Primeira Constituição da capital mexicana garante proteção a ambulantes, mendigos e prostitutas
Conheça os pontos principais do documento
A Cidade do México, que é Distrito Federal (capital do país), passa por um processo de reforma política desde janeiro deste ano para ser transformado em um Estado com plena autonomia dentro da federação — o nome oficial do país é Estados Unidos Mexicanos. Assim, o município continuará sendo a capital do México, mas passará a ter o status de cidade-estado. Uma assembleia constituinte deverá votar a Constituição estadual em janeiro de 2017 e, se for mantido o projeto original do prefeito Miguel Mancera, alguns direitos entrarão em contradição com as leis federais e os regulamentos hoje vigentes. Se o projeto for aprovado na forma atual, a Constituição do antigo Distrito Federal outorgará reconhecimento e direitos a prostitutas, vendedores ambulantes e pessoas em situação de rua, entre outras figuras polêmicas.
O caminho até o seu exercício, portanto, pode se estender muito além desse ano, pois será necessário adequar a legislação atual do país à nova Carta Magna. Além disso, como as leis federais prevalecem sobre as estaduais, alguns privilégios dos cidadãos da capital ficariam sujeitos ao que está disposto na lei.
Veja a seguir alguns dos direitos que a nova Constituição outorgaria aos habitantes da Cidade do México:
Prostituição e comércio ambulante
Os trabalhadores independentes estariam protegidos pela Constituição. O artigo 15 estabelece direitos para os não assalariados, incluindo vendedores ambulantes e prostitutas. “Os prestadores de serviços, vendedores fixos e semifixos têm direito a desempenhar suas atividades e ofícios nos espaços públicos da cidade determinados por lei; também têm direito à certeza jurídica, à segurança física e à não repressão” em uma cidade com um comércio ambulante antigo (data da época pré-hispânica) e ainda alimentado pelo constante problema da pobreza, que obriga muitos a subsistir dessa forma. Também “reconhece e protege o trabalho sexual voluntário e autônomo como uma atividade lícita”, o que obrigaria a despenalizar a prostituição.
Todas as famílias
Em meio à polêmica que causou, entre os grupos conservadores, a reforma proposta pelo presidente Peña Nieto para permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o projeto de Miguel Mancera reconhece “em igualdade de direitos as famílias formadas por casais de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexuais, com ou sem filhas e filhos, que estejam sob a figura de matrimônio, concubinato ou alguma outra união civil”. A Constituição também ressalta o direito da comunidade LGBTTI a uma vida livre de violência e discriminação, assim como ao exercício de sua orientação sexual, identidade de gênero e expressão de gênero.
Não obstante, o projeto não é específico quanto a alguns direitos sexuais e reprodutivos já garantidos na capital, como o aborto legal e voluntário. Apesar de ser uma das grandes conquistas da esquerda, o tema não aparece nem mesmo sob o conceito de “interrupção legal da gravidez”. Por outro lado, proíbe a esterilização involuntária, a anticoncepção forçada e garante uma vida livre de violência obstétrica.
Mendigos, migrantes e afrodescendentes
A Constituição reconhece a dignidade e identidade das pessoas que vivem nas ruas. Obriga o poder público a garantir sua segurança pessoal, integridade e não discriminação, assim como a “não sofrer reclusão ou deslocamentos forçados nem serem obrigados a tratamentos de reabilitação, trabalhar ou serem institucionalizados sem sua autorização, e não ser perseguidos por condutas que não constituem delito”.
Ao reconhecer que a Cidade do México, por ser capital do país, é uma cidade de migrantes e, portanto, o texto da Carta Magna pretende garantir os direitos desses cidadãos independentemente de sua situação migratória, “por isso não deverão ser criminalizados”. Esse item inclui refugiados, deslocados, deportados e pessoas sujeitas à proteção internacional. Põe especial ênfase na população afrodescendente, que terá direito à proteção de seus conhecimentos tradicionais e seu patrimônio cultural, artístico, material e imaterial. As autoridades deverão combater os preconceitos e estigmas, eliminar o racismo e atuar na prevenção, atenção, penalização e erradicação das violências contra ela”.
Licença-maternidade de seis meses
Os trabalhadores da Cidade do México teriam os seus direitos consideravelmente ampliados no caso da aprovação da Constituição: teriam pelo menos dois dias seguidos de folga por semana (atualmente, a lei federal do Trabalho prevê apenas um, com possibilidade de ampliar para dois desde que as horas do sexto dia de trabalho sejam compensadas durante a semana); dois períodos de férias por ano, com 10 dias úteis cada um (hoje existe apenas um período de seis dias); licença-maternidade remunerada de seis meses (atualmente é de apenas três) e licença-paternidade mínima de um mês (hoje ela é de cinco dias), bem como um período maior caso o bebê apresente alguma deficiência.
Maconha para todos
A capital do México caminha para se tornar o primeiro Estado a legalizar o consumo de maconha integralmente. “Na Cidade do México, o consumo de cannabis não será punido de nenhuma maneira, exceto no caso de se colocar em perigo ou de prejudicar os direitos das outras pessoas, conforme limites a serem definidos em lei. O uso medicinal e a pesquisa científica sobre ela serão incentivados, a partir de uma perspectiva de redução de riscos e prejuízos”, assinala o projeto de Constituição.
Prisão domiciliar para mães
No México, os presos vivem sob condições que as organizações de defesa dos direitos humanos qualificam como sub-humanas: superlotação, comida em mal estado, violência e, em vários casos, torturas e abuso sexual. A Constituição pretende mudar isso na capital, definindo que os réus têm direito a um tratamento humano, em condições que favoreçam a sua reinserção social.
Esses direitos estão contemplados pelo Artigo 16, em que se destaca o benefício de prisão domiciliar que Mancera pretende outorgar aos adultos mais velhos; doentes ou inválidos; grávidas e mães de crianças na primeira infância que estejam reclusas, “conforme o previsto nas leis sobre essa questão”.
A terra é de quem nela vive
O projeto faz uma adaptação da máxima zapatista com a finalidade de evitar despejos territoriais e deslocamentos forçados, como costuma ocorrer em Estados onde há recursos naturais abundantes (como Chiapas) ou mesmo na Megalópole, onde conflitos pela terra, como o de San Salvador Atenco, acabaram em enfrentamentos violentos, prisões e mortes.
“Os povos e comunidades indígenas e bairros nativos têm o direito de possuir, usar e desenvolver, controlar e gerir as terras, territórios e recursos existentes em suas terras, que eles possuam em função da propriedade tradicional ou outro tipo tradicional de ocupação, bem como aquelas que tenham sido adquiridas de outras maneiras”, afirma o texto, sem especificar essas maneiras. “Têm o direito de uso e de usufruto dos recursos naturais existentes em seu território, assim como à participação nos ganhos obtidos pela exploração de seus recursos naturais”, a qual “se fará sem prejuízo da integridade cultural, social e econômica dos mesmos; as autoridades da cidade protegerão em permanência os povos e comunidades indígenas e aldeias e bairros surgidos a partir de qualquer forma de deslocamento forçado de suas terras e territórios”.
Destituir o prefeito e anular uma eleição
Os habitantes da capital terão o direito de pedir a revogação do mandato de seus representantes eleitos “caso assim desejem pelo menos 10% das pessoas inscritas nas listas nominais de eleitores da respectiva circunscrição” ou “a pedido da pessoa que ocupa o cargo”. Essa prerrogativa inexiste atualmente no México, da mesma forma que não há a possibilidade de anulação de uma eleição caso os eleitores contestem os resultados ou quando se tenham detectado falhas. O texto de Mancera, no entanto, prevê a possibilidade de anulação do pleito caso a este sejam atribuídas “irregularidades graves que violem os princípios previstos nesta Constituição”.
Seres “sensíveis”
“Toda pessoa deve respeitar a integridade dos animais como seres sensíveis”, estabelece o artigo 14 da nova Constituição da capital. Sua proteção será de responsabilidade de toda a população, mas caberá às autoridades promover uma “cultura de cuidados e de porte responsável”, bem como cuidar de animais abandonados. “Os maus tratos, a mutilação e o abandono de animais serão punidos conforme as leis e regulamentações”.
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