Lewandowski pressiona Anvisa e libera compra de vacinas por governadores caso agência não cumpra prazo de 72 horas
Liminar do ministro do STF autoriza estados e municípios a importarem vacinas já registradas em agências internacionais se Anvisa não cumprir prazos para avaliar pedidos emergenciais ou se o plano nacional for descumprido
Se a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não der o aval para uso de vacinas já registradas em agências reguladoras internacionais em um prazo de até 72 horas, prefeitos e governadores poderão importar diretamente as doses. A autorização vem de uma decisão liminar do ministro do STF, Ricardo Lewandowski, nesta quinta-feira (17). A Anvisa havia pedido dez dias para analisar os pedidos de autorização emergencial, mas a lei da pandemia já previa este prazo de 72 horas. O esforço geral dos governadores, porém, tem sido no sentido de que a campanha de vacinação seja articulada nacionalmente. O governador de São Paulo João Doria mudou novamente sua estratégia e anunciou que o instituto Butantan deverá pedir a autorização emergencial para o imunizante da Sinovac no dia 23 de dezembro ―antes, disse que pediria diretamente o registro definitivo― e que a campanha no Estado pode ser iniciada já em meados de janeiro. Nos últimos dias, o Ministério da Saúde apresentou oficialmente seu planejamento de imunização. E o ministro Eduardo Pazuello afirmou que o Brasil poderá receber mais de 60 milhões de doses até fevereiro dos laboratórios Astrazeneca, Sinovac e Pfizer.
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Vacinas autorizadas por pelo menos uma das agências sanitárias citadas por lei ― da União Europeia, Estados Unidos, Japão ou China ― e distribuídas comercialmente nos respectivos países poderão ser adquiridas por gestores locais, caso não seja cumprido o plano nacional de vacinação ou “não proveja cobertura imunológica tempestiva e suficiente contra a doença”. A decisão acontece em meio a críticas de uma suposta inércia do Governo Federal e de suspeitas de politização na agência. “Poderão dispensar às respectivas populações as vacinas das quais disponham, previamente aprovadas pela Anvisa, ou se esta agência governamental não expedir a autorização competente, no prazo de 72 horas, poderão importar e distribuir vacinas registradas por pelo menos uma das autoridades sanitárias estrangeiras e liberadas para distribuição comercial nos respectivos países”, determina Lewandowski.
O presidente da Anvisa, Antônio Barra, afirmou que o prazo de 72 horas parece “exíguo”, mas que a agência só saberá as possibilidades reais de cumpri-lo quando houver um pedido efetivo, o que ainda não aconteceu. “As determinações do egrégio Supremo Tribunal Federal são determinações cumpridas”, afirmou em entrevista à CNN. “É claro que prazos podem ser difíceis de serem cumpridos por conta do volume de informações (...) Temos uma preocupação, sim, com o prazo”, acrescentou.
Pazuello diz que Brasil está na “vanguarda” no planejamento da vacinação
Apesar de estar imerso em uma enxurrada de críticas nas últimas semanas pela demora para apresentar a estratégia brasileira de vacinação contra a covid-19, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello afirmou nesta quinta-feira (17) que o Brasil está na vanguarda do mundo com o seu planejamento ―mesmo com países como Reino Unido, Estados Unidos e Rússia já tendo iniciado seus programas nacionais de vacinação. Segundo o ministro, o Brasil pode receber 24,7 milhões de doses das vacinas da Astrazeneca, da Pfizer e da Sinovac no mês de janeiro, caso estes imunizantes recebam o aval da Anvisa e cumpram o cronograma de entrega estabelecido em memorandos de entendimentos. Até o momento, o Governo só tem contrato assinado para a aquisição de doses com a Astrazeneca. Mesmo considerando estas três vacinas, a previsão é de chegar a 93,4 milhões de doses até março ― o que vacinaria pouco mais de 42 milhões de pessoas, considerando a necessidade de duas doses por pessoa e as perdas por eventuais problemas logísticos.
“Nós não estamos sendo atropelados, nós estamos numa vanguarda”, afirmou Pazuello, um dia depois de apresentar oficialmente o plano operacional de vacinação brasileiro. O documento já incluía a intenção de aquisição da Coronavac ―vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac com parceria de produção pelo instituto Butantan, vinculado ao Governo de São Paulo―, mas não especificava um cronograma com o quantitativo de doses previstas. O ministro diz que a campanha pode começar em janeiro, se houver registro da Anvisa e se os laboratórios conseguirem entregar as doses negociadas. “Estamos presos na entrega e no registro (pela Anvisa)”, ponderou o ministro. A partir disso, a previsão é de cinco dias para que as vacinas cheguem aos Estados.
Diante das negociações, o Ministério da Saúde espera receber 24,7 milhões de doses em janeiro, 37,7 milhões em fevereiro e 31 milhões de doses em março ― somando 93,4 milhões de doses no primeiro trimestre. Pazuello explica ainda que os Estados devem receber doses proporcionais à sua população de grupos prioritários estabelecidos pelo plano nacional. O quantitativo previsto até agora inclui produção da Astrazeneca, da Sinovac e da Pfizer. O país ainda negocia com a Janssen e participa do consórcio global Covax Facility para aquisição, além de contar com as vacinas que deverão ser produzidas pelo Butantan e pela Fiocruz. Pazuello afirmou que o contrato com o instituto Butantan está sendo redigido e criticou os termos da Pfizer ― que já está sendo aplicada no Reino Unido, nos Estados Unidos e no Canadá e que foi aprovada nesta quinta (17) no Chile e no Equador ― para fechar um acordo.
Críticas à negociação com a Pfizer
Segundo o ministro, o laboratório Pfizer quer isenção de responsabilidade se houver algum problema com efeitos adversos e que só responderá em tribunais internacionais. O ministro também disse que as primeiras negociações incluíam poucas doses e a responsabilidade para o armazenamento a menos 70 graus. “A segunda proposta só mudou a caixa de isopor. Ela quer as mesmas cláusulas de isenção de responsabilidade e julgamento em tribunais internacionais. E pasmem: nós estamos pensando em aceitar”, afirmou o ministro, que defendeu o uso emergencial de vacinas com a homologação da Anvisa e pediu confiança à agência.
O ministro também disse que há possibilidade de permitir a compra de vacinas contra o coronavírus pelo sistema privado, mas apenas após atingir as metas estabelecidas para a aquisição pelo SUS, que terá prioridade. “É um plano só, é um país só. Não haverá separação por Estado nem por classe”, afirmou Pazuello - embora, ainda nesta quinta-feira, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), tenha reafirmado a intenção de iniciar o programa estadual em 25 de janeiro. A vice-presidente do Conselho Nacional de Secretarias municipais de Saúde (Conasems), Cristiane Martins, destacou que já está planejado um programa de capacitação de profissionais de saúde para a vacinação e pediu à população que procure as unidades de saúde para fazer seu cadastro ou atualizá-lo ― a medida é importante para o controle do grupo populacional que deverá receber cada vacina, já que o usuário não deve receber vacinas diferentes.
Brasil prevê campanha diferenciada contra a gripe em 2021
O Ministério da Saúde também planeja uma campanha diferenciada para a vacinação contra a gripe no ano que vem, diante da falta de estudos que atestem segurança para receber as vacinas contra a covid-19 e contra a Influenza concomitantemente. “Vamos vacinar primeiro para a covid-19 e depois de certo tempo vacinarmos para a Influenza, porque não temos até o momento dados para permitir a vacinação concomitante”, explicou o secretário de vigilância do Ministério da Saúde, Arnaldo Medeiros.
Após governadores afirmarem que Pazuello havia indicado o dia 21 de janeiro para o início da campanha contra a covid-19 no Brasil, o Ministério da Saúde emitiu nota afirmando que não há nenhuma data estabelecida. Antes, o ministro já havia indicado a possibilidade iniciar a campanha nacional em diferentes datas, como dezembro, março e fevereiro. Na manhã desta quinta-feira (17) ele sinalizou que a campanha pode começar em janeiro, sem especificar um dia e condicionando ao registro de vacinas pela Anvisa e capacidade de entrega de doses pelos laboratórios. “Quanto a prazo, a gente confia que vamos trabalhar 24h por dia, para que a gente conclua (os processos) e possa vacinar com segurança e eficácia”, declarou Pazuello.
Desculpas de Pazuello pela “ansiedade”
No Senado, o ministro também pediu desculpas “pela confusão que posso ter causado” ao questionar “pra quê esta angústia, esta ansiedade” em um país que conta quase 184.000 mortes pelo coronavírus. Explicou que se referia ao planejamento da logística da vacinação e não à pandemia. “Todos estamos ansiosos e angustiados”, declarou. O ministro também disse mostrar respeito aos profissionais de saúde que estão na linha de frente há meses. O Brasil vê uma subida nos contágios do novo coronavírus. Nesta quarta-feira, registrou mais de 70.000 casos em um único dia, um recorde desde o início da crise. E vários estados já operam com no limite de seus sistemas de saúde. “Nós estamos realmente em uma curva ascendente e temos que estar atentos a isto”, admitiu o ministro.
Senadores também o questionaram sobre a postura do presidente Jair Bolsonaro, que há meses afirmou que não compraria “vacina chinesa” e esta semana afirmou que não tomaria a vacina, além de defender um termo de consentimento para quem vai receber a vacina, lançando dúvidas sobre a segurança da vacinação. “Sobre o presidente ser voluntário ou não para receber a vacina, ele está reforçando a voluntariedade e não a obrigatoriedade”, afirmou Pazuello, que voltou a explicar que o termo pode ser exigido apenas para vacinas emergenciais. “Posso afiançar que a preocupação básica é que não houvessem vacinas importadas sem o registro”, declarou. Segundo ele, “há bastante tempo”, Bolsonaro tem colocado que o SUS deve adquirir todas as vacinas que estiverem disponíveis e forem seguras, inclusive a Coronavac. “Nada fabricado no Brasil deixará de ser adquirido”, garantiu. Uma medida provisória foi publicada no Diário Oficial nesta quinta para destinar 20 bilhões de reais para aquisição de vacinas, compra de insumos como agulhas e seringas e realização de campanha de vacinação. O texto não incluiu a exigência de um termo de responsabilidade, mas a questão ainda pode ser alvo de uma nova medida provisória.
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