Os EUA temem que a ferrugem do café na América Central desestabilize a região
A ferrugem provoca enormes perdas nas regiões produtoras Os EUA investem 11 milhões de reais em pesquisa para conter o seu avanço A crise pode aumentar a insegurança e a imigração em direção ao norte
O pior surto de ferrugem em quase 40 anos tem causado enormes prejuízos na América Central, cuja economia depende em grande parte das exportações de café, a principal lavoura afetada pela praga. Os efeitos da crise na produção sofridos pela região chamaram a atenção dos Estados Unidos, que temem que as perdas de emprego possa comprometer a estabilidade da região, com um aumento da insegurança e a elevação da imigração. O Governo norte-americano anunciou na segunda-feira que doará cinco milhões de dólares (11 milhões de reais) para a pesquisa agrícola na Universidade do Texas para tentar deter o avanço da praga.
A ferrugem se espalhou por milhares de hectares na América Central, onde vestiu de laranja e amarelo as plantações até então saudáveis e ameaçou toda a cadeia envolvida na produção e venda do café. De acordo com dados do Departamento de Estado dos Estados Unidos, a América Central, o sul do México e o Caribe “estão enfrentando o pior surto de ferrugem desde que a praga apareceu pela primeira vez em 1976”.
Desde 2012, a praga da ferrugem atacou mais da metade dos 933.000 hectares de café na América Central. O fungo amarelo provocou enormes prejuízos em uma região onde mais de 50% dos seus 43,7 milhões de habitantes vivem na pobreza (oito milhões sofrem com a desnutrição) e na qual o café é um produto histórico e emblemático do comércio exterior. As safras de café, que ocorrem todos os anos de outubro a setembro, são estratégicas para as finanças regionais.
O Governo dos EUA doará 11 milhões de reais para a pesquisa contra a praga
A Organização Internacional do Café informou que a praga se espalhou em pelo menos 30% das plantações, com o potencial de eliminar 374.000 empregos diretos. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos informou que entre 2012 e 2013, a produção total na região caiu 7%, para 17,9 milhões de sacas. Para esta temporada, a agência projetou uma queda de 8%, para 16,5 milhões de sacas.
O porta-voz da Specialty Coffee Association of America, Ric Rhinehart, explicou que o fungo causador da infecção estava restrito às baixas altitudes desde o seu aparecimento, “mas devido a uma combinação de temperaturas mais elevadas e padrões de chuva, a doença avançou para lugares mais altos, e os agricultores não estavam preparados para isso”.
De acordo com Mark Feierstein, administrador associado da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID), até agora foram investidos 14 milhões de dólares (31 milhões de reais) na luta contra esta praga na América Latina, incluindo o recém-anunciado montante de cinco milhões de dólares (11 milhões de reais). “Queremos trabalhar em projetos como plantações resistentes e na possibilidade de evitar surtos. Sabemos que vai levar algum tempo para lidar com isso”, afirmou.
O especialista explicou que se o problema persistir haverá um enorme impacto no emprego e isso “repercutirá nos padrões de migração das áreas rurais para as áreas urbanas e em direção aos Estados Unidos”. A USAID estima que se não houver um progresso, nos próximos anos a produção de café cairá entre 15% e 40%, o que poderia custar mais de 500.000 postos de trabalho nas áreas afetadas. “Outro efeito é a vulnerabilidade dessas pessoas diante das quadrilhas de crime organizado presentes na região”, que são um alvo mais fácil devido à falta de trabalho, disse ele.
A WCR vai se concentrar em procurar variedades de café resistentes ao fungo que causa a infecção, gerar alternativas à falta de sementes mais fortes e ampliar a capacidade das indústrias na região para monitorar a praga da ferrugem.
“No curto prazo, parte da solução é aumentar o acesso dos pequenos agricultores aos fungicidas, e logo devem encontrar técnicas de manejo mais eficazes e dados que permitam o desenvolvimento de plantas mais resistentes”, disse Rhinehart, que também é membro do conselho de diretores da WCR.
O impacto da ferrugem, por países
O Conselho Salvadorenho de Café informou, em uma contagem estatística que reflete o impacto da ferrugem, que o valor das exportações de café caiu de 312,7 milhões de dólares (691,4 milhões de reais) na safra 2011/2012, para 251,7 milhões de dólares (556,5 milhões de reais) em 2012/2013: uma queda de 20%. De acordo com dados de 31 de março deste ano, as vendas externas do chamado “grão de ouro” somavam 48,4 milhões de dólares (107 milhões de reais) na safra 2013/2014.
O Instituto Hondurenho de Café disse, entretanto, que a área produtiva passou de 402.000 quadras na temporada 2011/2012, para 380.000 na safra 2012/2013. “Isso significa uma diminuição de cerca de 22.000 quadras em termos absolutos devido à ferrugem”. As receitas de exportação de café diminuíram de 1,44 bilhão de dólares (3,18 bilhões de reais), para 794 milhões de dólares (1,75 bilhão de reais) entre 2012 e 2014: quase 50%. A praga também causou prejuízo de 100.000 empregos.
A Guatemala sofreu uma perda semelhante. A Associação Nacional do Café informou que as exportações guatemaltecas de café diminuíram de um recorde histórico de 1,3 bilhão de dólares (2,87 milhões de reais) na safra 2010/2011, para 752,6 milhões de dólares (1,66 bilhão de reais) na temporada 2012/2013: mais de 40%.
A Nicarágua, onde o café é o principal produto de exportação e, antes da aparição da ferrugem, gerava pelo menos 350.000 empregos diretos e cerca de 200.000 indiretos, registrou uma queda acentuada nas suas receitas cafeeiras. As exportações do produto caíram de 521,8 milhões de dólares (1,15 bilhão de reais) na safra 2011/2012, para 349,5 milhões de dólares (772,8 milhões de reais) no período 2012/2013, segundo o Banco Central da Nicarágua, uma queda de 35%.
O Instituto do Café da Costa Rica (iCafe), por sua vez, revelou que o impacto da ferrugem foi medido em quatro categorias: severo, moderado, lento e sem danos – e que em 2013, comparado com 2012, houve uma queda de 55%. Além dos danos da ferrugem, também houve um impacto dos baixos preços internacionais, lembrou Ronald Peters, presidente do ICafe, ao dizer que a praga penetrou “violentamente e no país inteiro”.
“Nós não estávamos acostumados, nem preparados [para enfrentar o ataque], embora em 2013 conseguimos que o ataque fosse moderado e foi possível conviver com a ferrugem, e agora estamos preparados. O produtor sabe que existem mecanismos para combatê-la, sabe como fazer e parece que o clima de 2014 será semelhante ao de 2012, e precisamos estar alertas”, disse Peters ao EL PAÍS.
O Banco Central da Costa Rica afirmou que as vendas externas de café costarriquenho caíram de 412,5 milhões de dólares (912,1 milhões de reais) em 2011/2012, para 302 milhões de dólares (667,8 milhões de reais) em 2012/2013, período em que a ferrugem apareceu, uma queda de 27%.
O Panamá reduziu a produção de 369.154 sacas no período 2010/2011, para 221.541 sacas em 2011/2012, mas grande parte é para o seu consumo interno.
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