Príncipe saudita autorizou o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, aponta inteligência dos EUA

Mohamed Bin Salman considerava colunista do ‘The Washington Post’ uma ameaça para Riad, de acordo com relatório divulgado nesta sexta-feira

Jamal Khashoggi asesinato
Amigo de Jamal Khashoggi segura cartaz em ato na frente do Consulado de Istambul da Arábia Saudita pelos dois anos de seu assassinato, em outubro de 2020.OZAN KOSE (AFP)
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A Casa Branca divulgou o relatório da inteligência dos EUA sobre o assassinato de Jamal Khashoggi, em 2018, um jornalista crítico do regime saudita, no consulado da Arábia Saudita em Istambul. O texto conclui, como já havia sido antecipado, que o herdeiro do trono e líder saudita de fato, Mohamed Bin Salman, é o responsável pelo crime. O Departamento de Estado informou aos congressistas, segundo a Reuters, que anunciará na tarde desta sexta-feira as ações em resposta à execução do jornalista, que era colunista do The Washington Post e morador do Estado da Virgínia.

“Concluímos que o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohamed Bin Salman, aprovou uma operação em Istambul, na Turquia, para capturar ou matar o jornalista saudita Jamal Khashoggi”, resume o relatório logo no início.

Bin Salman considerava o jornalista uma ameaça a Riad, segundo o documento divulgado nesta sexta-feira. O relatório desclassificado, de três páginas e datado de 11 de fevereiro de 2021, confirma as conclusões a que a CIA chegou nas investigações que realizou nas semanas após o assassinato de 2 de outubro: que a operação em que um esquadrão da morte viajou para Istambul, enganou Khashoggi para que fosse realizar um trâmite no consulado saudita e, dentro dele, esquartejou brutalmente o jornalista com utensílios forenses, foi aprovada pelo herdeiro do trono da Arábia Saudita.

As conclusões, diz o relatório, baseiam-se no controle que Bin Salman exerce sobre todas as “tomadas de decisão no reino”, o “envolvimento direto de um conselheiro-chave” e de membros de sua própria equipe de segurança na operação, bem como “seu apoio ao uso de medidas violentas para silenciar dissidentes, incluindo Khashoggi”. “Desde 2017, o príncipe herdeiro tem controle absoluto sobre as organizações de segurança e inteligência do reino”, acrescenta. “O príncipe herdeiro via Khashoggi como uma ameaça ao país e apoiava de modo geral o uso de medidas violentas, se necessário, para silenciá-lo.”

O relatório acrescenta pouco em relação às conclusões das agências de inteligência norte-americanas que já eram conhecidas. Mas sua publicação oficial, as conclusões inequívocas e a brutalidade dos acontecimentos descritos têm o potencial de abalar as relações entre os Estados Unidos e a Arábia Saudita, seu tradicional aliado.

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O Governo Joe Biden já havia anunciado que cumpriria a exigência legal e tornaria público o relatório desclassificado de suas agências de inteligência, medida à qual o ex-presidente Donald Trump resistiu. A publicação abre simbolicamente uma anunciada nova etapa nas relações entre Washington e Riad, e representa uma clara ruptura com a tibieza exibida pela administração Trump em relação ao brutal assassinato de um jornalista residente nos Estados Unidos.

O presidente Biden conversou por telefone na quinta-feira com o rei Salman Bin Abdulaziz, de 85 anos, e não com Bin Salman. A troca de interlocutor mandou uma mensagem de mudança: enquanto a Administração Trump tratava com o príncipe herdeiro, Biden optou por considerar que o rei continua a ser o líder do país e que o canal oficial de comunicação de seu filho, como ministro da Defesa, deve ser o chefe do Pentágono. Na nota publicada pela Casa Branca sobre o telefonema entre Biden e o rei Salman, o nome de Khashoggi não é mencionado, mas há a indicação de que o presidente “afirmou a importância que os Estados Unidos atribuem aos direitos humanos universais e ao império da lei“.

A Casa Branca explicou que a nova Administração está se preparando para “recalibrar” sua relação com o aliado árabe, que no passado teve tolerados comportamentos pouco respeitosos com os direitos humanos. Biden expressou publicamente seu compromisso com a Arábia Saudita e suas necessidades defensivas na região, mas no início deste mês já anunciara que os Estados Unidos deixariam de apoiar a ofensiva militar saudita na guerra no Iêmen, um conflito que ele descreveu como “catástrofe humanitária e estratégica”.

Biden se mostrou duro com Riad durante a campanha eleitoral, criticou a família real e disse que os sauditas seriam tratados “como os párias que são”. Agora, na Casa Branca desde 20 de janeiro, ele tem sobre a mesa as próprias promessas eleitorais sobre a limitação da venda de armas ao país e a exigência de prestação de contas pelo assassinato do jornalista. “Há uma série de ações sobre a mesa”, explicou a porta-voz da Casa Branca Jen Psaki, na quinta-feira, questionada sobre uma possível resposta dos Estados Unidos.

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