Documentos revelam novo nome na folha de pagamento de propinas da Odebrecht na Europa
Ex-executivo da estatal peruana de petróleo, Atala Herrera, ocultou 900.000 dólares no principado de Andorra
O grupo Odebrecht, protagonista da maior trama de subornos já descoberta nas Américas, usou contas de um banco de Andorra para fazer pagamentos a Miguel Atala Herrera, ex-vice-presidente da empresa estatal Petróleos de Perú (Petroperú), segundo documentos bancários aos quais o EL PAÍS teve acesso. O ex-executivo acumulou 900.000 dólares (2,8 milhões de reais) numa conta desse pequeno país dos Pirineus, onde até janeiro deste ano vigorava o mais absoluto sigilo bancário, um local propício para rodar a folha de pagamento de propinas da companhia brasileira. Foi também no paraíso fiscal europeu que a Odebrecht abriu uma conta para os pais de Demetrio Papadimitriu, ex-ministro da Presidência e ex-chefe de campanha do presidente do Panamá Ricardo Martinelli (2009-2014).
Atala Herrera foi número dois da Petroperú entre 2008 e 2011, durante o segundo mandato de Alan García como presidente do Peru. A petroleira pública assinou em 2011, cinco meses depois de o dirigente sair da empresa, um acordo com a subsidiária do grupo, Braskem, para estudar a construção de uma usina petroquímica de três bilhões de dólares (9,4 bilhões de reais). Este jornal tentou sem sucesso entrar em contato com Atala Herrera.
A Banca Privada d’Andorra, junto com o Meinl Bank de Antigua e Barbuda (Caribe), foram as instituições financeiras usadas pela Odebrecht para pagar comissões ilegais a altos funcionários, presidentes e primeiros-ministros de uma dúzia de países da América Latina em troca da concessão de contratos. As autoridades financeiras dos EUA precipitaram em março de 2015 uma intervenção no banco andorrano, ao denunciarem que grupos criminosos faziam depósitos no BPA para lavar dinheiro, aproveitando a opacidade do Principado.
A Petroperú, maior empresa do país, firmou em 2011 um acordo com a Braskem, filial da Odebrecht, para analisar a construção de uma usina de produção de polietileno (plástico) avaliada em três bilhões de dólares. A instalação deveria abastecer Peru, Chile, Equador e Colômbia.
As atas internas e secretas do departamento de compliance do BPA revelam que Atala Herrera utilizou a empresa Ammarin Investment para ocultar seus recursos. Os documentos citados incluem uma planilha contábil e mostram que a conta foi aberta em outubro de 2007, 10 meses antes do desembarque de Atala Herrera da petroleira. “Sociedade apresentada pela [offshore caribenha] Klienfeld (Odebrecht) como sócio estratégico no Peru. A conta foi aberta em 16/10/2007, recebeu uma transferência da Klienfeld, e sua atividade foi escassa. Na época foram examinadas todas as listas e a informação da Internet, sem que aparecesse nenhum dado negativo”, diz o documento.
A Klienfield é a mesma empresa usada pela Odebrecht para fazer alguns dos pagamentos aos ex-executivos da Petrobras Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco — responsáveis por facilitar a fraude de processos licitatórios na estatal brasileira —, segundo investigação do Ministério Público Federal.
Os empregados do BPA prosseguiam observando que “atualmente voltaram a ser feitas buscas, e descobrimos que o primeiro representante da conta, Faresh Miguel Atala Herrera, aparece processado por fraude em 2007; o cliente apresentou vários recursos à Justiça que foram negados”.
Os gestores da instituição financeira andorrana descobriram também que Atala Herrera era executivo da estatal petroleira. E fizeram isso constar por escrito: “Além disso, atualmente é PEP [“pessoa politicamente exposta”, termo usado pelos bancos para se referir a cargos públicos] (vice-presidente da Petróleos de Perú SA)”, observa a ata. O BPA exigiu então a seu cliente uma documentação que comprovasse que seus rendimentos não procediam da PetroPerú. “Ainda não recebemos [os documentos]”, acrescenta a ata.
Conta para o árbitro
A Odebrecht pagou também 435.000 dólares (1,37 milhão de reais) através do BPA ao advogado peruano Jorge Horacio Cánepa Torre, usando como intermediária o escritório Maxcrane Finance SA Perú.
Cánepa Torre, ex-árbitro da Câmara de Comércio de Lima (CCL), emitiu 17 laudos favoráveis à Odebrecht em processos contra o Estado peruano por causa de diversas obras viárias. As decisões geraram à construtora lucros de “milhões de dólares”, segundo o jornal Perú 21. O EL PAÍS também tentou, sem sucesso, manter contato com esse advogado que foi assessor do Governo regional de Lima em 2002.
As atas internas da BPA citam também um pagamento de 500.000 dólares (quase 1,6 milhão de reais) a Edwin Martin Luyo Barrientos, ex-presidente do Comitê de Licitações do Metrô de Lima, que foi detido em janeiro por supostamente receber subornos da Odebrecht. Os informes incluem transferências de 250.000 dólares (784.000 reais) a Jorge Peñaranda Castañeda, da empresa Alpha Consult, e a Víctor Enrique Muñoz Cuba, que acumulou 4,5 milhões de dólares (14,1 milhões de reais) através da empresa Hispamar Investments Perú.
O banco andorrano revela em suas atas o temor de que as transferências da Odebrecht a esses executivos e advogados fossem propinas. “Decidimos informar ao gestor que, para poder aceitar os clientes, teríamos que verificar se não se trata de comissões ilícitas (corrupção), e é necessário ter algum documento justificativo da atividade realizada e da origem dos recursos”, afirma o relatório.
A Odebrecht admitiu à Justiça dos Estados Unidos que pagou 29 milhões de dólares (91 milhões de reais) em subornos a altos funcionários e autoridades do Peru para obter contratos de obras públicas. Suas práticas corruptas ocorreram nos Governos de Alejandro Toledo (2001-2006), Alan García (2006-2011) e Ollanta Humala (2011- 2016).
Humala, aliás, se tornou em julho o primeiro político a ser preso pelo suposto envolvimento no escândalo. Junto a sua esposa, Nadine Heredia, o ex-presidente peruano é réu num processo de lavagem de dinheiro, no qual é acusado de receber recursos do Governo da Venezuela e da Odebrecht para as campanhas eleitorais de 2006 e 2011.
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