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De que JBS e BRF são acusadas? Comer carne é seguro? Entenda a operação da PF

Engenheiro de Alimentos comenta supostas irregularidades cometidas por frigoríficos Segundo a investigação, fiscais receberam propina para afrouxar controle sobre produtos

Funcionários trabalham em frigorífico de Brasília.
Funcionários trabalham em frigorífico de Brasília.Eraldo Peres (AP)

A Operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal na semana passada, atingiu quase três dezenas de empresas, entre elas grandes nomes do setor alimentício, como a JBS e BRF.  O escândalo fez com que importadores, entre eles a União Europeia e a China, anunciassem restrições temporárias à entrada de carne brasileira em seus territórios. O Governo tem reiterado que o problema é pontual. Até o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, fez críticas à divulgação feita pela PF e apontou erros no relatório. O EL PAÍS consultou especialistas para responder alguns questionamentos sobre o tema:

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1 - Quais as principais acusações contra as empresas?

As acusações são variadas e não envolvem igualmente as companhias citadas, que negam irregularidades. Incluem o suposto uso de fraudes para ocultar o uso de carne vencida ou colocar produtos proibidos em linguiças (frigorífico Peccin, do Paraná); tentativa de mudar data de validade de embalagens (JBS), esquema de corrupção entre frigoríficos e fiscais para acelerar a liberação de produtos (JBS); o suposto oferecimento de suborno para evitar suspensão de uma unidade ou injeção de mais água do que permitido em frangos (BRF); e substituição de carne de peru por soja em salsichas enviadas para merenda escolar (Souza Ramos).

2 - Qual a extensão da investigação? Quantas empresas estão envolvidas?

Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento são 21 os frigoríficos envolvidos na investigação da Polícia Federal deflagrada na última sexta-feira. Do total, 18 estão localizados no Paraná, dois em Goiás e um em Santa Catarina. Seis deles exportaram produtos para o exterior nos últimos dois meses. Três estão interditados e os demais estão sendo auditados. Entre os investigados estão: Frigorífico Oregon, Frango Dm Indústria e Comércio de Alimentos, Seara Alimentos (que é da JBS), Peccin Agro Industrial, BRF, Frigorífico Argus, Frigomax Frigorífico e Comércio de Carnes, Indústria e Comércio de Carnes Frigosantos, Jjz Alimentos, Balsa Comércio de Alimentos Eireli, Madero Industria e Comercio, Frigorífico Rainha da Paz, Indústria de Laticínios S. S. P. M. A., Breyer & CIA, Frigorifico Larissa, Central de Carnes Paranaense, Frigorífico Souza Ramos, E. H. Constantino & Constantino, Fábrica de Farinha de Carnes Castro e Transmeat Logística, Transportes e Serviços.

3 - O produto utilizado para "maquiar a carne" vencida do frigorífico Peccin, citado pela PF, é nocivo para a saúde?

No documento do juiz que autorizou as prisões preventivas na Operação Carne Fraca, há relatos de fiscais sobre uso de ácido ascórbico- a popular vitamina C- pelo frigorífico Peccin, para "maquiar" o aspecto da carne vencida. Porém, no mesmo documento, um interlocutor cita também outra substância: o ácido sórbico, que é um conservante. São substâncias diferentes e o uso de qualquer uma delas em carne fresca ou congelada, no entanto, é crime. "A carne in natura no Brasil não pode ter nenhum tipo de aditivo, seja conservante como é o sórbico, seja em um antioxidante como o ascórbico", explica defende Marco Antonio Trindade, professor de Engenharia de Alimentos da USP. Os dois produtos, entretanto, são permitidos em alguns tipos industrializados de carne. "Eles podem e devem ser utilizados como coadjuvantes de processos. Em produtos embutidos eles podem ser utilizados em alguma quantidade". O professor alerta que como todo aditivo e substância química, caso seja usado em excesso ele pode causar câncer. "Se o limite for seguido, não é nocivo".

4 - A PF acusa a BRF de usar papelão no preparo de embutidos. Isso faz sentido?

A Polícia Federal afirmou que carnes eram misturadas com papelão. Mas, de acordo com nota da BRF, o áudio capturado pelos investigadores foi mal interpretado. A companhia defende que ao mencionar o papelão, o funcionário estava se referindo às embalagens do produto e não ao conteúdo. "Quem conhece um pouco de frigorífico sabe que aquilo não tem nada a ver. Aquilo era uma discussão de embalagem ou coisa assim. Ninguém faria uma barbaridade dessa com uma coisa tão errada como essa", defende Marco Antonio Trindade, da USP. Francisco Turra, presidente da Associação de Proteína Animal (ABPA) também defende que as falas foram deturpadas. "Essa história do papelão misturado... não existe essa possibilidade. O áudio deixa bem claro. Inclusive, todas as embalagens que a indústria usa precisam ser aprovadas", afirmou nesta segunda-feira em coletiva de imprensa.

5 - É proibido usar cabeça de porco em linguiça, como mencionam nomes do frigorífico Peccin em áudios que a PF diz ter?

Nas gravações obtidas pela PF, sócios da Peccin falam sobre o uso da carne de cabeça de porco em uma linguiça. A carne de cabeça de suíno é permitida, no entanto, só para alguns produtos e em determinada quantidade. A lei permite o uso em produtos específico, como cozidos ou enlatados. Já em linguiça de churrasco, chamada linguiça frescal, esse tipo de carne é proibido, pois não passa por cozimento. Outra irregularidade apontada pela PF é que algumas empresas vendiam frango com mais água que o permitido. Segundo a lei, o limite de água na ave é de 8% de seu peso.

6- Os brasileiros devem parar de consumir carne?

Não há nenhuma recomendação oficial para que se suspenda o consumo de carne. Segundo Marco Antonio Trindade, da USP, o sistema de inspeção sanitária no Brasil é robusto e a maioria das empresas são idôneas. "Isso aconteceu pontualmente em algumas empresas. Não faz sentido parar. As empresas que exportam ainda passam por auditorias de terceiros. A forma de divulgação foi errada e causou essa estardalhaço e medo", explica.

7 - Como identificar uma carne suspeita para consumo?

Segundo especialistas, é preciso estar atento aos aspectos sensoriais. O primeiro passo é olhar a data e a aparência da carne embalada no plástico ou à vácuo. É preciso verificar também a cor e textura do produto nos supermercados e açougues. Quando o produto for aberto em casa, é importante estar atento ao cheiro. Caso haja um odor forte ou azedo pode indicar um problema. Se a textura estiver viscosa e pegajosa é também sinal de proliferação de bactérias.

8 - Será feito um recall de carnes?

O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, informou que uma vistoria está sendo realizada nos supermercados, de produtos dos frigoríficos que estão sob investigação e que, se alguma anormalidade for constatada, haverá um "recall."

9 - Quais países já suspenderam temporariamente a importação de carnes?

A União Europeia, Coreia do Sul, China e Chile já anunciaram algum tipo de medida restritiva após estourar o escândalo da adulteração da carne. Os países também anunciaram o aumento na fiscalização da carne originada do país. A União Europeia declarou que vai suspender a importação das empresas envolvidas no escândalo. As unidades suspensas são uma da BRF localizada em Mineiros (GO), duas da Peccin Agro Industrial em Curitiba (PR) e Jaraguá do Sul (SC) e unidade da Seara, do grupo JBS, em Lapa (PR). A China informou que vai manter as carnes brasileiras nos portos até receber mais informações oficiais sobre o produto. O país é principal destino da carne brasileira. Já a Coreia do Sul proibiu, temporariamente, a venda dos produtos de frango da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão. O Chile também suspendeu temporariamente a importação de carnes.

10 - O que diz o Governo sobre o escândalo?

De acordo com números do governo, de 4.837 unidades frigoríficas sujeitas à inspeção federal, apenas 21 estão supostamente envolvidas em eventuais irregularidades, enquanto dos 11 mil funcionários do Ministério da Agricultura, apenas 33 estão sendo investigados. Nesta manhã, em evento em São Paulo, Michel Temer destacou que o número de funcionários públicos envolvidos é pequeno em comparação ao tamanho do quadro do ministério. "Nós temos sistemas rigorosíssimos de avaliação sanitária aqui no Brasil", disse o presidente.

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