Empresária aproveitava a aposentadoria para conhecer o mundo
"Tinha curiosidade por tudo, por isso quis conhecer a vida na favela", diz amigo de María Esperanza
"Uma, grande e livre". Era com esse lema da ditadura franquista, desprovido de qualquer conotação política, contudo, que a população da cidade natal de María Esperanza Jiménez Ruiz se referia a ela. O epíteto, usado em tom de brincadeira em Puerto de Santa María, na região da Andaluzia, ao sul do país, caia bem para a espanhola morta com um tiro no Rio de Janeiro que não passava despercebida. “Era alta e elegante. Vivia à sua maneira, livre e à frente de seu tempo, por isso ganhou esse apelido carinhoso”, resume um de seus amigos, Miguel Álvarez. Com 67 anos e uma bem-sucedida carreira empresarial, a morte encontrou a espanhola fazendo o que planejava fazer pelo resto de sua vida de aposentada: viajar.
O disparo de um policial ceifou a vida de Jiménez quando viajava a bordo de um Fiat Freemont para conhecer a Rocinha, a maior favela do Rio de Janeiro. “Tinha curiosidade por tudo e gostava de ir fundo, por isso quis conhecer a vida na favela”, acrescenta Álvarez, presidente da Associação de Comerciantes do centro histórico de El Puerto. Ali, na área central dessa cidade turística de 90.000 habitantes, María Esperanza se tornou famosa graças a seu trabalho na imobiliária Jiménez Ruiz, a empresa familiar a que dedicou sua vida profissional.
No pequeno escritório da empresa na rua Luna, as chamadas foram incessantes desde que as primeiras informações indicavam, na tarde da segunda-feira, que algo teria acontecido com uma cidadã de El Puerto no Rio. A polícia local e a Prefeitura telefonaram para checar se María Esperanza estava na capital carioca. Pouco depois veio a confirmação, que deixou “chocado” o prefeito da cidade, David de la Encina: Jiménez havia falecido vítima de um tiro no pescoço. No mesmo carro estavam o irmão José Luis – dono da imobiliária em que Esperanza trabalhou – e a cunhada.
De la Encina decretou um dia de luto nesta terça-feira e as bandeiras dos edifícios municipais foram colocadas a meio mastro. As mensagens de condolências se sucedem, do Governo regional da Andaluzia ao próprio Governo da Espanha. Não é de estranhar para uma mulher tão apreciada por sua profissão, que havia vendido uma casa até para o prefeito. “Era uma mulher extrovertida e profissional, uma excelente comerciante e uma embaixatriz excepcional de sua cidade”, reconhece De la Encina.
María Esperanza era a única mulher de quatro irmãos. Vinha de uma família ligada ao negócio do vinho na cidade de Jerez de la Frontera, onde são produzidos os vinhos xerez. O pai de Esperanza tinha uma papelaria em El Puerto, um negócio que seu irmão José Luis fechou em 1996 para abrir a imobiliária, no térreo do mesmo edifício onde a família morava.
Como braço direito de seu irmão, María Esperanza logo soube fazer nome no setor imobiliário. Eram anos em que El Puerto decolou como destino de férias na Espanha e isso deu grande impulso ao negócio “Ela e sua família foram artífices do boom que a cidade viveu naqueles anos”, diz De la Encina.
María Esperanza não passava despercebida na esfera pessoal. “Era uma mulher espetacular”, observa Álvarez. E o prefeito acrescenta: “No exercício de sua profissão foi fazendo muitos amigos, graças ao seu jeito de ser”. Foi casada com um psiquiatra, de quem enviuvou logo, e era mãe de duas filhas, agora residentes uma na Alemanha e outra na ilha de Maiorca.
Com as filhas já criadas e chegada a idade da aposentadoria, María Esperanza se dedicou de corpo e alma a sua maior paixão: viajar. Alternava períodos na casa que possuía em Vistahermosa, um bairro exclusivo de El Puerto, com visitas a diversos destinos dentro e fora do país. “Sua vida era viajar. Com o tempo livre que tinha, passava longos períodos conhecendo lugares diferentes”, lembra Miguel Álvarez. De fato, a morte a surpreendeu com a agenda já repleta, como detalha o amigo familiar: “Fazia planos de conhecer os Estados Unidos e a China”.
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