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Prefeitos do Leste Europeu se unem contra Governos conservadores de seus países

Aliança liberal entre Budapeste, Varsóvia, Praga e Bratislava oferece uma alternativa cosmopolita e verde ao modelo ultranacionalista e xenófobo que domina essas nações

Da esquerda para a direita, os prefeitos Zdenek Hrib (Praga), Gergely Karacsony (Budapeste), Matus Vallo (Bratislava) e Rafal Trzaskowski (Varsóvia), nesta quinta-feira, na capital húngara.
Da esquerda para a direita, os prefeitos Zdenek Hrib (Praga), Gergely Karacsony (Budapeste), Matus Vallo (Bratislava) e Rafal Trzaskowski (Varsóvia), nesta quinta-feira, na capital húngara.Szilard Koszticsak (AP)

Os prefeitos de Budapeste, Varsóvia, Praga e Bratislava se aliaram para mostrar uma alternativa aberta, verde e cosmopolita ao nacionalismo, à xenofobia e ao antieuropeísmo dos seus respectivos Governos nacionais —de Hungria, Polônia, República Tcheca e Eslováquia. Os líderes locais se reuniram na segunda-feira em Budapeste para impulsionar políticas distantes do conservadorismo e do corte de liberdades que predominam nesse grupo de países, 30 anos depois da queda do Muro do Berlim e 15 anos após a ampliação da União Europeia para o leste.

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A aliança, chamada Pacto de Cidades Livres, lança uma potente mensagem dentro e fora desses países. Dentro porque dá visibilidade a uma sociedade liberal e conectada à Europa, que luta para ter uma voz em meio à retórica ultranacionalista e populista dos Governos desses quatro países que compõem o chamado Grupo de Visegrado, a partir do qual combatem as posições da UE em temas como imigração e a mudança climática. Mas também envia um sinal à Europa, como afirma András Bíró-Nagy, diretor do think tank Policy Solutions, de Budapeste. “O pacto dos prefeitos projeta um rosto distinto desses países, um rosto mais social, mais verde e liberal, perante a União Europeia. No plano pragmático, propõe que sejam as próprias cidades que possam receber recursos mais diretamente da UE sem terem que depender por completo dos Governos nacionais”.

Nos últimos anos, a Hungria do ultradireitista Viktor Orbán liderou uma ofensiva contra a imigração na Europa e foi construindo um modelo nacionalista em que ele e seu partido monopolizam poder à custa de minar o dos juízes, da imprensa, da sociedade civil, das instituições educativas e do próprio Estado de Direito. Orbán o chama de “democracia iliberal”, como antítese de uma Europa aberta e solidária. Esse ideário lhe permitiu ganhar eleições com enormes maiorias desde 2010. Mas, em outubro, a oposição húngara conseguiu derrotar o partido do Orbán e assumiu a prefeitura da capital e de outras nove cidades importantes, dando oxigênio a essa parte da sociedade preocupada com os rumos autoritários do país. Trata-se de uma parcela da população que acredita em sociedades diversas e considera que é preciso agir imediatamente contra a mudança climática.

O novo prefeito de Budapeste, Gergely Karácsony, é um ecologista e sociólogo de 44 anos. Ganhou as eleições municipais como candidato único da oposição, que durante anos havia estado fragmentada e acumulando derrotas. Venceu com um programa em que falava da bolha imobiliária, da mudança climática, convencido de que “a mudança em Budapeste e nas grandes cidades é o primeiro passo para a mudança em toda a Hungria”, como disse após sua vitória. Karácsony afirmou que as quatro capitais cooperarão em vários âmbitos e tentarão “convencer a UE de que faz sentido destinar mais recursos diretamente às prefeituras”, informa a agência EFE. Ele recordou que boa parte do dinheiro comunitário na verdade “vai para oligarcas próximos ao poder”, em alusão aos recentes escândalos de corrupção na República Tcheca e Hungria.

Os prefeitos escolheram um lugar simbólico para estabelecer o pacto: o antigo campus da Universidade Centro-Europeia de Budapeste, uma prestigiosa instituição acadêmica financiada pelo filantropo de origem húngara George Soros e que no ano passado teve que transferir a maior parte das suas atividades para Viena devido à perseguição do Governo de Orbán.

Na Polônia, também Varsóvia é uma ilha ideológica no mar ultranacionalista e ultraconservador do partido Lei e Justiça. A capital é, desde 2006, um bastião da oposição ao partido liderado por Jaroslaw Kaczynski. Quando Rafal Trzaskowski (Varsóvia, 47 anos) foi eleito prefeito, em outubro de 2018, já tinha sido deputado, eurodeputado e ministro. Apresentou-se como o candidato da Coalizão Cívica, um conglomerado de partidos de ideologia diversa, liderado pelo liberal Plataforma Cívica e criado para fazer frente à ascensão dos ultraconservadores do Lei e Justiça em todo o país.

As políticas inclusivas lançadas no último ano em Varsóvia puseram em pé de guerra o partido do Governo. Em fevereiro, Trzaskowski assinou uma declaração em favor dos direitos do coletivo LGTB que, entre outras medidas, introduzia programas sobre educação sexual e tolerância nas escolas da capital. Em uma entrevista em maio passado, o vice-prefeito Paweł Rabiej, um dos poucos políticos assumidamente homossexuais na Polônia, defendia o pacto: “Queremos fazer de Varsóvia uma cidade aberta e para todos, temos que ser consequentes com nossos valores”. Atualmente, o Parlamento debate um projeto de lei que pune com até cinco anos de prisão quem oferecer educação sexual a menores.

A cruzada do Governo contra o coletivo LGTB se soma a uma perseguição a organizações feministas, cujas ajudas públicas foram cortadas depois da chegada dos ultraconservadores ao poder. Em outubro, o Lei e Justiça revalidou a maioria absoluta obtida em 2015. O partido do Governo já fez os alarmes dispararem em Bruxelas durante a legislatura anterior, por se considerar que ele punha em risco o Estado de Direito com iniciativas como a reforma do sistema judicial, que busca dar um maior controle ao Executivo e que teve alguns trechos suspensos pela Justiça europeia, como o da idade de aposentadoria dos juízes.

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