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Espanha foi o país europeu que mais destruiu empregos na primeira metade do ano

Muitas vagas temporárias, grande peso do turismo e medidas de confinamento explicam o pior comportamento do mercado de trabalho espanhol

Antonio Maqueda
Um homem passa em frente a um escritório de emprego em Madri.
Um homem passa em frente a um escritório de emprego em Madri.Rodrigo Jiménez (EFE)

Velhos hábitos são difíceis de erradicar. A Espanha volta a ser a economia europeia que mais emprego destruiu em uma crise. Com a pandemia, a supressão de postos de trabalho quase triplica a dos demais países europeus durante a primeira metade do ano. Estes dados não incluem os trabalhadores que recorreram a esquemas de proteção temporária de emprego, como o ERTE (mecanismo que garante parte do salário a trabalhadores afastados), adotados em toda a União Europeia. Será preciso esperar que esses mecanismos sejam suspensos para que se obtenha uma perspectiva mais completa do impacto do vírus. Entretanto, na Espanha as informações iniciais são desoladoras.

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Pedestrians, wearing face masks protection to prevent the spread of the coronavirus, sit on a public bench in Madrid, Spain, Monday, Aug. 31, 2020. Spain, with nearly 440,000 infections of the new virus since February, has become western Europe's hardest hit country by a new surging wave of fresh outbreaks. (AP Photo/Bernat Armangue)
O coronavírus golpeia a Espanha pela segunda vez: o que dizem os dados?

A economia espanhola perdeu 7,5% dos empregos entre abril e junho, segundo dados homogeneizados do Eurostat (órgão continental de dados estatísticos). E a esta perda é preciso acrescentar outro 1% do primeiro trimestre. Ou seja, destruiu-se em torno de 8% na primeira metade do ano. Se forem consideradas as cifras do Instituto Nacional de Estatística espanhol, entre janeiro e junho desapareceram na Espanha 1,35 milhão de vagas. A Alemanha, para efeito de comparação, só suprimiu 1,4% no segundo trimestre e nada no primeiro, segundo o Eurostat. A França perdeu 2,6% no segundo e 0,2% no primeiro. E o Reino Unido só abriu mão de 0,7% dos postos de trabalho, apesar de sofrer uma contração do PIB similar à espanhola. A explicação para este menor impacto é que um em cada três trabalhadores britânicos está no equivalente ao ERTE, segundo dados de agosto (10 milhões de 30 milhões de ocupados). Ao não limitar os setores e não haver requisitos prévios, o uso do furlough – o nome deste mecanismo no Reino Unido – foi maciço. Além disso, incluem também os autônomos e concedem até 80% do salário, num máximo de 2.000 libras (14.643 reais).

Outros países monitorados pelo Eurostat sofreram perdas de emprego bastante menores que a Espanha. Holanda, 3,1%; Áustria, 4,1%; Polônia, 1,2%; Suécia, 1,3%. A agência estatística europeia ainda não recolhe os números da Itália, porque sua agência nacional não publicou as cifras do segundo trimestre. Mas o Eurostat faz uma estimativa da taxa de desemprego. E esta permaneceu muito estável, pelo que se deduz que eliminou uma percentagem muita baixa dos empregos, segundo Raymond Torres, diretor de conjuntura do think tank espanhol Funcas.

ERTE, Kurzarbeit, furlough, chômage partiel, cassa integrazione guadagni... Todos os Governos adotaram esquemas de proteção temporária do emprego. Desta vez não é como em 2008, quando havia um setor da construção inflado e cujo emprego tinha que ser ajustado por ser insustentável. A ideia desta vez se baseia em que a pandemia é um golpe temporário, e que é preciso superá-lo protegendo as rendas dos trabalhadores até a volta à normalidade. Por exemplo, o turismo voltaria uma vez passada a pandemia. Assim, em todas partes se copiou o Kurzarbeit, o esquema que permitiu à Alemanha enfrentar com sucesso a anterior crise financeira. Já na anterior crise o Governo socialista de José Luis Rodríguez Zapatero adotou o ERTE, que se generalizou sob os mandatos do Partido Popular (direita) após reforçar esta figura na reforma de 2012. E agora o Executivo de Pedro Sánchez criou o ERTE motivado pela covid e agilizou seus prazos.

Apesar do enorme alívio do ERTE, a Espanha figura novamente como um dos países que mais postos de trabalho destroem ao enfrentar uma recessão. Os ajustes não se produzem com um corte de horas, com redução de salários ou mudanças nas condições para suportar o desabamento da atividade. Os empregados temporários sofrem sempre o primeiro golpe da crise, ao serem demitidos ou não terem seus contratos renovados. As empresas espanholas têm um mecanismo muito rápido e efetivo para ajustar seus custos, que além disso não gera problemas com a parte principal de suas equipes, mas causa graves consequências sociais e sobre a produtividade.

Assim se observa na Pesquisa de População Ativa do segundo trimestre, em que dois terços dos empregos desaparecidos eram temporários. Enquanto a taxa de destruição foi de 2% entre os fixos, nos temporários disparou para 11%.

Dito isto, a temporalidade não foi o único fator decisivo. Também contribui que a Espanha fizesse o confinamento mais duro do mundo, conforme mostram os dados de mobilidade do Google. E isso provocou um desabamento muito maior da atividade, de 5,2% no primeiro trimestre e 18,5% no segundo, quedas só igualadas pelo Reino Unido, com 2% e 20,4%.

E outro fator importante foi a estrutura setorial da economia. Por exemplo, a Polônia também apresenta uma elevada proporção de temporários. Junto à Espanha, é um dos países com maiores índices de empregos temporários. E, entretanto, só eliminou 1,2%. Provavelmente isso se deva a que não teve que tomar medidas de contenção do vírus tão duras como a Espanha e, sobretudo, que sua economia não tem uma dependência tão elevada do turismo, da hotelaria e do lazer, as atividades mais prejudicadas pelo distanciamento social e onde, para piorar, abunda a contratação temporária.

Um problema muito grave para os jovens

A temporalidade é um problema presente na economia espanhola desde que, na década de oitenta, começou a ser usada para gerar empregos. E nenhum Governo aprovou uma reforma que a coíba. A ministra Fátima Báñez, do PP, apresentou uma proposta para isso, mas nunca chegou a fechá-la. E o atual Ministério de Economia confiava na chamada mochila austríaca, uma conta do trabalhador onde o empresário vai pagando mensalmente o custo da demissão e que o empregado pode levar consigo se quiser mudar de empresa ou se aposentar. Até que veio a pandemia e a ideia foi parar na gaveta. “A temporalidade e a curta duração dos empregos impedem que os jovens acumulem experiência”, e portanto sua capacidade de conseguir melhores trabalhos e salários, explicava o diretor de Economia do Banco da Espanha, Óscar Arce, na recente apresentação. Além disso, em plena recessão, a temporalidade impede que os jovens possam ter direito ao seguro-desemprego, deixando como único recurso a ajuda das famílias. “A temporalidade elevada dos jovens gera um forte comportamento cíclico de suas rendas trabalhistas”, apontou Arce.

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