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Negativa de Trump em reconhecer a derrota provoca forte tensão no Partido Republicano

Pompeo diz que haverá um segundo mandato de Trump, enquanto os senadores da Geórgia enfrentam as autoridades eleitorais republicanas de seu próprio Estado pela limpeza na apuração

O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, durante coletiva de imprensa nesta terça-feira em Washington.
O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, durante coletiva de imprensa nesta terça-feira em Washington.POOL (Reuters)
Pablo Ximénez de Sandoval

Os principais líderes do Partido Republicano em Washington estão dispostos a prolongar pelo tempo que for necessário o último e mais grave desafio de Donald Trump à realidade. Em sua recusa em reconhecer a derrota na eleição, Trump teve o apoio dos principais nomes republicanos em Washington entre domingo e esta terça-feira. O mais importante, o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, que, sem fazer coro às acusações de fraude, tentou revestir de normalidade legal um ataque sem precedentes à transição pacífica de poder.

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Nesta terça-feira houve mais uma dissociação com a realidade no mais puro estilo trumpiano. Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, disse em uma entrevista coletiva que “haverá uma transição tranquila para uma segunda Administração Trump”, ante jornalistas atônitos. Nas últimas horas, Joe Biden foi felicitado pelo presidente da França, pelo primeiro-ministro do Canadá e pelo primeiro-ministro de Israel. Poucas horas antes das palavras de Pompeo, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, falou com Biden por telefone para parabenizá-lo.

O Governo que começou sua trajetória justificando que uma mentira não é uma mentira, mas “fatos alternativos”, está elevando esse conceito a ponto de questionar o fato de que o presidente perdeu as eleições por dezenas de milhares de votos em Estados decisivos, e por quase cinco milhões de votos em nível nacional. Alguns republicanos abraçaram totalmente o discurso de que há “votos ilegais” e que, na realidade, Trump ganhou as eleições. Outros, como McConnell, não foram tão longe, mas justificam a atitude de Trump com um revestimento de legalidade e normalidade.

Em um discurso no Senado na segunda-feira, McConnell, o republicano mais poderoso de Washington, defendeu o direito do presidente de entrar com ações legais para pôr em dúvida o resultado. “Temos um ou dois Estados que estão a caminho de uma recontagem”, acrescentou McConnell. É muito provável que o resultado na Geórgia seja tão apertado que exija uma recontagem. As recontagens nos Estados Unidos às vezes encontraram erros, mas geralmente se reduzem a algumas cédulas. Nunca mudaram um resultado eleitoral de milhares de votos. E, além disso, a Geórgia é irrelevante para os números finais de Biden sobre Trump.

“Nenhum Estado certificou ainda seus resultados eleitorais”, resumiu McConnell para não reconhecer a vitória de Joe Biden. No mesmo discurso, McConnell vangloriou-se de que os republicanos conseguiram defender momentaneamente sua maioria no Senado e reduzir a maioria democrata na Câmara dos Representantes. O nome desses senadores e deputados estavam nas mesmas cédulas de Biden e Trump, aquelas que não foram certificadas e que a equipe jurídica do presidente pretende questionar nos tribunais.

McConnell, portanto, adota a linguagem de Trump, mas apenas em seu aspecto mais evidente: os votos têm que ser legais e ele tem o direito de pedir uma recontagem. Em suas palavras, ele não assume as acusações de fraude ou roubo das eleições, algo de que ninguém apresentou a menor prova durante uma semana. Com suas declarações, fica garantido que os principais republicanos no poder em Washington continuarão a fazer coro com a teoria da conspiração lançada pelo presidente para se negar a aceitar o resultado da eleição. Ninguém vai contradizê-lo.

Outros republicanos, como o senador Mitt Romney e o último presidente republicano antes de Trump, George W. Bush, parabenizaram Biden no momento em que houve um consenso nas projeções da mídia, como é tradição.

As contradições entre desejos e realidade explodiram no Partido Republicano da Geórgia. Os senadores republicanos David Perdue e Kelly Loeffler escreveram uma carta pública pedindo a demissão do secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, por causa de uma eleição que consideram “uma vergonha”. Raffensperger, como todo o governo da Geórgia, é republicano. O responsável pelas eleições respondeu dizendo que as críticas e o pedido de demissão eram “risíveis”. O governador, Brian Kemp, também adotou a linguagem de Trump, enquanto o vice-governador disse não ter visto nenhuma evidência de irregularidade.

O pano de fundo do que está acontecendo no Partido Republicano é basicamente eleitoral. Embora os republicanos tenham mantido momentaneamente a maioria no Senado, as cadeiras de Perdue e Loeffler na Geórgia se encaminham para um segundo turno em 5 de janeiro. Sem essas duas cadeiras, a maioria republicana desaparecerá, McConnell perderá seu poder (que exerce há seis anos) e Biden terá o caminho livre para negociar com um Congresso democrata.

Em outro momento, as cadeiras da Geórgia não estariam em jogo. Mas na terça-feira os democratas demonstraram que podem ganhar as eleições em nível estadual nesse Estado tradicionalmente republicano. Os números também mostram que a influência de Trump sobre os eleitores republicanos é muito intensa. Contra o prognóstico, o presidente obteve um número impressionante de votos (71 milhões) e acrescentou pelo menos mais nove milhões de eleitores ao partido nesses quatro anos.


Os republicanos precisam manter essas bases ativas e mobilizadas por pelo menos mais dois meses para defender sua maioria no Senado. Qualquer um que aspire a ganhar uma eleição, e qualquer um que aspire a liderar o partido em 2024, precisa da bênção de Trump, pelo menos no curto prazo. Ninguém se pode dar ao luxo de aparecer como um traidor. Trump permanece presidente até 20 de janeiro ao meio-dia.

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