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STF mantém suspense sobre destino de Lula em 2022 em caso que será retomado nesta quinta

Após duros embates, ministros decidiram que vão voltar a analisar decisão que devolveu os direitos políticos ao ex-presidente petista. Pano de fundo é divisão do tribunal sobre legado da Lava Jato e status de Sergio Moro

Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília.
Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília.Marcello Casal JrAgência Brasil ( MArcello Casal Jr/Agência Bras)

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o plenário pode julgar a anulação das condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no âmbito da Operação Lava Jato, colocando um ponto de interrogação no futuro do petista como potencial candidato nas eleições presidenciais de 2022. Nesta quinta-feira, a partir das 14h, os 11 ministros da corte analisam os recursos da recursos da Procuradoria-Geral da República e da defesa de Lula que podem determinar se o ex-presidente terá seus direitos políticos preservados, caso os processos voltem à fase inicial de investigação, como decidido pelo ministro Edson Fachin no começo de março.

Na sessão do Supremo não faltaram provocações dos poucos ministros discordantes ―Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello― da manobra de Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no STF, de enviar ao plenário recursos do habeas corpus concedido à defesa de Lula. Fachin reconheceu em uma decisão monocrática (de forma isolada) a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar o ex-presidente. O ministro defendeu que a medida era necessária porque não havia relação entre os fatos apurados nos processos de Lula e aqueles relacionados a corrupção na Petrobras, que tinha Moro como juiz natural. Logo, o ex-presidente deveria ser julgado em Brasília, onde supostamente teriam ocorridos os crimes aos quais ele foi acusado. De um lado, a ação de Fachin acabou por anular as duas condenações em segunda instância do petista, fazendo com que ele se livrasse do impedimento da Lei da Ficha Limpa. Do outro, ao enviar os casos para Brasília, Fachin tentou blindar o trabalho de Moro, evitando assim a anulação dos inquéritos, quebra de sigilo e interceptações determinadas pelo ex-juiz.

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A maioria dos ministros defendeu que Fachin tinha direito de enviar o HC para o plenário, único tema discutido na sessão desta quarta. Alexandre de Moraes disse que a estrutura do STF foi feita para privilegiar os julgamentos em plenário. “Não consigo enxergar, com todo respeito, a afirmação de que o julgamento pelo plenário significa desrespeito ao juízo natural”, afirmou. Luís Roberto Barroso disse que há situações que de fato comportam mais de uma interpretação, mas que, neste caso, não havia ambiguidade. “É a faculdade discricionária do relator afetar [enviar] ou não o plenário (...) Só eu, monocraticamente, afetei nesta semana dois casos ao plenário”, disse ao votar com o relator.

Cármen Lúcia também acompanhou Fachin. “O julgamento pelo plenário em nada restringe direito de qualquer um que seja”, disse. No entanto, ela já deu pistas do que deve ser sua postura em relação a tentativa de alguns ministros de levar ao plenário a questão da suspeição de Moro, já determinada pela Segunda Turma. “Plenário não é revisor de Turma. Falarei sobre isto no momento certo”, disse a ministra. A defesa de Lula tenta conseguir a extensão dos efeitos da declaração de parcialidade de Moro no julgamento do chamado caso do triplex do Guarujá para anular por completo os processos do sítio de Atibaia, Instituto Lula e apartamento de São Bernardo.

O ministro Marco Aurélio Mello foi um dos que se mostrou mais incomodado com as justificativas do colegiado para apoiar a medida de Fachin. “O que estaremos em síntese julgando? O relator entendeu que não precisava da apreciação da [Segunda] Turma e deu uma decisão monocrática, agora quer a opinião do colegiado. Não fecha”, criticou. Isto porque Fachin por diversas vezes ameaçou levar a matéria ao plenário, mas voltou atrás, no que alguns ministros entendem que foi um cálculo político, camuflado pela discricionariedade do relator, para preservar Moro e a Java Jato. Mello votou contra o relator, pois em seu entendimento, “acima de cada colegiado, está o próprio colegiado”. Logo, os recursos deveriam ser apreciados na Segunda Turma.

“Vou ser repetitivo, o diabo mora nos detalhes e os detalhes são muito delicados para a gente ser sutil”, afirmou Gilmar Mendes antes de disparar contra Fachin. “Gostaria de lembrar aos colegas que nós todos trabalhamos com a premissa que a discricionariedade tem limites, não se confunde discricionariedade com arbitrariedade. O poder tem limites”, afirmou. Segundo o ministro, a discricionariedade do relator, que, segundo regimento interno, dá ao relator o direito de enviar inclusive o julgamento de habeas corpus ao plenário, “não é um poder superior ao do colegiado”. “Nenhum ministro é maior do que a Turma ou do que o pleno”, afirmou. Curiosamente, após uma chuva de críticas, Mendes votou com o relator, surpreendendo até mesmo Fachin.

Já Lewandowski lembrou ao colegiado a excepcionalidade que tem sido o envio de habeas corpus do plenário. A assessoria do ministro fez um levantamento que mostra que só a Segunda Turma julgou 1.457 habeas corpus no ano passado. “Somada as duas Turmas foram cerca de 3.000 habeas corpus no ano de 2020. E são quase inexistentes aqueles que chegaram ao plenário”, afirmou, lembrando que a medida só deve ser utilizada em grandes temas jurídicos, como o caso do ICMS, onde era necessário analisar se o não recolhimento tinha um componente de dolo penal. O que não é o caso da anulação do julgamento das condenações de Lula na Lava Jato, que o ministro chama de uma questão “corriqueira”, que poderia ser decidida na Segunda Turma. “Nenhum outro caso dessa famosa Lava Lato, em termos de HC, foram trazidos ao colegiado maior do Supremo”, disse.

O ministro destacou ainda que o Supremo já falhou com Lula no passado, levando-o à prisão por 580 dias, “o que lhe custou a candidatura à presidência da República num momento em que as pesquisas de opinião indicavam que tinha a intenção de voto superior aos demais candidatos”. Isso aconteceu durante a discussão da prisão após condenação em segunda instância. Na época, a defesa do ex-presidente pedia que fosse respeitado o trânsito em julgado. “Houve uma opção de tirar o habeas corpus [da Segunda Turma], que era uma questão subjetiva de Lula, e levar ao plenário antes de decidir as ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pela OAB”, lembra Lewandowski.

O ministro afirma que se essa inversão não tivesse sido feita a história poderia ser diferente. “Talvez os acontecimentos de hoje pudessem ter um rumo distinto. Foi uma opção que o Supremo Tribunal fez e teve consequências muito sérias”, afirma. Após as eleições, prevaleceu o entendimento que estava na Constituição de que é preciso esperar todas as fases do processo. O ministro votou contra o relator: “Entendo que quando o ministro Fachin deu a primeira decisão, ele o fez usando a capa de integrante da Segunda Turma. Então, estes agravos não poderiam ser afetados ao plenário porque a competência da Segunda Turma já tinha se fixado”.

Para a ex-presidenta petista Dilma Rousseff, o que está em jogo não é só o futuro de Lula, mas a “democracia brasileira”: “Há uma certa inconformidade e temor dos mesmos que prenderam o Lula por 580 dias —indevidamente, fato hoje reconhecido pelos ministros do Supremo—, de que ele possa ser candidato à Presidência da República”, disse ao EL PAÍS.

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