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O Brexit não é questão de pernas

Tabloide britânico causa indignação com capa sobre as pernas de May e Sturgeon

Capa desta terça-feira do 'Daily Mail'.
Capa desta terça-feira do 'Daily Mail'.

A fotografia bem valia uma capa. Duas mulheres líderes reunidas para decidir o futuro de suas nações: Theresa May, primeira-ministra britânica, e Nicola Sturgeon, a ministra-chefe da Escócia, que quer um referendo de independência para desvincular-se da saída do Reino Unido da União Europeia, o Brexit. Mas o jornal sensacionalista britânico Daily Mail destacou em sua capa desta terça-feira um suposto duelo de pernas. Com um jogo de palavras, afirmou em sua manchete que o Brexit não importa, mas, sim, o “legs (pernas)-it). Uma capa que causou indignação entre políticos e em outras mídias do país.

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“É 2017. As decisões de duas mulheres vão determinar se o Reino Unido continua existindo. E a notícia de capa é sobre as suas extremidades inferiores. Obviamente”, ironizou a parlamentar trabalhista Yvette Cooper em sua conta do Twitter.

A manchete da capa não foi tudo. O artigo no interior do jornal tem como título: “Suas melhores armas? Essas pernas!”. Nele, a colunista Sarah Vine opina que Sturgeon é mais charmosa com as pernas cruzadas, ”em uma clara tentativa de seduzir”.

O líder do oposicionista Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, criticou que uma capa como essa possa ser publicada em pleno 2017. “O sexismo tem de ficar relegado à história. Que vergonha, Daily Mail”, escreveu.

Para María Ángeles Cabré, diretora do Observatório Cultural de Gênero na Espanha, esse episódio é uma amostra a mais de que não se rompeu o teto de vidro para as mulheres, esse limite invisível que explica porque ainda é uma raridade que haja uma mulher no poder. “Há setores que ainda esperam que as mulheres que estão em cargos de responsabilidade sirvam como decoração. E claramente não é assim”, lamenta, por telefone.

Cabré lembra que na Espanha julgaram o físico de deputadas da CUP (Candidatura de Unidade Popular, um partido da esquerda e independentista da Espanha) ou de Inés Arrimadas, do Cidadãos. Que isso Aconteça no Reino Unido, acrescenta, onde há uma longa tradição de mulheres em cargos de poder, como a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher e a própria rainha Elizabeth II, só demonstra que o sexismo ainda é generalizado. “O termômetro nos diz que estamos mais atrasados do que pensávamos”, lastima.

A capa do Daily Mail foi qualificada de “imbecil”, “ofensiva” e “sexista” por outros políticos britânicos. Foi criticada pelo jornal britânico The Guardian e a rede norte-americana CNN, que tentou entrar em contato com os editores do tabloide, sem obter resposta.

A publicação também foi motivo de chacota de usuários das redes sociais, que modificaram a imagem, por exemplo, para pôr fotografias das pernas de políticos homens, como Corbyn e o ex-primeiro-ministro David Cameron. O ex-editor do Guardian Alan Rusbridger publicou uma histórica foto dos líderes da Segunda Guerra Mundial Josef Stalin, Franklin D. Roosevelt e Winston Churchill na conferência de Yalta, em 1945, com o comentário “lindas pernas”.

Depois da onda de críticas, o jornal tentou moderar sua capa nas edições impressas mais tarde. Segundo The Guardian, acrescentou uma observação para indicar que o artigo interno é o “veredito” de sua colunista de amenidades Sarah Vine sobre a reunião entre May e Sturgeon.

Este escândalo lembra o ocorrido em 2008 na imprensa sensacionalista alemã, quando a chanceler Angela Merkel escolheu um vestido decotado para ir à ópera de Oslo. Os tabloides usaram manchetes como “Merkel mostra o peito” ou “Merkel exibe um decote” ao lado das fotografias de seu vestido de noite. Um alvoroço sobre o qual a chanceler apenas disse estar “um pouquinho surpresa”.

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