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Congresso aprova renda básica por crise do coronavírus enquanto Planalto luta por protagonismo

Negando gravidade da crise da pandemia, Bolsonaro centraliza informação e tenta reduzir aparições de seu ministro da Saúde

Bolsonaro e o ministro Mandetta, durante teleconferência com prefeitos no dia 22.
Bolsonaro e o ministro Mandetta, durante teleconferência com prefeitos no dia 22.Presidência

O Senado Federal aprovou por unanimidade nesta segunda-feira projeto de lei que institui a renda básica emergencial de 600 reais para ajudar as famílias de baixa renda como uma reposta à crise econômica trazida pela pandemia do coronavírus. A medida durará três meses, prorrogáveis, e vai agora a sanção. Do outro lado da praça dos Três Poderes, o presidente Jair Bolsonaro, que escolheu negar a gravidade da pandemia ―que chegou a 159 mortes e 4.579 contágios no Brasil nesta segunda-feira―, ainda luta, ao mesmo tempo, para ter protagonismo no combate à Covid-19. Os desafios do Planalto são bem maiores do que apenas controle de imagem: o mais imediato é a busca por soluções logísticas para implantar o pagamento do benefício social temporário.

Enquanto os senadores votavam a proposta de renda básica que fora aprovada na última semana na Câmara, representantes de seis ministérios concediam uma entrevista coletiva no Planalto. Foi a estreia de um formato usado para retirar os holofotes do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e dividir as atenções com outras autoridades. Nos últimos dois meses, todos os dias havia um boletim epidemiológico do coronavírus que era coordenado pelo Ministério da Saúde. Por mais de uma hora, Mandetta e técnicos da pasta explicavam quais medidas eram adotadas para a contenção do vírus e atualizavam os números de casos. O grupo costumava defender medidas que têm sido impostas por governadores e prefeitos, como o isolamento social. Mas diante da postura de Bolsonaro de negar a gravidade da crise e de descumprir as recomendações das autoridades sanitárias, o Planalto decidiu espraiar entre várias pastas a divulgação dos dados. Só ao fim entrariam as explicações dos técnicos.

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No domingo, Bolsonaro não seguiu as orientações médicas e fez um passeio por mercados e centrais de vendedores ambulantes na periferia de Brasília. Foi o “coronatour”, onde o presidente cumprimentou cidadãos de Taguatinga, Ceilândia e Sobradinho, não manteve o distanciamento social recomendado pelas autoridades e reforçou nas conversas sua tese de que é importante fortalecer a economia.

A decisão sobre a mudança no formato da divulgação foi tomada depois que Mandetta sinalizou que seguiria as orientações “da ciência” ao invés das decisões políticas e negacionistas do presidente. E isso foi reforçado na coletiva desta segunda, quando o ministro disse: “Por enquanto mantenham a recomendação dos Estados”. A queda de braço ocorre porque o presidente quer que os Estados e Municípios suspendam as determinações de generalizadas de isolamento e distanciamento social, enquanto que Mandetta sugere que seja mantido. “A atuação continua sendo técnica e científica”, afirmou o ministro.

Bolsonaro cogitou demitir o ministro no fim de semana, não o fez porque foi aconselhado de que isso poderia interferir na avaliação de seu Governo em meio a uma crise sanitária e econômica. O general Walter Braga Neto, chefe da Casa Civil, tentou amenizar o problema: “Não existe essa ideia de demissão do ministro Mandetta. Isso está fora de cogitação, no momento”. Disse ainda que a decisão de dividir a entrevista coletiva não era política, mas para fortalecer a transparência. Mandetta ironizou na sequência: “Em política, quando a gente fala não existe, a pessoa fala existe.”

Corrida contra o relógio

Seja como for, o Governo tenta faturar politicamente sobre o fato de a renda básica emergencial poder chegar a até a 1.200 reais por família. A proposta inicial elaborada pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) previa o pagamento de 200 reais mensais por três meses ou enquanto durasse a epidemia no Brasil. Na Câmara, os deputados alteraram o projeto para 500 reais e o Governo ofereceu mais 100 reais. No fim, cada um disse que era o “pai da criança”. A oposição dizia que o Governo só aumentou o valor por causa da pressão. Enquanto que governistas colocavam a mudança na conta do presidente.

“Me pareceu uma conta final de padaria, só para disputar protagonismo. Para mim, não faz a menor diferença de quem vai sair na foto. Importa que a comida chegue na comida do brasileiro”, afirmou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que relatou a proposta no Senado. Ele estima que cerca de 117 milhões de pessoas podem se beneficiar da medida.

O desafio do Governo, agora, será o de efetivar esse pagamento, num cenário em que já há demissões e que a buscas na Internet por seguro desemprego bateram recorde nos últimos sete dias, de acordo com a consultoria Bites. É uma espécie de corrida contra o tempo, para amenizar os efeitos da crise que já começa a chegar principalmente para os trabalhadores autônomos que vivem em áreas impactadas pelas medidas de isolamento social e quarentena determinadas por governadores e prefeitos.

O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, não quis definir um prazo para o início do pagamento do benefício. “No mais breve espaço de tempo poderemos atender todas as categorias”, disse na coletiva do Palácio do Planalto. Segundo ele, após a sanção presidencial, ainda serão necessárias a publicação de um decreto regulamentando a lei e a edição de uma medida provisória estabelecendo crédito extraordinário para a medida. A estimativa é que cerca de 14,4 bilhões de reais sejam destinados para esses pagamentos.

“O Governo teve tempo para se preparar. Agora, vamos cobrar para que faça logo a sua parte”, afirmou a deputada Tabata Amaral (PDT-SP). A crise do coronavírus iniciou no final do ano passado, na China. Em janeiro já havia a perspectiva de que a doença se espalharia por todo o mundo e, há pouco mais de um mês, o Brasil registrou o seu primeiro caso enquanto outras partes do planeta sentiam o impacto da doença para a saúde e para as finanças. Apenas no dia 18 de março, o Governo anunciou a medida provisória para beneficiar a população mais pobre.

Os beneficiados e projeto sobre merenda escolar

De acordo com o projeto aprovado nesta segunda, cada adulto de baixa renda (renda familiar de até três salários mínimos) poderá receber 600 reais por até três meses ou enquanto durar a crise da Covid-19. Famílias com dois trabalhadores ou com mães solteiras receberão 1.200 reais. O benefício está direcionado para trabalhadores informais, autônomos, desempregados e microempreendedores individuais (MEIs). Receberão o auxílio aqueles que tiverem renda mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda mensal familiar de até três salários mínimos. A ajuda se estende para aqueles já recebem Bolsa Família, que terão o benefício suspenso temporariamente.

Em comparação com a proposta que foi aprovada na quinta-feira passada pelos deputados federais, o Senado fez algumas alterações importantes, ao incluir trabalhadores intermitentes, garantir a substituição automática do Bolsa Família pela renda básica emergencial e assegurar que desempregados (incluindo os que estão neste momento perdendo seus empregos) recebam o novo auxílio. Ficam de fora aqueles que já contam com seguro desemprego.

Além disso, o Senado aprovou projeto que autoriza a distribuição dos alimentos da merenda escolar aos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes sem aulas por causa da pandemia. A medida é considerada um atenuante para a população em situação de extrema pobreza, ameaçada pela fome sem a alimentação escolar.

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