As desilusões de Zúñiga, o jogador que tirou Neymar da última Copa
Depois de receber insultos racistas e ser tratado como vilão por brasileiros, o lateral colombiano viveu “maré de azar” que o impediu de disputar o Mundial na Rússia

Uma joelhada por trás fez com que a Copa do Mundo terminasse mais cedo para Neymar, há exatos quatros anos. Aos 41 minutos do segundo tempo no jogo contra a Colômbia, em Fortaleza, o craque brasileiro teve a costela fraturada após sofrer uma entrada dura do lateral Camilo Zúñiga. Logo depois da partida, que classificou a seleção para a semifinal diante da Alemanha, os médicos anunciavam que o camisa 10 estava fora do restante da competição e, por pouco, não correu o risco de perder o movimento das pernas. Instantaneamente, o jogador colombiano se transformou em inimigo público no Brasil, acusado de “quebrar” Neymar de forma premeditada.
Não bastassem os milhares de xingamentos e provocações, as redes sociais de Zúñiga foram inundadas por ofensas racistas, direcionadas até mesmo a sua filha de dois anos. Recebeu ainda ameaças de morte, como as que pregavam que tivesse o mesmo fim que Andrés Escobar, zagueiro da Colômbia assassinado depois de marcar um gol contra na Copa de 1994. Na saída do estádio Castelão, o ônibus da delegação colombiana foi alvo da ira de torcedores que queriam a cabeça do carrasco de Neymar. Apesar do pedido de desculpas e de assegurar que não teve a intenção de lesionar o atacante brasileiro, o lateral ficou marcado pelo lance fatídico.
Passada a Copa, Zúñiga amargaria uma sequência de infortúnios que minou as chances de disputar mais um Mundial com os cafeteros. Sua carreira esteve a ponto de dar um salto em direção ao Barcelona, mas acabou permanecendo no Napoli, da Itália, e, em seguida, emprestado para o Bologna e o Watford, da Inglaterra. Jamais conseguiu recuperar o nível técnico que demonstrou na última Copa em função de um problema crônico no joelho direito, o mesmo que atingiu a terceira vértebra de Neymar. Antes do torneio, já havia sido submetido a uma cirurgia de reconstituição do menisco. Debilitado pelo processo de reabilitação que durou sete meses, só foi convocado por se tratar de um dos homens de confiança do técnico José Pekerman.
Voltou a sentir o joelho em outubro de 2014, num jogo contra a Inter de Milão. Operou novamente, mas as dores viraram rotina nos treinos. Nesse meio tempo, perdeu o pai em 2016 – ano em que se tornou pai pela segunda vez –, lidou com o trauma de um truculento assalto à casa de sua madrasta e ainda foi acusado de ter um filho fora do casamento com uma mulher condenada por assassinato. Tentando se livrar da maré de azar, decidiu rescindir seu contrato na Itália para acertar o retorno ao Atlético Nacional, onde foi revelado na Colômbia, em janeiro deste ano. No entanto, a previsão de reestreia se arrastou por causa de novos problemas físicos.
Só conseguiu debutar pelo clube local em maio, após ficar praticamente um ano sem jogar. E quase retorna para o departamento médico ao receber a pancada de um adversário no malfadado joelho. Não passou de um susto. Quando tudo parecia se endireitar, caiu outra vez em desgraça. O Atlético Nacional disputava em junho a final do Campeonato Colombiano e faturava a taça diante do Tolima até os 40 do segundo tempo. Então, o técnico Jorge Almirón resolveu colocar Zúñiga em campo para segurar o resultado. Dois minutos depois, o grande reforço da temporada foi expulso por um carrinho violento. Com um jogador a menos, o Nacional sofreu um gol nos acréscimos e perdeu o título nos pênaltis. Torcedores culparam o lateral pela derrota.

Zúñiga não foi chamado por Pekerman para a Copa da Rússia. Até hoje, evita tocar no incidente envolvendo Neymar. Eles se reencontraram somente duas vezes. Em um amistoso nos Estados Unidos, se abraçaram. Na ocasião, o colombiano aproveitou para reiterar o pedido de desculpas. Já em partida da Copa América, em 2015, voltaram a se estranhar. Neymar se irritou após um empurrão dentro da área: “Depois me liga para pedir perdão, filho da puta!”, ironizou o atacante, que tomou cartão vermelho no fim do jogo.
Aos 32 anos, o lateral, que mantém uma fundação beneficente que leva seu sobrenome e atende a centenas de garotos na Colômbia, anunciou justamente nesta quarta-feira o precoce fim de carreira no futebol. Não aguentava mais conviver com dores e anti-inflamatórios. “Pensei no meu futuro e na minha família, para que um dia eu possa correr no parque com minhas filhas.” Antes do início deste Mundial, ele escreveu uma carta emocionada para motivar seus antigos companheiros de seleção: “Vistam a camisa e joguem como nunca, sempre com a cabeça erguida e defendendo até a morte nossa tricolor.” Os colombianos foram eliminados pela Inglaterra nas oitavas de final. À distância, Zúñiga digere mais uma entre tantas decepções sofridas desde que sua joelhada entrou para a história das Copas.
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