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Subnotificação de casos de violência infantil acende alerta na quarentena

Tribunal de Justiça de São Paulo lança campanha “Não se cale!” para estimular denúncias. Sem escolas, que ajudam a identificar casos, Estado fez menos registros durante o isolamento

Campanha "Não se cale" do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Campanha "Não se cale" do Tribunal de Justiça de São Paulo.DIVULGAÇÃO
Diogo Magri

Na última segunda-feira, dia 18 de maio, comemorou-se o dia nacional de combate à violência contra crianças e adolescentes. A data veio com o que seria, aparentemente, uma boa notícia: em comparação com abril do ano passado, o número de ocorrências de crimes contra jovens diminuiu em quase 70% em São Paulo no mês passado, de acordo com o Departamento de Polícia Judiciária da Macro Região (Demacro). Entretanto, para a juíza Ana Carolina Della Latta, do Tribunal de Justiça de São Paulo, o dado é motivo de preocupação. “Os números acendem um alerta porque não há motivos para a diminuição”, afirma ela, que também atua no Setor de Atendimento de Crimes da Violência contra Infante, Idoso, Pessoa com Deficiência e Vítima de Tráfico Interno de Pessoas, o Sanctvs.

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Sem motivos para a redução observada, a conclusão que preocupa Della Latta, o Sanctvs e demais envolvidos na área é que houve uma subnotificação de casos durante a quarentena em São Paulo. Segundo o Demacro, foram 236 ocorrências de crimes em abril de 2020, contra 736 no mesmo mês do ano passado. Nos números da Justiça do Estado, abril deste ano teve 40% menos ações distribuídas referentes à violência contra criança e adolescente do que o mesmo mês em 2019. “Ainda não podemos concluir com segurança, mas os dados mostram que nossa preocupação não é despropositada. No caso dos estupros de vulneráveis, mais de 75% deles são praticados dentro de casa. Então acreditamos que não diminuíram; ao contrário, possivelmente houve um aumento com o confinamento forçado”, explica a juíza.

Com o intuito de estimular denúncias contra agressores, a juíza lançou em conjunto com o Tribunal de Justiça de São Paulo a campanha “Não se cale! Violência contra a criança é covardia, é crime! Denuncie!". O público-alvo não é somente a criança, a qual a campanha busca acolher e informar, mas também o adulto, apesar de, em termos genéricos, ser ele o principal agressor. “A ideia é sensibilizar os adultos. Ela tem um efeito se pensar que outras pessoas [que não o agressor] podem estar mais atentas”, justifica Della Latta.

Na visão dos envolvidos na campanha, a quarentena necessária para combater a pandemia do novo coronavírus está por trás da provável subnotificação dos casos de violência contra crianças e adolescentes. “Adultos e crianças estão mais tempo juntos, existe a questão econômica, tudo isso pode gerar situações de estresse que podem ocasionar em violência. A disputa pelo brinquedo, pelo controle da TV podem intensificar os conflitos”, diz Ana Carolina. “Outro ponto importante é que muitos crimes são noticiados por professores, eles são fundamentais na revelação de violência contra os infantes, e perdemos esse parceiro com as escolas fechadas”. A equipe ressalta, no entanto, que concorda e entende a necessidade das medidas de isolamento social decretadas em parceria com as autoridades de saúde durante a pandemia.

“Não é a criança que deve se adaptar à Justiça, mas a Justiça à criança”

Para que a campanha chegue como informação à criança, foi necessária a criação de vídeos interativos e educativos com a temática infantil. Nessa missão entraram os Palhaços sem Juízo, grupo artístico que trabalha no acolhimento de crianças e adolescentes vítimas de agressões nos fóruns criminais da Barra Funda e de São Miguel Paulista, em São Paulo, para auxiliar no depoimento. “Fomos na direção de atingir crianças e adolescentes, alertá-los sobre a importância de pedir ajuda”, explica a fundadora do grupo, Soraya Saide.

Depois de anos de experiência como atriz e palhaça no Doutores da Alegria, projeto que leva o humor para crianças internadas em hospitais, Soraia levou a ideia dos Palhaços sem Juízo ao Sanctvs em agosto do ano passado. Desde então, ela e mais três atores trabalham com o mantra de que “não é a criança que deve se adaptar à Justiça, mas a Justiça que deve se adaptar à criança”. “Nos organizamos sempre em dupla ou trio, e vamos a cada um dos fóruns uma vez por semana, durante 5 horas por dia”, continua Soraya. “Vamos às salas onde estão as crianças e lá iniciamos o trabalho”. Os palhaços circulam livremente pelos fóruns e, quando estão nas salas, são acompanhados por psicólogos e assistentes sociais nos momentos em que interagem com as crianças de forma bem-humorada. Tudo para desconstruir o “ambiente sisudo” do fórum criminal e deixar o jovem confortável para fazer seu depoimento, fundamental para revelar a violência.

O projeto segue as diretrizes do ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente, e foi aprovado por unanimidade desde o princípio pela Coordenadoria da Infância e da Juventude do TJ-SP. O Palhaços sem Juízo não traz custos ao Poder Judiciário, já que seus criadores têm a chancela da Lei Rouanet para buscar patrocinadores e também é sustentado através de cursos, palestras e espetáculos. “É algo inédito no país e não conheço outras experiências parecidas no restante do mundo”, afirma a fundadora. “A violência e o abuso contra a criança e o adolescente é um tema doloroso à sociedade e por isso mesmo não pode ser varrido para debaixo do tapete”, conclui.

Nas palavras de Ana Carolina Della Latta, o trabalho “cuidadoso e delicado” dos palhaços é importante no trabalho do Sanctvs dentro do fórum criminal, e não seria diferente em uma campanha online de combate à violência. “Nosso trabalho é proporcionar um ambiente acolhedor, os palhaços completam o cenário dos outros profissionais”, diz ela. “Com a provável subnotificação, mais do que nunca a sociedade precisa se apropriar da responsabilidade pela dignidade e bem estar de nossas crianças e jovens”.

Onde denunciar

Disque 100: canal do Governo federal que recebe denúncias de violação dos direitos humanos. Funciona 24h também em domingos e feriados, a denúncia pode ser anônima e a ligação é gratuita.

Conselho Tutelar: principal órgão de proteção a crianças de adolescentes. Contatos podem ser encontrados no site de cada prefeitura.

Polícia Militar: em casos de emergência, disque 190. Ligação gratuita e funciona 24h, bem como as delegacias.

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