogos à frente da equipe alviverde, registrou aproveitamento melhor que o do início do ex-treinador do Flamengo.

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Assumiu o time classificado para as oitavas da Libertadores, uma herança de Vanderlei Luxemburgo, demitido por não conseguir emplacar uma sequência de bons jogos, apesar de ter conquistado o Campeonato Paulista e cravado a melhor campanha da fase de grupos do torneio continental. Com Abel, o Palmeiras, de grandes investimentos em jogadores como Luiz Adriano, Gustavo Gómez, Matías Viña, Felipe Melo e o artilheiro Rony, enfim, convenceu. Passou com autoridade por Delfín e Libertad até encontrar o River Plate na semifinal.

Escalando um meio-campo repleto de jovens, formado por Danilo (19), Gabriel Menino (20) e Patrick de Paula (21), anulou as principais fortalezas do time de Marcelo Gallardo e impôs um arrebatador 3 a 0 no jogo de ida, na Argentina. Porém, no Allianz Parque, o conjunto tão exaltado de Abel sofreu uma pane e, graças a intervenções precisas do VAR, que anulou corretamente um gol e um pênalti do River, respirou aliviado assim que o árbitro encerrou a partida vencida por 2 a 0 pelos argentinos. “O Gallardo é melhor treinador do que eu, e os jogadores deles são mais experientes que os nossos. Mas a única maneira de ganhar experiência é assim, vivendo situações como essa”, reconheceu o português ao elogiar o colega de profissão e, ao mesmo tempo, valorizar a classificação à final da Libertadores.

Superar um River que venceu duas Copas continentais e chegou a cinco semifinais nos últimos seis anos sob a batuta de Gallardo deu ainda mais credibilidade ao trabalho de Abel. Em poucos meses, transformou o Palmeiras em um time tão competitivo quanto o Flamengo de Jesus, mas com diferenças marcantes de estilo. Enquanto o compatriota fez o rubro-negro carioca jogar o futebol mais vistoso do país, o técnico palmeirense molda sua equipe de acordo com o adversário, priorizando a organização defensiva e contragolpes em alta velocidade. Foi assim que desbancou o River e, como se não bastasse, chegou também à final da Copa do Brasil, cujo rival será o Grêmio. Não por acaso, o Palmeiras tem a segunda melhor defesa do Campeonato Brasileiro, competição da qual Abel resiste em abrir mão, embora a preferência declarada dos torcedores seja a Libertadores.

O sucesso de Jorge Jesus, que retornou a Portugal em julho, ajudou a abrir portas para outros treinadores lusitanos no Brasil. Além de Abel, Jesualdo Ferreira foi contratado para dirigir o Santos e, mais tarde, Ricardo Sá Pinto desembarcou no Rio de Janeiro para comandar o Vasco. Nenhum deles, entretanto, esteve próximo de alcançar o êxito do último campeão da América. Cada um durou apenas 15 jogos. E, ao contrário de Jesus, não deixaram saudades em seus respectivos clubes. “Quando comecei a jogar, havia muitos técnicos brasileiros em Portugal”, lembrou Abel, ex-lateral-direito de carreira modesta, em sua apresentação no Palmeiras, tirando o peso da escola portuguesa em sua formação. “Minha referência no futebol é o conhecimento. São os livros, as pessoas, os portugueses, os brasileiros, todos aqueles que encontrei no passado, pois sou fruto das minhas experiências. Antes de vir para cá, falei com portugueses e brasileiros para aprender sobre o Brasil.”

Rapidamente adaptado ao insano calendário do futebol brasileiro, Abel Ferreira caiu nas graças dos palmeirenses não somente pelos resultados, mas pelo perfil discreto e agregador. “Somos todos um”, repete o técnico ao pregar a união entre clube, jogadores e torcida. De seus comandados, gosta de sentir o que chama de “perfume do suor”, sempre que seu time alcança vitórias com mais transpiração que inspiração. “Para mim, trabalhar aqui tem sido uma experiência engrandecedora. Estamos vivos em três competições e vamos buscar uma por uma. As finais foram feitas para se ganhar”, afirma. De volta à final da Libertadores após 20 anos, o Palmeiras pode dar a Abel seu primeiro título como treinador, que, por sua vez, tem a chance de coroar a soberania recente dos técnicos portugueses na América.

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