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Mandetta prega consenso nacional para lidar com avanço do coronavírus e reforça pedido de isolamento

Ministro da Saúde assume tom conciliador e pede a brasileiros para se prepararem para muitas perdas de vida. “Deixem que nos planejemos para um estresse grande que vem lá na frente”

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, atualiza dados em coletiva de imprensa sobre à infecção pelo novo coronavírus no Brasil.
O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, atualiza dados sobre o coronavírus em coletiva de imprensa neste sábado, 28 de março.Marcello Casal Jr / Agência Brasil

Foi uma semana de estresse, com o presidente Jair Bolsonaro e governadores se engalfinhando publicamente enquanto o coronavírus se espalha no Brasil. Nesse tiroteio político, o ministro da Saúde, Henrique Mandetta, decidiu assumir um tom de conciliação na coletiva de imprensa deste sábado, quando a pasta anunciou 3.904 casos confirmados de Covid-19 no Brasil e 114 mortes. “O Brasil é uma nave só”, disse Mandetta, falando no “consenso” que está sendo construído com secretários municipais e estaduais, incluindo o desenho adequado do que é quarentena, e como ela iria funcionar. “Ninguém tem esse parâmetro”, explicou ele. “A verdade é que vamos descobrir como vai ser nossa sociedade, nossas fraquezas e fortalezas. A saúde não é uma ilha. A economia é, sim, muito importante na saúde”, disse ele, vislumbrando a intersecção necessária para se chegar a um ponto de equilíbrio no debate do coronavírus.

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O país chegou a um pico de tensão nos últimos dias enquanto o presidente pregava quarentena vertical que isolasse os mais velhos e reabrisse escolas, igrejas, lotéricas e comércio em geral. “Não existe quarentena vertical ou horizontal. O que existe é a necessidade de arbitrar em determinados tempos", afirma Mandetta, lembrando que é preciso “coordenar a ação nacional”.

O ministro explicou didaticamente a necessidade de coordenar a logística para a aquisição de equipamentos de proteção individual para os profissionais de saúde que trabalham na linha de frente nos hospitais, e que podem ser contaminados pelo coronavírus, provocando baixas num momento extremamente delicado. São compras disputadas, de empresas nacionais e internacionais, num momento em que o mundo todo vive a pandemia. “Deixem que nos preparemos para um estresse muito grande que vem lá na frente”, disse ele, lembrando que virão “muitas perdas” de vida, e o sistema de saúde precisa estar preparado para atenuar isso. “Vamos trabalhar para poupar vidas, sabendo que haverá dias duros”, afirmou Mandetta.

Economia

Diante da pressão do presidente e de alguns empresários para retomar a atividade econômica, Mandetta colocou a bola no meio do campo. “O presidente está certíssimo ao dizer que a crise econômica vai matar as pessoas. Temos que buscar uma fórmula com o Ministério da Economia”, afirmou Mandetta, em aceno ao presidente Bolsonaro. Mas assumiu a direção desejada pela grande maioria dos governadores, de olhar as duas dimensões da pandemia ao mesmo tempo. “A economia é muito importante para a saúde. O que colocamos em dúvida são os critérios dessas quarentenas [adotadas pelos governos]”, afirma Mandetta. “Vamos colocar alguns critérios, porque são necessários. Não serão os critérios do ministro Mandetta, estamos trabalhando com os secretários para estabelecer um consenso”, explicou. O ministro reforçou que era necessário garantir alimentos para abastecer mercados que atendam às famílias brasileiras. “Geladeira não pode ficar vazia”, explica.

A leitura de especialistas é a de que, num quadro de emergência, é preciso reacomodar uma cadeia produtiva para atender as demandas urgentes. No caso atual, a saúde e a alimentação básica, que norteariam a abertura do isolamento social caso a caso, ou seja, garantindo o livre trânsito para tudo que seja relativo a insumos de saúde e alimentos. A guerra política dos últimos dias, porém, atrasou alguns acordos, o que Mandetta colocou na conta do aprendizado diante da gravidade da pandemia. Seu norte, contudo, ficou claro na entrevista. "Estamos falando de vida. Vamos nos pautar pela ciência. Precisamos de planejamento, calma, frieza”, avisou ele, se descolando de Bolsonaro, que tinha a intenção de fazer uma campanha pela retomada de atividade econômica no país, mas foi impedido pela Justiça.

Os apoiares do presidente incentivaram carreatas em diversos pontos do país com o slogan “O Brasil não pode parar”, seguindo o apelo de Bolsonaro. O ministro minimizou o assunto. “Os mesmos que fazem carreata vão ficar em casa daqui a duas semanas”, disse Mandetta, que prevê a possibilidade de que o país tenha de parar totalmente. “O lockdown, que é a parada absoluta, pode vir a ser necessária em alguma cidade. O que não existe é um lockdown em todo o território nacional e desarticulado”, explica.

Sobre o medicamento cloroquina, que o presidente Bolsonaro vem divulgando como possível cura do coronavírus, Mandetta afirmou que “não é uma panaceia” e que ainda está sendo estudado para casos graves. “Não é hora de sobrecarregar o sistema de saúde. Vamos aguardar”, acrescentou em seguida. O ministro precisou reiterar sua continuidade no cargo, depois de rumores que entregaria sua demissão neste sábado. Guardou parte da entrevista para pedir pediu calma aos brasileiros e que desliguem a televisão às vezes, porque as notícias podem ser “tóxicas”, segundo suas palavras. Ele lembrou que a pandemia vai mudar tudo, e que depois que terminar, o mundo estará diferente. “Vai sair um mundo reflexivo, que vai ter que repensar seus valores”, concluiu.

Imprensa "sórdida”

Em determinado ponto da entrevista, Mandetta também atacou a imprensa e falou que “às vezes, os meios de comunicação são sórdidos". As palavras, que parecem representar uma tentativa de agradar o presidente Bolsonaro, causaram indignação entre alguns jornalistas e resultou em um duro editorial do Jornal Nacional na noite deste sábado. “Desliguem um pouco a televisão. Às vezes ela é tóxica demais", recomendou ele aos brasileiros. "Há quantidade de informações e, às vezes, os meios de comunicação são sórdidos porque ele só vendem se a matéria for ruim. Publicam o óbito, nunca vai ter que as pessoas estão sorrindo na rua. Senão, ninguém compra o jornal”, acrescentou.

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