Eleições abrem um cenário político inédito na Espanha
Quatro partidos chegam às eleições em condições de provocar uma reviravolta política

A Espanha entra a partir de domingo, dia 20 de dezembro, em uma nova etapa política. Nada será igual porque, segundo todas as previsões, haverá um Parlamento muito mais fragmentado, com o surgimento de dois novos partidos, o que tornará novos pactos necessários. Começa uma nova etapa para colocar em dia a democracia constitucional. De uma legislatura que se iniciou com maioria absoluta hegemônica do Partido Popular (PP) em todas as instituições a Espanha chega hoje às eleições gerais com presença plural em municípios e comunidades autônomas e a previsão de um futuro Governo que terá de ser consequência de acordos. O diálogo e o consenso abrem caminho.
Quatro partidos —PP, PSOE, Ciudadanos e Podemos— têm condições de provocar uma reviravolta política no país. O bipartidarismo, entendido como o poder amplamente majoritário de dois partidos no Congresso que, além disso, se alternam no Governo, abre espaço a um cenário com novos atores.
A campanha e os últimos meses de mandato do premiê Mariano Rajoy se caracterizaram por um novo marco de debate político no qual o eixo da discussão já não foi a esquerda e a direita, mas a briga entre o novo e o velho. O que se aprecia como um enorme salto geracional se concretiza na aparição de novos aspirantes à presidência do Governo, como Pablo Iglesias (Podemos) e Albert Rivera (Ciudadanos). Da mesma forma que há alguns meses apareceram outros líderes com lideranças dessa nova política e agora estão à frente dos Ayuntamientos (prefeituras) de Madri, Barcelona, Valência ou Cádiz, entre outros, essa opção de mudança e de fim de ciclo chega às Cortes e talvez ao Palácio de La Moncloa (sede da presidência do Governo espanhol).
Rajoy concorre pela quarta vez como cabeça da lista nas eleições gerais. Perdeu em 2004 e 2008 para José Luis Rodríguez Zapatero e ganhou em 2011 de Alfredo Pérez Rubalcaba. É o presidente do Governo (primeiro-ministro) que mais poder acumulou desde 1978, tanto no Executivo central como em poder regional, através de seu partido, o PP. Agora aspira ser o mais votado e poder governar, mas com uma queda notável de cadeiras, consequência da aparição de outros partidos e de seu próprio desgaste pela crise e a corrupção.
A agenda da reforma constitucional
Além da pressão dos eleitores com seu voto, a previsível matemática parlamentar fará os acordos necessários para propor mudanças constitucionais e provavelmente os dois grandes partidos já não terão maioria suficiente para bloqueá-las. Todos, exceto o PP, incluem reformas constitucionais em seu programa, as quais exigiram um referendo no final da legislatura.
Isso também torna diferente a fase que se inicia, porque coloca no centro do debate da legislatura a modificação da lei fundamental. O novo Parlamento e o futuro Governo terão de abordar o papel da Catalunha no Estado.
Junto com Rajoy, Iglesias e Rivera, o outro ator principal é Pedro Sánchez, que tenta diferenciar o PSOE da velha política, dar demonstração de renovação em seu partido e, ao mesmo tempo, fazer valer a experiência de gestão dos socialistas como a formação que mais anos governou a Espanha constitucional.
Nesse novo Parlamento, que deve ser constituído em 14 de janeiro, espera-se dos 350 deputados que eleitos no domingo uma agenda que inclui as propostas de reforma da Constituição, mudanças na lei eleitoral e, de modo geral, a renovação de instituições democráticas que, 37 anos depois do início da fase constitucional, demonstraram-se afastadas das novas gerações de espanhóis.
O número das próximas semanas é 176, que é o número de cadeiras necessárias para levar adiante o mandato com maioria absoluta no Congresso. O único meio de chegar a esse número será, com toda segurança, a soma dos votos de dois ou mais partidos, porque o que ganhar pode fazê-lo abaixo dos 30% dos votos, a menor porcentagem com a qual já se venceu as eleições.
Agora o PP aparece como favorito em todas as pesquisas, mas com dúvidas sobre como reuniria os votos necessários para o mandato. A maioria absoluta de que desfrutou até agora o levou a não ter praticamente relações com outros partidos e a falta de afinidades ideológicas com os demais indica o Ciudadanos como única hipótese de aliado parlamentar. No entanto, Rivera repetiu de todas as formas possíveis que não apoiará Rajoy, nem Sánchez. Só admitiu no último minuto a possibilidade de ceder o mandato com sua abstenção, mas para isso é necessário que o PP ultrapasse os 140 deputados.
Outras batalhas
Os outros três partidos lutam pelo segundo lugar, pela liderança da oposição. Sánchez tentou explorar a tese do voto útil como única opção para tirar Rajoy de La Moncloa e seu objetivo é ter o número suficiente de cadeiras para uma maioria alternativa à do PP, com várias opções políticas.
O PSOE permaneceu com 110 cadeiras em 2011, em seu pior resultado na democracia, mas que agora os socialistas assumem como objetivo, devido à fragmentação do voto. Para Sánchez a linha entre o fracasso e o sucesso está melhor em ser segundo, porque isso garante liderar a oposição e um número de cadeiras próximo a uma centena.
Podemos e Ciudadanos chegam ao Congresso com a expectativa de, no máximo do otimismo, chegar ao Governo e, no pior dos casos, a mais realista de ser a liderança da oposição. Ambos chegam com a bandeira da profunda reconstrução, em graus diferentes, do sistema democrático.
A Unidad Popular-Izquierda Unida, de Alberto Garzón, espera formar um grupo parlamentar e a UPyD, de Andrés Herzog, resiste a ficar fora do Parlamento.