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Joe Biden e Kamala Harris inauguram novo mapa político após eleições nos EUA

Democratas recuperam Estados-chave do Meio-Oeste perdidos em 2016 e vencem em bastiões republicanos graças à mudança demográfica

Manifestante levanta o punho em protesto contra o racismo da Administração Trump.
Manifestante levanta o punho em protesto contra o racismo da Administração Trump.KEREM YUCEL (AFP)
Luis Pablo Beauregard

Joe Biden se tornou o candidato mais votado da história dos Estados Unidos. O democrata e vice-presidente de Barack Obama rompeu a barreira imposta em 2016 por Hillary Clinton que, apesar de ter vencido a eleição em número de votos (mais de 61 milhões), não conseguiu chegar à Casa Branca. Um homem branco de 77 anos reescreve agora a história para seu partido, que ultrapassou os 72 milhões de votos. A vitória democrata, conduzida pela senadora Kamala Harris, foi construída com a reconquista do Meio-Oeste, perdido na onda populista liderada pelo republicano Donald Trump. Uma possível vitória de Biden ajusta o mapa político dos Estados unidos durante os próximos quatro anos. A seguir, alguns aspectos da nova configuração.

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Nem Trump nem Biden: o perdedor é o sistema eleitoral dos EUA
A live broadcast of President Donald Trump speaking from the White House is shown on screens at an election night party, Tuesday, Nov. 3, 2020, in Las Vegas. (AP Photo/John Locher)
Trump ameaça cruzar a linha vermelha do processo democrático

O Cinturão da Ferrugem volta a ficar azul

Demorou várias horas, mas Biden finalmente conseguiu inclinar a balança no Meio-Oeste. Foram dias de uma contagem angustiante que acabou colocando Michigan, Wisconsin e possivelmente Pensilvânia do lado democrata. Os Estados formam o chamado Rust Belt, o Cinturão da Ferrugem, junto com Indiana e Ohio, que Donald Trump manteve. Essa região industrial era um sólido bastião democrata, que encontrava na classe trabalhadora um celeiro de apoios. Quatro anos atrás, no entanto, a região aderiu ao experimento Trump, amargurada por décadas de declínio e perda de empregos que foram para outras partes do mundo onde a mão de obra é mais barata. As regiões deram um voto de confiança ao atípico candidato republicano, que prometeu defender todos os esquecidos do âmbito rural.

A mudança de sentido do voto não significa que a população rural tenha mudado de opinião. Estes territórios continuaram apoiando majoritariamente Trump. As áreas urbanas, muito mais diversas e com maior peso eleitoral, se voltaram a favor de Biden. É o caso do condado de Kent, em Michigan, onde Trump encerrou sua campanha na noite de segunda-feira. Procurava repetir o caminho traçado há quatro anos. Ali encerrou e ali ganhou. Mas Grand Rapids, a principal cidade do condado e seus subúrbios, deu-lhe as costas votando em Biden. Em Wisconsin, o democrata aumentou os resultados de Hillary Clinton nas cidades mais importantes.

Conquistas do sul

A Geórgia vota no Partido Republicano há 24 anos. A última vez que apoiou um candidato democrata foi Bill Clinton, um sulista de Arkansas. Biden, no entanto, obteve importantes vitórias nas principais cidades do Estado, melhorando muito o desempenho de Hillary Clinton em 2016 na região. Se o mapa das vitórias da secretária de Estado de Barack Obama for sobreposto ao de Biden, não haveria muitas diferenças. Não houve condados que mudaram de lado. Foi a participação que mudou e impulsionou fortemente o democrata. Biden ultrapassou um milhão de votos na região metropolitana de Atlanta, a maior do Estado. Quatro anos atrás, Clinton mal superou 800.000 votos nessa zona. O mesmo aconteceu em outros centros urbanos da região.

A mudança é explicada pela chegada de novos perfis de eleitores. São mais jovens e têm estudos superiores. Isto traça uma linha com as zonas rurais de um dos Estados que fizeram parte da Confederação. Não apenas a demografia explica essa história de mudança. A Geórgia tem uma maioria branca, mas 51% dos habitantes de Atlanta são afro-americanos. A tensão racial e a falta de representação sofridas durante toda a Administração Trump também foram um fator para a votação em massa das minorias. Em 2018, Stacey Abrams, uma ativista dos direitos da comunidade, tentou se tornar governadora pelo Partido Democrata. Não conseguiu, mas seu esforço levou 800.000 pessoas a se inscreverem como novos eleitores. E na terça-feira votaram pela primeira vez.

Outros feudos tradicionais para os republicanos estão passando por transformações semelhantes. É o caso do Texas, que se considerava certo que se pintaria de vermelho na noite da eleição. A questão é por quanto tempo. O fosso entre democratas e republicanos foi se fechando graças a comunidades cada vez mais diversas. Mitt Romney ganhou o Estado com uma diferença de 12% sobre Obama. Trump fez o mesmo sobre Clinton com 9%. Enquanto se aguardam os resultados finais, Biden reduziu a diferença para 6%. O Texas tem 254 condados. O peso eleitoral se concentra em 27, que produzem 69% dos votos deste território onde vivem 29 milhões de pessoas. Lá estão os grandes núcleos urbanos como Dallas, Houston, Austin, San Antonio e El Paso. Todos têm uma crescente população hispânica, cada vez mais envolvida politicamente.

Latinos testam sua força

O voto latino foi um fator determinante tanto na Flórida, a leste, quanto no Arizona, a oeste. A batalha nesses Estados demonstra que os políticos não podem considerar o eleitor hispânico como um bloco monolítico. Na Flórida foram uma ferramenta para a vitória de Trump, principalmente no condado de Miami-Dade. Ali foi apoiado por 55% da população de origem cubana. O número cai para 30% entre os porto-riquenhos e para 48% entre outros latinos, de acordo com pesquisas publicadas pela rede NBC.

No Arizona, por outro lado, foram um instrumento para impulsionar Biden. Os latinos representam 23% do eleitorado deste Estado fronteiriço que, com exceção de Bill Clinton em 1996, vota nos republicanos desde 1952. O discurso racista de Trump e as políticas de imigração promovidas pelos setores mais radicais da Administração mobilizaram esta minoria, principalmente de origem mexicana. Seis em cada dez votaram na chapa de Biden e Harris no condado de Maricopa (Phoenix), onde 60% dos votos do Estado estão concentrados. O esforço latino foi acompanhado por uma coalizão de republicanos desencantados com Trump, liderada por Cindy McCain (viúva do senador John McCain). Esta foi uma das surpresas menos esperadas na eleição de um país que mudou.

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