O gesto solidário do Barcelona que ajudou a Chapecoense a se reerguer
Time brasileiro disputa amistoso com equipe espanhola em evento de gala no Camp Nou. Partida marca volta aos gramados de Alan Ruschel, que sobreviveu ao acidente da Chape
Uma semana depois do acidente com o avião da Chapecoense na Colômbia, uma nuvem de profunda tristeza ainda cobria Chapecó, em Santa Catarina. O celular de Plínio David de Nês, o Maninho, vibra. Há um novo e-mail em sua caixa de entrada. O presidente da Chapecoense, que nem sequer havia assumido o cargo de forma oficial, fica embasbacado com a mensagem que acabara de ler. Ele vira-se imediatamente para o prefeito Luciano Buligon, que o acompanhava em um evento na cidade, e mostra a tela do celular. “É verdade?”, questiona Buligon ao notar o escudo do Barcelona na mensagem. Tratava-se de uma manifestação de solidariedade do clube catalão e, também, de um convite para disputar o tradicional Troféu Joan Gamper, que marca a apresentação do elenco blaugrana a sua torcida. O jogo acontece nesta segunda-feira, no Camp Nou, em Barcelona.
O apoio inesperado era o combustível que faltava para que a Chape pudesse recuperar suas forças. “Essa foi a maior surpresa que eu tive. O gesto do Barcelona demonstrou a grandeza do clube. Poderiam escolher qualquer equipe do mundo para jogar lá. As pessoas não têm noção do nosso sentimento quando recebemos aquela carta com o escudo do Barcelona nos convidando para o amistoso. Era um momento de muita dor e incerteza. Pensávamos que a história da Chapecoense tinha chegado ao fim”, conta Buligon. Para o prefeito, tanto o Barça quanto o Atlético Nacional, da Colômbia, que abriu mão do título da Copa Sul-Americana, acabaram sendo determinantes para o renascimento do clube catarinense. “O convite do Barcelona veio como um bálsamo para nossa ferida. Essa honra que nos foi concedida e a atitude do Atlético Nacional foram os dois maiores incentivos que tivemos para acreditar na reconstrução da Chape.”
Além de promover a partida, o Barcelona doou, ainda no ano passado, 250.000 euros (900.000 reais) para ajudar na remontagem do elenco da Chapecoense. Embora tenha recebido diversas homenagens e convites para amistosos ao redor do mundo, a quantia oferecida pelo Barça foi o único apoio financeiro que a Chape ganhou de outras equipes – ressalva feita ao Atlético Nacional, que, ao ceder o título da Sul-Americana aos catarinenses, automaticamente renunciou à premiação de 6,9 milhões de reais da Conmebol. “Acima do dinheiro, ficamos muito lisonjeados por receber ajuda de uma instituição gigantesca como o Barcelona. Eles foram os primeiros a nos estender a mão e a confortar nossos corações”, diz Maninho.
Depois de conquistar seu primeiro título internacional e participar pela primeira vez da Copa Libertadores da América, a Chapecoense, que há menos de dez anos disputava apenas a quarta divisão nacional, se prepara para mais uma página notável de sua história ao debutar em gramados europeus e medir forças com um dos maiores clubes do mundo. Mas a diretoria alviverde teve de se desdobrar para não declinar o convite. Foi preciso convencer a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a adiar uma partida do Campeonato Brasileiro, já que Barcelona é apenas a primeira parada na longa viagem da Chape. Na mesma semana, o time brasileiro ainda disputará amistosos contra Lyon (FRA) e Roma (ITA) e depois vai ao Japão para o confronto com o Urawa Red Diamonds, pela Copa Suruga.
A engenharia para definir o time que jogará no Camp Nou também é complexa. Neste domingo, menos de 24 horas antes de encarar o Barça, a Chapecoense enfrenta o Coritiba pelo Brasileirão. Para não comprometer o desempenho na competição nacional, a solução foi dividir o elenco em dois grupos. Um deles, de 15 jogadores, viaja com antecedência a Barcelona, enquanto a equipe titular joga em Curitiba e, em seguida, se junta à delegação em solo catalão na segunda-feira. Entre os 11 que deverão entrar em campo contra o Barcelona, o mais conhecido é o goleiro Artur Moraes, que já defendeu o Benfica (POR).
Nesta temporada, a prioridade do clube é permanecer na primeira divisão. Após a tragédia, foi cogitada a possibilidade de que a CBF concedesse à Chapecoense uma imunidade de três anos contra o rebaixamento. Mas os próprios dirigentes rechaçaram o benefício, afirmando que a equipe fazia questão de enfrentar seus adversários em condição de igualdade. O clube começou bem o ano ao conquistar de cara o Campeonato Catarinense, vencer na estreia da Libertadores, fora de casa, e liderar o Campeonato Brasileiro por três rodadas.
No entanto, a partir de maio, as coisas mudaram. A Conmebol puniu o clube pela escalação irregular do zagueiro Luiz Otávio, eliminando-o da Libertadores. Por sua vez, a torcida se mostrava impaciente com a queda de produção do time. Contratado para remontar o elenco no fim do ano passado, o técnico Vágner Mancini acabou demitido em julho – Vinicius Eutrópio assumiu seu lugar. É grande também a insatisfação de famílias das vítimas do acidente, que até hoje cobram indenizações e acusam o clube de explorar a tragédia. Parte da renda da partida contra o Barcelona será destinada à associação de familiares dos jogadores que perderam a vida na Colômbia.
Os problemas, entretanto, não tiram o entusiasmo da Chape e de seus torcedores com a excursão internacional. Alan Ruschel, Neto e Jackson Follmann, os três atletas que sobreviveram ao acidente, estarão com a delegação, mas apenas Ruschel vai entrar em campo. Diante do Barcelona, o lateral-esquerdo fará sua reestreia no futebol após oito meses de recuperação. Ele deve jogar em torno de 40 minutos como meia-armador, para minimizar o desgaste em seu retorno aos gramados. “Tive o privilégio de uma segunda chance. E eu não vou desperdiçá-la. É um sonho poder voltar em um jogo tão importante como esse contra o Barcelona”, diz Ruschel.
A intenção da Chapecoense é aproveitar a experiência como uma espécie de intercâmbio com o Barcelona. Um profissional do departamento de marketing viajou para a Espanha uma semana antes do encontro para conhecer a estrutura e as boas práticas de gestão do Barça. Por outro lado, o clube, embora com um time bastante modificado, quer provar que tem condições de participar dignamente de grandes eventos internacionais. “O jogo contra o Barcelona é um grande desafio para nós”, afirma o diretor Rui Costa. “Fizemos um extenso planejamento para essa partida e vamos mostrar ao mundo a organização e o profissionalismo que sempre marcaram a história da Chapecoense.” Para a partida desta segunda-feira, a Chape utilizará uma camisa especial que estampa 73 estrelas, em referência ao ano de fundação do clube. E promete se empenhar ao máximo para honrar a memória de seus antigos guerreiros.
Ocasiões especiais exigem trajes especiais. Preparamos um novo manto para o jogo contra o Barça! 💚⚽️🏹#VamosChape pic.twitter.com/zk3pxi7GLI
— Chapecoense (@ChapecoenseReal) August 2, 2017
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