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Orléans e Bragança: “Se alguém da bancada do PSL cair na velha política, serei o primeiro a denunciar”

Eleito deputado na onda Bolsonaro, Luiz Philippe de Orléans e Bragança propõe uma democracia parlamentarista e diz que disputa da base do PSL ainda não acabou

Luiz Philippe de Orléans e Bragança, diante de uma bandeira do período imperial, em seu apartamento.
Luiz Philippe de Orléans e Bragança, diante de uma bandeira do período imperial, em seu apartamento.Marcelo Justo

Eleito para seu primeiro mandato de deputado federal, o cientista político e empreendedor Luiz Philippe de Orléans e Bragança (Rio de Janeiro, 1969), carrega o DNA da família real brasileira. É chamado de príncipe, mas esse seria apenas um título simbólico, caso o Brasil ainda fosse um país monárquico. Na prática, ele não está na linha de sucessão. É daqueles membros da família real que recebem críticas por não lutar veementemente pelo retorno do império brasileiro, apesar de o desejar. Defende o parlamentarismo.

Nos próximos quatro anos, o herdeiro da extinta monarquia promete fiscalizar até os seus colegas ativistas do PSL e pretende sugerir leis que consigam criar freios e contrapesos ao sistema político brasileiro. Nas últimas duas semanas, a reportagem conversou com o príncipe em três ocasiões: na Cúpula Conservadora das Américas, em Foz do Iguaçu, na diplomação do presidente eleito Jair Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, e por telefone. A entrevista a seguir é uma síntese desse último contato.

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Pergunta. O seu nome chegou a ser cotado para ser vice de Jair Bolsonaro. Por que as conversas não prosperaram?

Resposta. Foi pouco tempo de interação com o Jair e houve muita urgência de se tomar essa decisão. É um cargo de extrema confiança. Fiquei muito grato e surpreso por ele ter me considerado. Eu não me considerava nem próximo do radar e me colocaram ali. Foi uma validação muito respeitosa do ponto de vista dele. Ele tinha uma necessidade de escolher quem de fato ele conhece porque o cargo é de alta confiança. O vice tem de ser alguém que nunca vá trair ele e esteja alinhado na perspectiva ideológica. O general [Hamilton] Mourão já tinha esse alinhamento anterior. O Mourão sempre foi o candidato que ele tinha como uma das principais opções. Quando ele avaliou o meu nome, talvez ele estivesse buscando uma segunda opção que neutralizasse esse aspecto que a imprensa poderia construir contra ele de unir apenas militares, de que os militares estariam de volta ao poder. Não acho que eu alteraria o resultado, o Bolsonaro iria ganhar de qualquer maneira e o Mourão é uma ótima escolha. É uma pessoa equilibrada, culta, superpreparada. Ele escolheu quem ele confiava mais.

P. Qual foi o peso de Jair Bolsonaro em sua campanha? Acredita que ele foi fundamental para sua eleição?

R. Fiz minha campanha totalmente independente da vinculação de meu nome com o dele. É óbvio que todos que vinham para as minhas palestras, como o processo eleitoral foi um mês depois da quase nomeação como vice, boa parte estava ali porque entendia que eu estava favorável ao Jair Bolsonaro. O jeito que eu conduzi a campanha eu não era contra, naturalmente eu me colocava a favor. Eu conduzi através das ideias. Fiz uma militância ideológica, com relação à mudança de sistema. Aqueles que votaram em mim estão mais vinculados à mudança no sistema do que vinculados a mim próprio ou Jair Bolsonaro. Não considero meu eleitor o eleitor típico do Jair Bolsonaro. Eu abranjo uma gama mais diversa, alguns eleitores que não votariam no Jair, votariam em mim, em função de conhecer minhas ideias. Mas não diria que são todos. A maioria é de apoiadores do Bolsonaro, sim. Mas, como prioridade eles estão confiando nas ideias que estou carregando comigo.

P. A volta de militares ocupando postos-chaves da política brasileira causa temor em parcela da população. Você acha que Bolsonaro tem compromisso com a democracia? Descarta a possibilidade de qualquer intervenção militar?

R. É uma narrativa totalmente falsa. Criada por todos esses partidos da esquerda, junto com o Supremo Tribunal Federal e alguns juízes que sempre foram contrários ao conservadorismo e que taxam de antidemocrático qualquer coisa que venha do Jair. Na minha experiência com o Jair, que foi pouca, mas intensa, mostra o contrário. A minha seleção para ser vice ele colocou a voto quem deveria ser o vice dele. Teve uma seleção prévia entre mim, Janaína Paschoal e Marcos Pontes. Qual outro presidente colocou a voto seu vice?

P. A voto, como? Pelas redes sociais? Quem eram os eleitores?

R. Era a própria base do Jair. Ele fez pelas redes sociais e também em um evento em que ele perguntou quem o público queria que fosse o vice. Foi por aclamação. Pelas redes sociais eu tinha perto de 70% dos seguidores dele e, na aclamação também. Apesar de ser difícil se medir aplausos. Enfim, esse aspecto de democracia que tentam colocar contra o Jair é totalmente falso. Nesse ponto, precisamos ter uma discussão mais profunda, porque essa questão de democracia que o PT e a esquerda pregam é, no melhor dos casos, uma democracia de massa.

P. O que seria essa democracia de massa?

R. São mobilizações de hordas que não são cognitivas. Não são pessoas que estão ali, dotadas de querer de fato eleger um representante. Muito pelo contrário. São mobilizações de desespero em que os problemas são distantes. São problemas nacionais monumentais e que somente um líder forte, igualmente magnânimo e grandioso poderia resolver. Essa democracia que o PT criou, que é uma democracia de massa, é totalmente o problema do Brasil. Temos de ter uma democracia local, próxima, distrital. Que os problemas sejam resolvidos localmente. E que a população se sinta forte o bastante para resolver por conta própria, não precisa de representante. A democracia do PT é pró-grandes líderes. Nesse aspecto, também sou contra essa democracia. Se por acaso ainda se chamarem de democratas, que de democratas não tem nada. O plano do Fernando Haddad era de censura da mídia, controle do Judiciário, interferência em toda a economia. Como se chama aquilo de democrático? Não tem nenhuma nuance de democracia ali.

P. Como está avaliando essa questão do Coaf envolvendo um ex-funcionário do senador eleito Flávio Bolsonaro? Acha que faltaram explicações?

R. Tudo tem de ser averiguado. Estamos vindo com força e legitimidade mudar as coisas. Então, a gente tem de dar o exemplo. Se tem coisa errada, tem de ser investigado e levado a cabo até o final. Seja de quem for.

P. E a disputa pelo protagonismo da bancada do PSL? Brigas no WhatsApp, discussões por espaço. Isso foi superado?

R. Ainda não está superado porque temos de eleger quem será líder do partido. O processo tem de ser respeitado, mas ele ainda precisa ocorrer. Esse foi o debate. O Eduardo Bolsonaro não quer esse protagonismo, e então ele abre um flanco que é uma pena que existe. E vamos definir uma liderança que seja representativa, que seja um bom interlocutor.

Essa democracia que o PT criou, que é uma democracia de massa, é totalmente o problema do Brasil

P. Vai entrar nessa disputa? Deve concorrer a líder do partido ou se coloca para líder do Governo?

R. Não coloco meu nome na disputa. Não me cabe disputar nada neste primeiro momento. Eu tenho de aprender o que é esse negócio de ser político. Na prática eu não conheço nada. Zero de prática. Teoria eu tenho alguma coisa.

P. Por que entrou na política?

R. Não foi por nada positivo. Não foi nenhuma motivação por conquista de glória nem nada do gênero. Foi revolta com o sistema atual. Indignação, mesmo. E frustração com o ativismo que surgia contrário ao sistema.

P. O que significa isso?

R. Significa que lá em 2014, as manifestações estavam muito rasas, estavam focadas em personalidades, em questão de corrupção, era contra a Dilma Rousseff. Tudo muito vago. E eu já estava vendo um problema sistêmico do negócio. Via que não era só a Dilma, o problema. Ela fez o que o sistema permitiu que ela fizesse. Assim como o Lula, o Temer, o FHC e o Collor. Você tem um sistema que é realmente o problema. A gente tem um presidencialismo com poucos freios e contrapesos. Há muita concentração de poder, e pouca transparência. Vamos colocar em perspectiva. O Brasil é o melhor sistema presidencialista dos países organizados como o próprio Brasil.

P. Quais seriam esses países?

R. Os países da América Latina, da África e de boa parte da Ásia. Temos instituições, separação de poderes, Judiciário independente, uma série de coisas. Agora, tudo é grau de intensidade. É tão sofisticado como o modelo europeu? Não. É tão descentralizado como modelo presidencialista norte-americano? Não. Nós não temos a prática de buscar outros canais ao poder, senão o de eleição de legislativos e de poderes executivos.

P. Aí está a concentração de poder?

R. Sim. Acabamos concentrando o poder no Executivo, com um presidencialismo extremamente poderoso. E há uma concentração de poder em Brasília. O que seriam os dois grandes problemas aqui.

P. Qual o modelo ideal, em sua opinião?

R. O parlamentarismo. Os modelos parlamentaristas europeus são mais estáveis, com muito mais freios e contrapesos. Em que a sociedade não fique à mercê de um poder Executivo em tamanho grau que o Brasil fica. É intensa uma eleição presidencial. Não é intensa uma eleição para primeiro ministro. Você faz uma troca de primeiro ministro tranquilamente. E o sistema é tão desfavorável a quem quer fazer dinheiro do próprio sistema.

Luiz Philippe diante de um quadro do imperador Dom Pedro I.
Luiz Philippe diante de um quadro do imperador Dom Pedro I.Marcelo Justo

P. Está dizendo que o parlamentarismo reduz a corrupção?

R. Sim. O sistema parlamentarista europeu é péssimo para quer ser corrupto. Um sistema presidencialista como o nosso, não. Você vê o tamanho do Orçamento que o Jair Bolsonaro vai concentrar. É mais de 2,3 trilhões de reais. Em nível estadual também é grande a concentração. São volumes monumentais. Em um sistema em que o Executivo é dono do Orçamento e pode cooptar o Legislativo – em todos os níveis, do municipal ao federal— temos corrupção. Há compra de favores do Legislativo. Aí, você tem um agravante, as políticas estatizadoras. Criou-se várias estatais com o argumento de que tudo é estratégico. Correio, banco, alimento, mineral. Tudo é nacionalizado, tudo vai para a mão do Estado. Cria-se milhares de cargos a serem preenchidos a cada Governo. Aí você tem deputados da velha política correndo para os novos ministérios querendo dar seu cartãozinho, querendo nomear pessoas na máquina estatal em seus Estados. Isso é um absurdo. Isso continua.

P. Você testemunhou essa corrida por cargos no Governo Bolsonaro?

R. Testemunhei, mas não vou citar nomes. Dos 52 deputados do PSL, 48 são deputados novos. Eu me incluo entre eles. Você tem alguns que já são tarimbados. Tenho levantado essas questões para os novos, principalmente. A maioria é ativista político e quer mudar o Brasil. Tem poucos que já são de segundo ou terceiro mandato, que tem carreira política, e que já sabem trabalhar o sistema. Se eu não tivesse levantado esse assunto, eles estariam aparelhando o Brasil inteiro sozinhos sem os outros deputados saberem. Aí, os novos dizem: “Pô, como é que eu também vou nomear”.

P. Você citou essa questão dos cargos para os seus colegas em alguma das reuniões que tiveram recentemente. É isso?

R. Sim. Citei para eles. E agora eu usaria um termo em inglês que é muito bom para este momento: the cat is out of the bag (o gato está fora do saco). Tá todo mundo vendo o que está fora do saco. E estamos todos atentos. Eu estou muito feliz com a bancada do PSL. Estou me surpreendendo, eu achava que ia me decepcionar, mas me enganei. Você tem uma dinâmica de ativistas que entraram para o partido e que estão fiéis em sua missão como ativistas. E, se os ativistas caírem para a velha política, eu serei o primeiro a denunciar. Eles estão sendo bem rigorosos e salvando várias reuniões. Também tem os militares que, de fato, estão comprometidos com essa mudança. Classistas que ainda têm dentro do grupo do PSL terão de se readequar.

P. Como seria essa readequação? Serão chamados para uma conversa?

R. Essa é uma dinâmica que perpassa por todos os partidos. Você tem partidos que são dominados pelo classismo. O PSL é um dos mais limpo em termos dessa dinâmica, mas ainda têm alguns com essa visão. E tem um que é zero de classismo, que é partido NOVO, mas tenho algumas reticências a esse partido. Em termos ideológicos e de coerência de postura política. Analisando nossa bancada, temos uma base interessante, muito boa, de novos deputados que vão realmente querer fazer mudança e vão ter vergonha na cara, de apontar alguma incoerência do partido de algum quesito.

P. Inclusive na nomeação de pessoal para cargos no Governo?

R. Te dou um exemplo com relação à nomeação. Alguns colegas já levantaram a pergunta sobre quem estava aparelhando um ou outro ministério. Na Infraestrutura já notaram que geralmente era o pessoal do PR. Aí uns disseram: “Vamos botar o nosso pessoal lá”. A priori, eu sou pró-limpeza. Somos contra a nomeação de pessoas sem o preparo técnico para ocupar tal posição. Agora, o problema é a gente estar nomeando para esses cargos. Porque neste momento somos nós, em um segundo momento pode ser qualquer outro partido. E o brasileiro fica à mercê desse jogo.

P. Pelo que estou entendendo, em sua opinião, o Bolsonaro deve fugir desse loteamento. Mesmo ele cedendo ministérios para alguns políticos filiados a partidos como MDB, NOVO e DEM. É isso?

R. Absolutamente. E ele está fazendo isso. Ele está nomeando para os ministérios rigorosamente seguindo critérios técnicos. É claro que tem abertura para um ou outro deputado. Mas são pessoas preparadas que acabam escolhendo um ou outro técnico preparado. Agora, a dinâmica de nomear só pelo partido, só pela indicação de algum parlamentar, não é boa para o Brasil. A cada mudança de Governo você ter esse tipo de coisa acontecendo é muito perigoso. É isso o que tínhamos com o PT. A grande luta com o PT foi essa. São 4.000 cargos.

Acabamos concentrando o poder no Executivo, com um presidencialismo extremamente poderoso.

P. Não, deputado. São mais de 23.000 cargos comissionados.

R. Pois é. Bem maior. Fora a máquina estadual. Enfim, tem de acabar com estatais. É isso o que cria o maior problema para o Brasil. O Brasil é aparelhável sistematicamente. Ninguém olha o óbvio. No fundo estamos nomeando para a burocracia. A sua burocracia é aparelhável a cada quatro anos. Ela muda em função da mudança de Governo. E ela está mais leal a questões ideológicas, partidárias do que a questões técnicas. Você não tem estabilidade jurídica. Na estrutura atual tudo depende dos partidos.

P. E essa dependência dos partidos é sustentável?

R. Veja, o Jair Bolsonaro entrou com 57 milhões de votos. O que representa quase 60% do eleitorado, e não temos nenhum partido que representa esses 60% do eleitorado no Congresso Nacional. O PSL chega a 15%. Aí, temos um Executivo que concentra um posicionamento político majoritário, mas não reflete na parte legislativa. Aqueles que elegeram Jair Bolsonaro também votaram em deputados do MDB, do PSDB, e em outros partidos que poderiam compor uma grande base de apoio, que daria mais segurança legislativa para o Governo. Essa base, na teoria, não existe. E é exatamente nesse ponto que o parlamentarismo é melhor, você não consegue formar um Executivo se você não tiver uma maioria legislativa. Eu não preciso falar que o Lula é bandido ou a Dilma é uma idiota, porque tem trilhões de pessoas dizendo isso, mas eu preciso apontar é como funciona o sistema que permite essas pessoas de fazerem o que elas fizeram. E elas não o fizeram só porque eram más intencionadas. Uma pessoa de mal intento, em um sistema transparente, com freios e contrapesos, ela tem sua capacidade de fazer o mal limitada.

P. Em seu mandato vai tentar trazer o parlamentarismo de volta?

R. Absolutamente. Estarei sempre discutindo essas questões.

P. Em alguns eventos notei que há militantes que te procuram para tirar fotos com a bandeira do período imperial. A volta da monarquia é algo que está em sua agenda?

R. Esse é um movimento social que cresceu muito e espontaneamente. A família [real] não está fazendo nada, não estabeleceu data, não tem mobilização. Acontece à medida em que as pessoas sabem a história e contextualizando e desmistificando mitos de mais de cem anos. São pessoas que notam que nenhum sistema é perfeito, mas começam a questionar o que tínhamos no período do império e perdemos agora. Isso tudo vem à tona espontaneamente. Mas eu não tenho nenhuma proposta na mesa para a volta da monarquia. Eu quero estabilizar os nossos sistemas político e econômico. Eu conseguindo fazer isso, minha missão está dada.

P. Como seria essa mudança que você almeja?

R. O que causa instabilidade de nosso sistema é você ter muita intervenção de Estado na economia, muito dirigismo e regulamentação e não ter a livre iniciativa no comando. Você tem o Estado no comando disso tudo. Portanto, é desestabilizador a longo prazo. A curto prazo pode até ver um benefício aqui e acolá. Nada mais é que uma distorção de uma realidade que não é insustentável. É o que causa quebras. O Estado intervém, cria-se uma bonança falsa e dez anos depois tem uma quebra geral do país. E isso causa também efeitos políticos. Nos anos 1970 foram de bonança no Brasil, liderado pelos militares, crescimento absurdo, dois dígitos por ano, o milagre econômico. E nos anos 80 foram os da falência do Brasil. Tivemos de pagar tudo aquilo que foi feito nos anos 70. O mesmo se gerou com Lula e Dilma. Altos investimentos e uma alta propensão a fazer grandes obras. E agora, vemos a quebra desse modelo que não é sustentável. Esse modelo não gera riqueza e você tem de girar riqueza para criar uma classe média mais forte e maior, tirar gente da pobreza. Temos de fato de nos tornarmos um país favorável à livre iniciativa e desfavorável às intervenções de Estado, planos nacionais e todas essas baboseiras que vivemos nos últimos 100 anos.

P. E no campo político?

R. Do ponto de vista político, você precisa fragmentar o poder. O problema é a concentração demasiada, o controle muito fácil de dinheiro com prefeitos, governadores e presidente controlando orçamentos monumentais e poucos mecanismos de freio dos diversos poderes. Como você tem pouca representatividade legislativa, você tem de esperar que ele cometa um crime grave para que sofra o impeachment. Ou esperar para exercer um voto contrário em um ciclo eleitoral futuro. Isso é muito pouco. Temos de criar mecanismos de democracia como um recall de mandato para começar frear essa dinâmica política que também é destrutiva. O governador ou presidente eleitos hoje têm o poder de criar mais poderes, cria bancos, estatais, autarquias. Se eles querem criar mais poder para eles mesmos, tem de ter um referendo. Tem de ter uma maneira de frear ou plebiscitar essas medidas. Isso neutraliza a ascensão de poderes nominativos que não são validados democraticamente pelo voto ou por interferência direta nossa. A descentralização política é fundamental nesse processo. Trazer o eleito mais próximo do eleitor, através do voto distrital, do recall de mandato e referendar as medidas de criação de mais Estado.

P. Não te interessa o retorno da monarquia?

R. Eu adoraria que tivéssemos um sistema monárquico. Eu não estou na linha sucessória, não seria eu o rei. Esse movimento tem caminhado naturalmente com a população, que tem acesso à informação independente. Eu até sou criticado pelos monarquistas: “pô, você não está fazendo nada pela monarquia”! Não estou, mesmo. Tem de ser algo natural. Tem vários cabos eleitorais. As pessoas capturam a realidade e tomam suas próprias opiniões. Cada monarquista que se apresenta é o nascimento de um novo brasileiro. O que para nós é uma realidade muito positiva. Essas pessoas concluírem que, em um momento, vivemos em um país sério.

P. Você costuma dizer que um dos primeiros golpes brasileiros foi o fim da monarquia, em 1889. É isso, mesmo?

R. Isso está bem aceito entre a academia, seja o historiador de esquerda ou de direita. É um fato consumado. Foi um golpe militar. Não tem nenhum observador independente que não conclua isso. Obviamente que, tem uns que foram favoráveis a esse golpe e pormenorizam o fato que houve um golpe. Dizem que o Pedro II era velho, o modelo era antigo, que monarquia era um retrocesso. Eles não falam que foi golpe.

P. Boa parte da bancada eleita pelo PSL contra o casamento de homossexuais e aborto. Nesses temas como você se posiciona?

R. Não sei por que se posicionar. Não vejo nenhuma lei sendo colocada contrária ao casamento homossexual. Não vejo nenhum político conservador sugerindo uma lei para alterar a atual regra do aborto. Você faria um grande favor aos seus colegas em definir melhor o que significa esse “se posicionar”. Não há nenhuma urgência de nada, nenhum candidato conservador está propondo nada diferente. Não somos nós que queremos alguma coisa. São os progressistas que querem algo muito além do razoável. Eles é que querem dar o direito universal ao aborto, eles que querem promover todo o tipo de casamento como algo legítimo e legal. Isso está errado. A lei atual já incorpora os homossexuais e já incorpora exceções à possibilidade de aborto. Então, para que mudar isso?

P. E por que não mudar?

Os progressistas querem destruir mais. Querem promover o casamento homossexual para criancinhas nas escolas.

R. Os progressistas querem destruir mais. Querem promover o casamento homossexual para criancinhas nas escolas. É isso o que a gente é contra. Essa questão tem de ser pontuada de maneira mais inteligente. Os conservadores estão dando risadas sobre esse debate e que fulano é contra o aborto. Somos a favor e manter a lei como está. O que ocorre sistematicamente na imprensa é que se faz um frame da pergunta de maneira errada. É claro que eu não sou a favor do aborto. Agora, eu sou contra o progressismo que quer transformar o aborto como algo fundamental e um direito universal de toda mulher. Eles estão se mobilizando do outro lado lá e querem mexer na lei. Ela está certa já.

O monarquista do Congresso

A.B.

Nos últimos três anos Bragança, formado em administração pela FGV e com mestrado em Stanford, nos EUA, dedicou-se a militar politicamente por intermédio do movimento liberal Acorda Brasil. Esteve entre os defensores do impeachment de Dilma Rousseff (PT) e percorreu boa parte do país participando de debates sobre as crises política, econômica e institucional. O assunto lhe rendeu um livro: "Por que o Brasil é um país atrasado?" (Ed. Novo Conceito). Os temas que desenvolveu nessa obra se transformaram em longa explanações feitas em uma espécie de palanque.

Na campanha eleitoral, ao invés de comícios ou passeatas, ele fazia palestras de até três horas –já eleito explicou, por exemplo, que em sua visão o DEM de Rodrigo Maia, ex-PFL e ex-Arena na ditadura, é de "esquerda". Segundo ele, foram essas apresentações que lhe renderam parte considerável de seus 118.457 votos pelo PSL de São Paulo. "Aqueles que votaram em mim estão mais vinculados à mudança no sistema do que vinculados a mim próprio ou a Jair Bolsonaro", afirmou ele ao EL PAÍS, sem negar o peso que a onda Bolsonaro teve para o seu sucesso. O príncipe chegou a ser cotado para ser vice-presidente de Bolsonaro, mas foi preterido pelo general Hamilton Mourão (PRTB).

Por quase todo evento público em que transita, Bragança é parado por algum “monarquista”, que pede para tirar uma foto. Geralmente portam a bandeira imperial do Brasil (como a de uma das fotos que ilustram essa reportagem). Os pedidos são atendidos e as conversas, ou entrevistas, encerradas com um discreto sorriso.

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