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Objetivo: que sem as mulheres o mundo pare

Organizações feministas da Espanha convocam pela 1ª vez greve geral contra discriminação de gênero

Manifestação em Madri pelo Dia Internacional da Mulher de 2017.
Manifestação em Madri pelo Dia Internacional da Mulher de 2017.Lorena Ruiz
M. R. Sahuquillo
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Que o mundo pare. Ou, pelo menos, que se veja que sem o trabalho, o consumo e os cuidados das mulheres ele é um mundo completamente diferente. Esse é o objetivo da mobilização deste ano pelo Dia Internacional da Mulher, nesta quinta-feira, 8 de março. Uma jornada em que pela primeira vez as organizações feministas espanholas convocaram as mulheres a uma greve geral, que culminará em manifestações em diversas cidades do país. A paralisação foi respaldada por alguns sindicatos, e outros convocaram suspensões parciais das atividades. A previsão é de manifestações históricas, num momento de ressaca do movimento contra o assédio sexual (o #Metoo), que, embora não tenha decolado totalmente na Espanha, conseguiu unir milhares de mulheres e das visibilidade para a raiz do problema: a discriminação contra metade da sociedade. Como aperitivo, as organizações feministas convocaram um conjunto de atos e concentrações no aquecimento para o 8 de março — de assembleias informativas, peças teatrais e shows até uma atividade ciclística de piquetes informativos.

A cada 40 minutos uma mulher presta queixa por violência de gênero na Espanha. Neste país, reporta-se um estupro a cada três dias. Estes são os resultados mais graves de uma desigualdade que está em todos os campos da vida: elas fazem 70% das tarefas domésticas e dedicam 2,5 horas a mais que os homens por dia a esse tipo de atividade, segundo o instituto de análises Fedea. As mulheres ganham entre 21% e 23% a menos por um trabalho de igual valor. Também lhes custa mais romper esse teto de vidro que não lhes permite chegar a cargos de maior responsabilidade.

“O objetivo da mobilização é mostrar a importância do papel central que nós, mulheres, desempenhamos para a sociedade, para os lares, para o funcionamento das cidades. Por isso foi convocada uma greve feminista. E é uma greve que tem uma concreção de aspectos econômicos e trabalhistas, mas que é sobretudo social, porque os motivos que nos levam a convocá-la têm muito a ver com a forma desigual como somos tratadas nesta sociedade”, observa Justa Montero, feminista histórica e membro da Comissão 8 de Março. “Há um milhão de motivos para fazer greve e para sair às ruas: as violências machistas que sofremos, as discriminações no ambiente trabalhista, a falta de corresponsabilidade dos homens nas tarefas domésticas, as consequências para as mulheres dos cortes nos serviços básicos, o fato de que não se reconheça o direito a decidir sobre nosso próprio corpo”, enumera Montero.

A mobilização foi inspirada no chamado “dia livre das mulheres” de 1975 na Islândia, quando 90% da população feminina da ilha deixou de trabalhar e saiu às ruas para se manifestar pela igualdade. Foi um dia histórico, em que o país literalmente parou. Na época, as islandesas ocupavam apenas 5% dos assentos no Parlamento. Cinco anos depois, uma mulher, Vigdis Finnbogadottir, foi eleita presidenta do país.

Na Espanha, o propósito é o mesmo. Ou pelo menos que nos locais de trabalho, nas salas de aula, nas lojas e nos bares se note claramente os vazios deixados pelas trabalhadoras. “Há meses as organizações vêm preparando um bom número de atividades informativas, lúdicas e reivindicativas para que o Dia Internacional da Mulher não se limite a uma jornada”, diz María Álvarez, também integrante da Comissão 8 de Março.

Praticamente todas as cidades da Espanha tiveram ações convocadas. Na segunda-feira passada, ocorreu em Valladolid (norte) uma grande assembleia, com um jantar comunitário em que todos podiam levar alimentos e bebidas para compartilhar; uma jornada informativa e de preparação para o Dia da Mulher que se repetiu em outros pontos da Espanha. Em Cartagena (sudeste) foi organizado um mercado de pulgas. Em Madri, onde se prevê uma manifestação com maior afluência nesta quinta, as Coristas Feministas organizaram na terça-feira um show pela igualdade com canções que convocavam para a greve. À meia noite de quarta para quinta-feira haveria panelaços em diversos lugares da Espanha — barulho para inaugurar a jornada reivindicativa. Além disso, em Madri estão previstos vários pontos de brinquedotecas para as crianças.

As organizações feministas (mas não os sindicatos) propuseram que a greve seja exclusivamente feminina. “Os homens têm um trabalho importante: primeiro respeitar, e segundo velar para que as mulheres possam fazer a greve, que cubram os serviços mínimos, sobretudo nos cuidados”, diz Montero.

Mobilizações em 170 países

O lema e o objetivo são comuns, assim como a discriminação e a desigualdade por motivo de gênero que todas as mulheres sofrem: de uma camareira de hotel a uma cientista, passando pelas migrantes, as jovens e as mulheres trans. Porém, um grande número de mulheres de diferentes setores estão se mobilizando para pôr o foco também sobre sua situação específica: das artistas às cientistas, das estudantes às comunicadoras, que redigiram um manifesto que já foi assinado por mais de 5.300 profissionais (incluindo 80 profissionais deste jornal). O texto é firmado, por exemplo, pelas comunicadoras da rádio SER Àngels Barcelò e Pepa Bueno, pela veterana correspondente da TVE Rosa María Calaf, pelas apresentadoras Ana Rosa Quintana (Telecinco), Susanna Griso (Antena 3) e Ana Pastor (La Sexta) e pelas jornalistas do EL PAÍS Rosa Montero e Soledad Gallego-Díaz.

Também as acadêmicas decidiram aderir às paralisações para denunciar que recebem salários mais baixos, que sua carreira acadêmica está mais cheia de obstáculos que a de seus colegas homens, que elas têm trabalhos mais precários e que suas pesquisas recebem menos financiamento. Denunciam que as distorções implícitas de gênero discriminam as mulheres na percepção dos seus méritos nos processos de avaliação, credenciamento, seleção e promoção.

A Espanha é o único país, até agora, onde foi convocada uma greve formal de 24 horas. Entretanto, em 170 nações haverá ausências simbólicas e também interrupções regulares, porém parciais, nos serviços nesta quinta-feira.

Além disso, na semana que antecedeu ao Dia Internacional da Mulher várias instituições promoveram ações para denunciar a desigualdade, incluindo a escassez de mulheres nas mesas de debate e conferências. Uma dezena de instituições já subscreveram uma iniciativa do Escritório do Parlamento Europeu na Espanha para se comprometer a medir o percentual de mulheres que participaram “como especialistas ou apresentadoras” em todas as suas conferências, mesas redondas e debates.

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