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Brasil vai à Cúpula do Clima com processo de ‘pedalada ambiental’ e carta de governadores a Biden

Em meio à alta dos alertas de desmatamento da Amazônia, Bolsonaro tenta captar recursos dos EUA em encontro que acontece nesta semana. Governadores buscam linha direta com presidente dos EUA para assumir compromisso com política ambiental

Gil Alessi
Mulher indígena protesta contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em Brasília, nesta terça-feira.
Mulher indígena protesta contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em Brasília, nesta terça-feira.Eraldo Peres (AP)
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(FILES) In this file photo taken on September 12, 2019 an employee uses heavy machinery to stack wood logs at the Serra Mansa logging and sawmill company, in Moraes Almeida district, Itaituba, Para State, Brazil, in the Amazon rainforest. - Deforestation in the Brazilian Amazon reached 1,358 km2 in August 2020, a decrease of 21% compared to the same month of 2019, but the deforested area is already much higher than that of the whole of 2018. (Photo by Nelson ALMEIDA / AFP)
Enquanto Bolsonaro promete a Biden proteger a Amazônia, Salles é alvo de pedido de CPI
U.S. President Joe Biden leaves delivers remarks on his plan to withdraw American troops from Afghanistan, at the White House, Washington, U.S., April 14, 2021. Andrew Harnik/Pool via REUTERS
Biden ameaça sujar as mãos com Bolsonaro

O Brasil chega à Cúpula do Clima, que terá início nesta quinta-feira, pressionado por todos os lados em função de sua política ambiental negacionista. O evento, que reunirá virtualmente 40 líderes mundiais a convite dos Estados Unidos e será o primeiro cara a cara entre Jair Bolsonaro e Joe Biden, ocorre em meio ao recorde de alertas de desmatamento na Amazônia no mês de março, segundo dados registrados pelo Instituto de Pesquisas Espaciais. Apesar disso, a expectativa é de que o Governo use a oportunidade para buscar recursos junto aos EUA, com um pedido de 1 bilhão de dólares para que o país possa reduzir o desmatamento da Amazônia em 40% nos próximos doze meses, conforme afirmou o ministro Ricardo Salles em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo. Mas a perspectiva de sair da cúpula com o bolso cheio pode ser frustrada, tendo em vista os resultados desastrosos da gestão ambiental que levaram até mesmo a um processo jurídico contra as chamadas “pedaladas ambientais” do Governo.

Ativistas brasileiros ligados aos grupos Engajamundo e Fridays for Future (Sextas-feiras pelo Futuro, criado pela sueca Greta Thunberg) entraram com uma ação popular contra o ministro Salles, o ex-chanceler Ernesto Araújo e a União Federal pela prática, em dezembro, de uma manobra contábil (chamada de pedalada ambiental) que prejudicou o combate ao desmatamento e a redução das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. Naquele mês o Acordo de Paris completou cinco anos de vigência, e os países signatários precisaram atualizar as suas metas de preservação do meio ambiente —chamadas de Contribuições Nacionalmente Determinadas (CNDs), que são relatórios com as medidas a serem implementadas para reduzir as emissões de carbono. Pelos termos do tratado, estas CNDs apenas poderiam ser incrementadas, ou seja, tornadas mais ambiciosas para que não houvesse retrocesso. Mas o documento apresentado pelo Governo brasileiro foi elaborado de forma a permitir que o país chegue a 2030 emitindo 400 milhões de toneladas de gases do efeito estufa a mais do que o previsto na meta original, de 2015, segundo informações do Observatório do Clima.

“Nós pedimos a suspensão desta CND de dezembro, e que o Governo respeite o que já estava acordado no Acordo de Paris”, afirma Walelasoetxeige Paiter Bandeira Suruí, 24, conhecida como Txai, ativista indígena e uma das responsáveis pela ação. “Não estamos em tempo de regredir. O planeta pede socorro, e o que a gente quer é participação: a juventude precisa participar deste processo de definição das metas. A juventude indígena, os jovens das favelas e outras populações mais vulneráveis são as mais afetadas pelas mudanças climáticas”, diz.

Este processo contra Salles, Araújo e o Governo Federal tem potencial para influenciar quem dá a palavra final sobre o repasse do dinheiro ao Brasil. “O Governo americano destinou algo entre 80 bilhões de dólares e 100 bilhões de dólares para questões ligadas ao aquecimento global e ao meio ambiente. Mas a aprovação para repasses ao Brasil passa pelo Congresso americano, onde existe uma posição crescente de que qualquer tipo de auxílio envolvendo o país deverá contar com uma política ambiental clara”, diz Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam). Na última sexta-feira, 15 senadores do Partido Democrata enviaram uma carta a Biden na qual pedem que o apoio à preservação da Amazônia seja atrelado a um progresso nas ações brasileiras —que até o momento não ocorreu. “O Brasil está indo para a Conferência pedindo dinheiro, com a estrutura [de preservação] desmantelada, as metas sendo rebaixadas [pela pedalada ambiental] e o índice de desmatamento elevado... Isso demonstra que o Governo não tem intenção alguma de proteger a Amazônia, e o John Kerry [enviado dos EUA para o clima] e os congressistas americanos não são bobos”, diz Bocuhy.

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Mesmo se o Governo conseguir o dinheiro dos Estados Unidos, nada garante que ele terá algum efeito para controlar o desmatamento, tendo em vista o desmonte da legislação ambiental e dos órgãos de fiscalização feitos por Bolsonaro, diz o pesquisador. “Se esse dinheiro vier, ele não vai contar com o arcabouço normativo que havia antes. Desde 2019 foram desmantelando os bons instrumentos de gestão e proteção no Brasil. Se você não tem as diretrizes de uma política ambiental clara, o dinheiro por si só não tem como resolver o problema”, afirma.

Estas pedaladas ambientais podem custar caro para o país. Além de ficar sem os recursos dos EUA destinados à preservação, o negacionismo de Bolsonaro na área climática “afeta a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, e o acordo do Mercosul com a União Europeia”, alerta Bocuy.

Em outra frente de pressão contra o Planalto, um grupo chamado Coalizão Governadores Pelo Clima, que junta 23 chefes de executivos estaduais, enviou uma carta a Biden abrindo um canal de diálogo com a Casa Branca e se dispondo a ter papel de protagonismo na luta em defesa da Amazônia e dos demais biomas ameaçados. No texto de três páginas os políticos de diferentes matizes ideológicas — de Flávio Dino (PC do B) a Romeu Zema (Novo) —se colocam à disposição para implementar as metas previstas no Acordo de Paris (criticado por Bolsonaro) e receber “de forma transparente” os recursos para a conservação ambiental.

Cresce também a pressão no Congresso sobre a condução do Governo no que tange a questões ambientais. Nesta terça-feira a bancada do PSOL na Câmara entrou com um pedido de investigação ao Ministério Público Federal (MPF) pedindo a apuração da conduta do diretor-geral da PF, que trocou o chefe da instituição no Amazonas, Alexandre Saraiva, após ele ter enviado queixa-crime contra Salles ao Supremo Tribunal Federal. De quebra, o deputado federal Daniel Coelho (Cidadania-PE) começou a coletar assinaturas para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a gestão do ministro do Meio Ambiente.

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