Grécia legaliza as uniões gays apesar da firme oposição da Igreja
A nova lei, aprovada graças aos votos de parte da oposição, não permite aos casais adotar nem lhes garante a custódia dos filhos do outro
‘Beijaços’ gays em frente a igrejas contra um colérico repique de sinos: esta foi a imagem da polêmica desta terça-feira, dia 22, na Grécia. A tramitação parlamentar do projeto de lei que homologa as uniões gays — não o casamento — movimentou seus defensores (a comunidade LGBT, que a considera “tardia e insuficiente”) e seus detratores (liderados pela Igreja, que fez repicar os sinos em protesto, mas também o aliado de Alexis Tsipras no Governo).
A nova lei tira a Grécia da retaguarda da União Europeia (na qual figuram Itália, Polônia e Romênia) e acrescenta um item à curta lista até o momento de promessas eleitorais levadas a cabo pelo Governo do Syriza. Com os Gregos Independentes (ANEL), aliado do Executivo, contrários, a lei foi aprovada graças ao apoio dos partidos Pasok e To Potami, à residual União de Centristas, e um ou outro outsider conservador, como Kyriakos Mitsotakis, um dos que aspiram à liderança da Nova Democracia (principal partido de oposição).
Em um país dominado há séculos pela Igreja ortodoxa — a cremação continua sendo proibida e os parentes devem trasladar o cadáver a algum país vizinho para ser incinerado —, o clamor social pela equiparação destas uniões mal conseguiu contar a estrondosa oposição da hierarquia eclesiástica, que qualificou a iniciativa de “atentado às leis humanas e da cristandade” ou “aberração contra a natureza” (alguns chamando os gays, inclusive, de “monstros da natureza”).
Mas a verdade é que a nova lei, aprovada com os votos contrários de comunistas e neonazistas, se limita a legalizar o registro de casais do mesmo gênero; não permite a adoção, a incorporação da nacionalidade do cônjuge ou a custódia dos filhos do outro. A marginalização dos homossexuais na hora de receber a pensão do cônjuge falecido, ou de herdar seus bens, provocou, em 2013, uma resolução do Tribunal Europeu de Direitos Humanos contra a Grécia. As agressões homofóbicas aumentaram também nos últimos anos.
Para os ativistas LGBT, a medida, ainda insuficiente, representa um passo gigante para dar visibilidade social a um coletivo escondido e forçosamente discreto até agora. “O mais importante é que o Estado nos reconheça, isso é um passo fundamental para que a sociedade comece a mudar e nos aceite”, afirma por e-mail o membro de um grupo de apoio gay de uma pequena cidade do norte do país que pede para não ser identificado.
Ainda que a legalização das uniões gays figurasse no programa eleitoral do Syriza — e sua aprovação não representa qualquer custo ou impacto fiscal, como solicitam os credores em troca do terceiro resgate —, recebeu um inesperado impulso no início deste mês com a morte de um ator popular, Minas Hatzisavas, depois de uma longa doença. Seu companheiro enviou uma mensagem comovente a Tsipras, o que deu início ao debate: “Esta é uma carta ao primeiro-ministro... Estive com ele [Hatzisavas] por 25 anos, mas ninguém aceitava que um dia eu pudesse reclamar seu corpo no hospital. Foi um processo burocrático infame”, queixou-se o companheiro do ator. A revelação da condição sexual do casal foi tema de manchetes e alvo de provocações e insultos durante dias.
Tsipras teve de voltar atrás recentemente em sua tentativa de aplicar um programa paralelo, ou social, para contra-atacar o impacto de novos cortes e ajustes entre os segmentos mais vulneráveis da população; a rejeição dos credores neutralizou seu propósito. Em troca, voltou-se às leis ‘gratuitas’ — ou simbólicas, como desqualificam seus detratores —, como por exemplo a que concede nacionalidade à segunda geração de imigrantes e que também foi levada adiante graças a Pasok e To Potami, com a oposição da ANEL.
No entanto, a lei de uniões homossexuais põe especialmente em evidência o feroz desentendimento — apesar das boas maneiras em público, e das contadas liturgias a que Tsipras compareceu — entre Governo e hierarquia eclesiástica. A tensão entre as duas instâncias esteve a ponto de vir à tona em setembro devido à presença de símbolos religiosos nas escolas, e em pleno início do ano letivo (o programa eleitoral do Syriza contempla a separação efetiva entre Igreja e Estado e a abolição dos privilégios fiscais desta). Tsipras foi o primeiro chefe de Estado do país a jurar seu cargo sobre a Constituição, assim como muitos membros de seu Gabinete, em uma cerimônia até então unicamente religiosa.
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