Quatro Estados e DF podem entrar em fase de “aceleração descontrolada” da Covid-19, diz Ministério
Saúde afirma que dados de São Paulo comprovam que isolamento diminuiu intensidade de transmissão, mas alerta para cenário futuro no Estado e no Rio, Ceará, Amazonas e na capital
O mais recente desenho da epidemia de coronavírus no Brasil feito pelo Ministério da Saúde indica que o país enfrenta neste momento um risco nacional “muito alto” pelo novo coronavírus. Se de uma maneira geral o Brasil ainda vive a fase inicial de transmissão da Covid-19, ao menos quatro Estados ―São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará e Amazonas― e o Distrito Federal estão na iminência de entrar na fase mais dura da epidemia: a de aceleração descontrolada da doença, quando há espiral de casos e grande sobrecarga do sistema de saúde. O alerta feito pelas autoridades do ministério parte do cálculo de uma alta incidência da infecção em relação a população desses locais, um dado que supera a taxa nacional. E se soma aos gargalos estruturais que o país vem enfrentando na sua corrida contra o tempo para expandir o sistema de saúde antes da chegada da fase mais aguda da doença.
No mais recente boletim que o Ministério da Saúde publicou sobre a situação epidemiológica do país, divulgado neste sábado (4), a pasta avalia os riscos para o Sistema Único de Saúde (SUS) e traça um panorama duro sobre a capacidade brasileira para lidar com a fase mais aguda da epidemia neste momento: o país enfrenta carência de profissionais de saúde especializados, os leitos hospitalares ainda não chegaram a um número suficiente para uma fase aguda, não há fornecedores de testes para ampliar significativamente a capacidade de testagem nos próximos 15 dias e seriam necessárias pelo menos mais duas ou três semanas de estudos para conseguir alguma robustez e aplicar medicamentos como a cloroquina em larga escala para o tratamento da Covid-19.
Por isso, o Ministério da Saúde recomenda que os Estados e municípios mantenham suas determinações de distanciamento social pelo menos “até que o suprimento de equipamentos (leitos, EPI, respiradores e testes laboratoriais) e equipes de saúde (médicos, enfermeiros, demais profissionais de saúde e outros) estejam disponíveis em quantitativo suficiente”. A pasta aponta pela primeira vez que as medidas de isolamento estão funcionando no país. Cita como exemplo o caso de São Paulo, cuja taxa de transmissibilidade do vírus estava entre três e seis e caiu para um índice próximo de dois. “Após a adoção de medida de distanciamento social ampliado, essa taxa está próxima de R0=2 (em São Paulo)”, aponta o documento, citando o índice que calcula a capacidade de reprodução do vírus. O apoio do ministro Luiz Henrique Mandetta às medidas de distanciamento adotadas por São Paulo é o principal ponto de atrito dele com o presidente jair Bolsonaro, que defende a retomada das atividades econômicas no país, com o isolamento apenas de idosos e pessoas do grupo de risco. A polêmica desgastou a imagem do mandatário brasileiro e ampliou o apoio popular ao ministro.
Estrutura hospitalar
A avaliação que consta no boletim divulgado neste sábado foi feita pelas autoridades de saúde 37 dias depois de constatarem o primeiro caso de Covid-19 e começarem a dar respostas mais diretas à epidemia no país. No momento, o Brasil acumula um total de 9.056 casos e 359 óbitos, segundo dados de sexta-feira (03). Mas o próprio ministro Mandetta admite que o número está subestimado diante da limitação de testagem. A pasta tenta ampliar a capacidade de identificar um número mais real de infectados no país e chegou a anunciar o aumento de testes disponíveis para 22 milhões, mas os fornecedores desses insumos não têm estoque para os próximos 15 dias, afirmou ele.
Já sobre a capacidade de assistência para os casos mais graves da Covid-19 no Brasil, a situação também é dramática. Há carência de profissionais de saúde capacitados tanto para o manejo clínico de pacientes graves quanto dos profissionais treinados que atuam nos postos de saúde para orientar os casos leves de síndrome gripal. “Os leitos de UTI e de internação não estão devidamente estruturados e nem em número suficiente para a fase mais aguda da epidemia”, alerta a pasta no documento. E mesmo os medicamentos com indícios promissores para o tratamento ―como a associação da cloroquina e da azitromicina― necessitam ainda de pelo menos duas ou três semanas de estudos para serem aplicados com alguma segurança em larga escala.
O comportamento do vírus
O Ministério da Saúde chama a atenção para a alta transmissibilidade e letalidade do novo coronavírus, que já repercute nas hospitalizações por síndrome aguda respiratória grave no país e tem ocorrência superior aos demais vírus monitorados, como a Influenza. “O SARS-CoV-2 possui comportamento incomum e representa elevado risco para o Sistema Único de Saúde”, alerta a pasta. A epidemia passa por quatro fases: transmissão localizada (na qual se localiza o Brasil atualmente), aceleração descontrolada (na qual quatro Estados começam a entrar), desaceleração e controle.
Reiteradas vezes, o Ministério vem recomendando que as medidas de distanciamento social sejam respeitadas para que dê tempo para o sistema de saúde se expandir e criar condições de atender a um elevado número de doentes. Sem explicitar uma previsão exata, a pasta prevê que um período de maior ocorrência da doença “ocorrerá dentro de algumas semanas”. Diante da gravidade da situação e da insuficiência de insumos, o Ministério da Saúde passou a recomendar que a própria população passe a usar máscaras, ainda que sejam feitas com tecido em casa, como barreira social para tentar reduzir a propagação do vírus. “Esse fato, por si só, demonstra a gravidade da situação e a necessidade de manutenção das medidas de distanciamento social ampliada que foi adotada por diversos gestores estaduais e municipais. Esse é o único instrumento de controle da doença disponível no momento”, reforçou.
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