Política é coisa de mulher, sim, e temos provas
Dados mostram que, na média, parlamentares mulheres produzem e aprovam mais projetos de lei do que os homens
O Brasil ocupa o 152º lugar no ranking internacional da Inter-Parliamentary Union sobre a presença feminina nos parlamentos, ficando atrás não só dos nossos vizinhos México e Argentina, como também de países como a Somália, onde a mutilação genital feminina ainda é uma realidade, e o Afeganistão, que a...
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O Brasil ocupa o 152º lugar no ranking internacional da Inter-Parliamentary Union sobre a presença feminina nos parlamentos, ficando atrás não só dos nossos vizinhos México e Argentina, como também de países como a Somália, onde a mutilação genital feminina ainda é uma realidade, e o Afeganistão, que até pouco tempo atrás era considerado um dos países mais perigosos do mundo para as mulheres.
Em 2016, o Fórum Econômico Mundial constatou que, se a implementação de políticas de gênero continuasse no mesmo ritmo, o Brasil levaria 95 anos para atingir a igualdade entre homens e mulheres. Nós, mulheres, não queremos e não podemos esperar todo um século para que nossos direitos sejam plenamente garantidos. Mas por que toda a sociedade, incluindo os homens, também deveria querer mais mulheres na política?
A resposta é simples: para além da justiça representativa, os dados mostram que, na média, as mulheres eleitas trabalham mais e são mais eficientes do que os homens. É o que mostra o levantamento coordenado pelo Instituto Vamos Juntas, movimento suprapartidário do qual fazemos parte e que trabalha por mais mulheres na política. O estudo analisou a atuação parlamentar entre os anos de 2015 e 2020 e mostrou que, apesar das mulheres ocuparem apenas 15% das cadeiras do Congresso, proporcionalmente, elas produzem e aprovam mais projetos de lei do que os homens.
Nesse período, as deputadas apresentaram 40% mais projetos de lei ordinária, complementar e de emenda constitucional do que os seus colegas homens. Entre os parlamentares que melhores desempenham, temos uma diferença expressiva. Enquanto 36% das mulheres apresentaram mais do que 14 projetos por ano, somente 24% dos homens apresentaram a mesma quantidade. Já entre os que desempenham pior, 27% dos deputados homens apresentaram menos do que três projetos por ano, enquanto apenas 13% das colegas mulheres apresentaram a mesma quantidade por ano.
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Clique aquiQuando o assunto é articulação política para a aprovação dos projetos, as mulheres também se destacam na Câmara dos Deputados. Mesmo sendo minoria nos cargos de liderança e presidindo apenas 4 das 27 comissões parlamentares, as mulheres obtiveram quase o dobro de sucesso na aprovação dos seus projetos. Isso porque, como outros estudos já demonstraram, as mulheres tendem a trabalhar de forma mais colaborativa. A Bancada Feminina é um grande exemplo dessa cooperação. Em 2020, a Bancada foi responsável pela aprovação de 24 projetos de lei, sendo que 9 dessas aprovações se deram em um único dia.
Uma maior presença das mulheres na política também impacta quais temas serão priorizados no debate político, fazendo com que a educação e a saúde, por exemplo, tenham maior espaço na agenda legislativa. Mesmo ocupando apenas 15% das cadeiras, as deputadas são responsáveis por 22% dos projetos relacionados à educação e 25% dos projetos da área da saúde.
O nosso objetivo ao expor esses dados não é promover uma competição entre homens e mulheres. Muito pelo contrário, o que queremos é que toda a sociedade participe desse debate, entendendo que uma política mais representativa da nossa diversidade produz resultados que beneficiam a todos.
Além disso, a fotografia trazida por esse levantamento desmente muitos dos preconceitos que ainda são reproduzidos por algumas pessoas. Falas como “homens são naturalmente mais aptos para a política” ou “política não é coisa de mulher” perdem o seu sentido diante de dados que demonstram que as mulheres têm muito a contribuir para a construção de uma política que, de fato, represente os anseios da população. Por isso mesmo, a luta por uma maior igualdade de gênero na política não pode ficar restrita a um nicho específico; essa deve ser uma luta de todos que se preocupam com a construção de um país mais justo e desenvolvido.
Tabata Amaral, fundadora e presidente de honra do Instituto Vamos Juntas, deputada federal (PDT-SP) e cientista política e astrofísica formada pela Universidade de Harvard.
Talita Nascimento, presidente do Instituto Vamos Juntas, mestre em políticas educacionais pela Universidade de Columbia e advogada formada pela USP.