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Máscaras contra o coronavírus, sim ou não? Mandetta defende até as caseiras, feitas de pano

Proteção virou item quase obrigatório em países asiáticos, mas OMS desaconselha uso generalizado. Ministro da Saúde recomenda as artesanais como “barreira física”

Fabricante mostra máscara de pano feita com as cores da bandeira da Itália, em Roma.
Fabricante mostra máscara de pano feita com as cores da bandeira da Itália, em Roma.FABIO FRUSTACI (EFE)
Pablo Linde

Lavar as mãos com frequência, tossir na parte interna do cotovelo, manter ao menos 1,5 metro de distância das outras pessoas… Entre as recomendações que as autoridades sanitárias repetem insistentemente para conter a pandemia da Covid-19 não figura uma que, entretanto, muita gente segue: usar máscara. Talvez a confusão ocorra porque não existe um consenso mundial sobre seu uso. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a maioria dos países ocidentais a desaconselham para a maior parte da população, mas os asiáticos argumentam que esse acessório é imprescindível.

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Quando o vice-presidente da Cruz Vermelha da China, Yang Huichuan, chegou à Itália para assessorar o país na luta contra o coronavírus, escandalizou-se: “O transporte público continua funcionando, tem muita gente nas ruas e ainda há jantares e festas nos hotéis. Além disso, na área mais atingida pelo vírus as pessoas não usam máscaras”. Em muitos países asiáticos essa proteção facial é quase um item a mais na indumentária do inverno. A Coreia do Sul, diante dos primeiros casos detectados em suas fronteiras, orientou a população a se fechar em casa e a usar máscara inclusive dentro do lar. E estes mesmos países são os que melhor contiveram a epidemia. Por que os ocidentais não seguem o exemplo?

Há quem diga que não se recomenda porque, simplesmente, não há para todos. E é verdade. No início da crise, houve um excesso de demanda e uma tremenda escassez que ainda dura em alguns centros hospitalares, onde seu uso —aí sim— é imprescindível. O motivo de não recomendá-la, entretanto, é outro, ao menos teoricamente. Os conselhos oficiais da OMS são usar máscara cirúrgica, a mais simples, somente se você tiver sintomas, já que não foram feitas para evitar que se aspire o vírus, e sim para que as gotículas de saliva de um portador não chegue a outras pessoas. As que têm filtro —a N95, no jargão americano, e FFP2 ou FFP3, na terminologia europeia— evitam que o vírus entre no sistema respiratório, mas seu uso só é recomendado para pessoas que tenham que cuidar de doentes. Por isso são as que os médicos costumam usar.

Diante de uma demanda crescente na opinião pública quanto ao uso generalizado dessa proteção, a OMS voltou a recordar na semana passada que o vírus não pode ser transmitido pelo ar e que, salvo em situações hospitalares, é quase impossível respirá-lo, de modo que a lavagem frequente de mãos, a etiqueta respiratória (tampar-se com o cotovelo para tossir e outras precauções) e a distância de segurança deveriam bastar, segundo esse organismo e as autoridades europeias e norte-americanas até agora.

Mas a teoria dos asiáticos é outra. Sui Huang, pesquisador do Instituto para os Sistemas de Biologia (ISB, na sigla em inglês), escrevia recentemente que “a recomendação oficial nos Estados Unidos (e outros países ocidentais) de que o público não deve usar máscaras foi motivada pela necessidade das guardá-las para os trabalhadores sanitários. Não há respaldo científico para a afirmação de que ‘não são efetivas’. Pelo contrário, em vista do objetivo declarado de achatar a curva, qualquer redução adicional, mesmo que parcial, da transmissão seria bem-vinda, inclusive as oferecidas por máscaras cirúrgicas simples ou por máscaras que não gerariam um problema adicional de fornecimento”.

Na mesma linha, George Gao, chefe do Centro Chinês para o Controle e Prevenção de Doenças, respondia na semana passada na revista Science quais eram, do seu ponto de vista, os principais erros que outros países estavam cometendo na hora de conter a pandemia: “O grande erro nos EUA e na Europa, na minha opinião, é que as pessoas não usam máscaras. Este vírus é transmitido por gotículas e contato próximo. As gotas desempenham um papel muito importante: é preciso usar máscara porque, quando você fala, sempre saem gotas de sua boca. Muitas pessoas têm infecções assintomáticas ou pré-sintomáticas. Se usarem máscaras faciais, você pode evitar que as gotículas que transportam o vírus escapem e infectem os outros”.

Sua teoria é que, se todo mundo usar, independentemente de estar contagiado ou não, o risco se reduz drasticamente, porque o vírus ficará confinado na máscara. Mas também existe uma réplica ocidental a esta afirmação. “A maioria das pessoas não sabe usá-la bem, usa-as mais vezes que o recomendado, toca o próprio rosto, o que pode inclusive aumentar o risco de contágio. E se você achar que estará invulnerável ao usar, pode ser inclusive contraproducente”, diz a este jornal o epidemiologista Antoni Trilla, um dos assessores do Governo espanhol na atual crise.

O que diz o Brasil

No Brasil, o Ministério da Saúde afirma que as máscaras profissionais, em falta no mercado, devem ser prioritariamente por profissionais de saúde e outros na linha de frente no combate à pandemia. O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem defendido, porém, que a população fabrique máscaras caseiras como forma de aumentar a “barreira física” contra o vírus. Ou seja: ainda não que não sejam tão eficientes como as profissionais, eles podem aumentar o nível de proteção se forem usadas corretamente.

Segundo a pasta, para ser eficiente como uma barreira física, a máscara caseira precisa seguir algumas especificações simples: ter ao menos duas camadas de pano (ter dupla face de tecido de algodão, tricoline, TNT ou outros tecidos), ser desenhada e higienizada corretamente e jamais ser compartilhada. As máscaras caseiras devem ser individuais. A máscara deve ser feita de modo a cobrir totalmente a boca e nariz e se ajustar bem ao rosto, sem deixar espaços nas laterais. Veja as orientações do ministério sobre como fazer uma máscara.

Alguns estudos mostraram uma ligeira proteção das máscaras cirúrgicas quando se trata da gripe. Para Deborah García Bello, química e divulgadora científica, embora seja paradoxal, ambas as partes do debate têm razão: “Onde os habitantes costumam usar máscaras quando estão doentes, sabem usá-las. Em territórios como o meu, onde quase ninguém jamais pôs uma máscara na vida, colocar uma acarreta mais riscos que benefícios. Sim, você pode se contagiar por colocá-la mal”. Na sua opinião, como os recursos são limitados, é preciso priorizar os grupos-chaves. A respeito da comprovação científica, tuitou: “Sobre a eficácia do uso de máscaras, sabemos que é limitada. Por outro lado, sabemos que a eficácia de manter a distância de segurança é alta. Priorizamos o que sabemos que funciona”.

O analista de dados Scott Alexander publicou uma revisão aos estudos já feitos sobre a eficácia das máscaras contra o vírus SARS-CoV-2. Suas conclusões são que elas podem ser de alguma ajuda, embora advirta: “Por favor, não compre máscaras enquanto continuarem escasseando entre os profissionais sanitários”. E continua: “Se a escassez terminar e o uso de máscara não tiver custo, estou de acordo com as pautas da China, Hong Kong e Japão: considere usá-la em situações de alto risco, como o metrô ou os edifícios cheios de gente. Não o tornará invencível, e se você correr o risco de ficar confiante demais, mesmo que só um pouco, poderia causar mais dano que bem. É preciso evitar ao máximo situações de alto risco como o metrô e os edifícios cheios de gente. Mas, se tiver mesmo que entrar, o mais provável é que uma máscara ajude”.

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