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Perda de apetite após AVC abre uma nova porta no labirinto cerebral que regula a fome

Sistemas de controle da ingestão de alimentos são complexos, sem contar com uma única ‘alavanca’ neurológica que evitaria a superalimentação ou a anorexia

Uma equipe médica faz exame exploratório para determinar o alcance de uma lesão cerebral após um derrame, em dezembro de 2019, em Madri.
Uma equipe médica faz exame exploratório para determinar o alcance de uma lesão cerebral após um derrame, em dezembro de 2019, em Madri.Luis Sevillano Arribas
Raúl Limón
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Uma mulher canadense de 28 anos sofre um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico que afeta a ínsula posterior esquerda do cérebro. A paciente parece se recuperar do derrame em 11 dias. Entretanto, sete meses depois de sair do hospital, e sem nenhum tratamento farmacológico por trás, relata não sentir sensação de fome, apesar de manter intactas as percepções associadas ao olfato e paladar. Perdeu o apetite, e suas comidas favoritas não lhe traziam nenhum prazer durante 15 meses após o AVC. Uma pesquisa da Universidade de Montreal liderada por Dang Khoa Nguyen e publicada na Neurocase acredita ter descoberto neste caso uma nova região cerebral implicada na sensação de apetite.

Entretanto, o neurocientista José María Delgado, da Universidade Pablo de Olavide, de Sevilha (Espanha), adverte que há outras regiões cerebrais relacionadas à fome, explica que a área afetada por esse episódio tem conexões com as outras já conhecidas, e que além da “regulação meramente metabólica da alimentação exercida pelo cérebro” há outra estrutura muito relevante do ponto de vista cognitivo. Assim, o controle da fome não seria acionado por uma única alavanca, segundo o pesquisador espanhol. O apetite é complexo e não tem um interruptor único.

Depois do AVC isquêmico, a paciente apresentou esperadas limitações de mobilidade em metade do corpo e dificuldades para falar. Tinha sofrido danos em uma recôndita sub-região do cérebro, de difícil acesso e pouco estudada, que está associada com a atividade vinculada à tomada de decisões, o processamento emocional e a atenção. Até agora ela não havia sido diretamente relacionada com o apetite, embora, conforme ressalta José María Delgado, que remete a uma publicação na revista Neuroimage, “sim com conexões com o hipotálamo lateral, onde se localiza o centro da fome”.

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A sensação de fome e o prazer oferecido pela alimentação foram recuperados 16 meses depois do derrame. Mas nesse quase um ano e meio a paciente perdeu 13 quilos (de 73 para 60) sem que, segundo Dang Khoa Nguyen, “a falta de apetite fosse atribuível a medicação, ao uso de substâncias ou a distúrbios clínicos”.

Segundo o pesquisador canadense, “a crescente evidência sugere que a ínsula é um ator principal no processamento gustativo, interoceptivo [capacidade para perceber estímulos internos] e emocional”. E acrescenta: “Provavelmente integra estas diferentes funções para oferecer o controle homeostático [autorregulação de um sistema influenciado por agentes exteriores] da ingestão de alimentos”.

A ínsula tem conexões com o hipotálamo lateral, onde se localiza o suposto centro da fome e, também, com o núcleo accumbens, cuja ativação produz a sensação de recompensa ou de satisfação após conseguir o que se buscava”
José Maria Delgado, neurocientista da Universidade Pablo de Olivade, de Sevilha

Delgado observa que a pouco conhecida ínsula cerebral está associada a “tarefas de regulação de funções viscerais e interoceptivas, ou seja, de receptores sensoriais internos, por isso, entre suas possíveis funções metabólicas, pode estar também a regulação da ingestão de alimentos”.

Porém, o neurocientista espanhol diz que, “embora os autores do artigo não mencionem”, já se sabe que “a ínsula tem conexões com o hipotálamo lateral, onde se localiza o suposto centro da fome e, também, com o núcleo accumbens, cuja ativação produz a sensação de recompensa ou de satisfação após conseguir o que se buscava: comida, água etc.”.

Delgado, autor de estudos sobre a regulação cerebral da fome, especifica que “é o hipotálamo, um pequeno centro nervoso que não representa mais do que 1% do peso total do cérebro, que regula todas as funções metabólicas endócrinas”. E explica que, a partir de experimentos com animais, sabe-se que há “um centro da fome no hipotálamo lateral que, se for eletricamente estimulado, aumenta o apetite”. “Do mesmo modo”, prossegue, “o córtex pré-frontal medial e o núcleo accumbens [relacionados com a sensação subjetiva e consciente de prazer, bem-estar ou satisfação] também desempenham um importante papel na modulação consciente dos sinais de apetite e saciedade. Se forem estimulados, fazem o apetite diminuir. Em longo prazo,isso pode produzir anorexia”.

Se um AVC afetar o centro da fome ou algumas das estruturas que o ativam, o paciente perde o apetite

O neurocientista considera coerente que, se um AVC afetar o centro da fome ou algumas das estruturas que o ativam, o paciente perca o apetite. Uma dessas estruturas, conforme consta na Brain Research, é o núcleo accumbens, que, ativado eletricamente, pode gerar a sensação de saciedade. O grupo de Delgado fez experiências em ratos mostrando como esta manipulação evitava que um espécime pegasse comida, porque se sentia satisfeito. “Esse mecanismo existe também nas pessoas e nos primatas, não é exclusivo de roedores”, acrescenta.

Mas, esclarece, estes sistemas só explicam o apetite do ponto de vista da regulação meramente metabólica da alimentação. Neste sentido, acrescenta que “há outra estrutura que regula a alimentação do ponto de vista cognitivo, ou seja, uma coisa é passar muito tempo sem comer, que a glicose no sangue caia e se ative o centro da fome, que é um mecanismo fisiológico, e outra são os mecanismos de tipo cognitivo, que levam a pessoa a comer quando está diante de um alimento apetitoso, mesmo que não tenha fome, ou a jejuar porque está chateado e isso tira o apetite”.

Esta complexidade dos elementos que abrem ou reduzem o apetite é justamente a maior dificuldade no desenvolvimento de um fármaco que regule a fome e permita combater a obesidade ou a anorexia

Esta complexidade dos elementos que abrem ou reduzem o apetite é justamente a maior dificuldade no desenvolvimento de um fármaco que regule a fome e permita combater a obesidade ou a anorexia. Neste sentido, Delgado esclarece: “É preciso uma inibição ou ativação sustentada no tempo dos centros da fome ou da saciedade. Do contrário, com uma comida normal, o apetite fica saciado antes de serem ativados os sinais hormonais e nervosos que regulam o processo digestivo”.

A busca por este gatilho ou inibidor da fome levou a pensar na estimulação física do cérebro, ou então química, através da dopamina, uma molécula que atua como neurotransmissor. Um fármaco que modulasse a presença desta substância, considerada a causadora de sensações prazerosas e da sensação de relaxamento, evitaria que uma pessoa coma demais, porque terá a sensação de que já se alimentou suficientemente.

O perigo de lesionar uma parte do cérebro ou de se drogar para obter um determinado efeito que tem uma importante causa psicológica e traz consequências colaterais

Mas, neste sentido, Delgado adverte para o perigo de lesionar uma parte do cérebro ou de se drogar para obter um determinado efeito que tem uma importante causa psicológica e traz consequências colaterais. O próprio estudo canadense sobre os efeitos da lesão cerebral observa que a paciente não perdeu apenas o apetite, mas também o prazer em comer.

“Não é fácil encontrar um fármaco que tire a fome”, explica o pesquisador, “porque você pode eliminar também todo o resto associado com a satisfação, com os mecanismos de motivação e incentivos: a motivação seria a fome, a sede ou o impulso sexual; o incentivo é uma boa comida, água ou uma relação satisfatória. A chave é que a motivação funcione nos limites considerados normais. Quando não se consegue uma satisfação suficiente, gera-se um problema de dependência, porque o mecanismo já não está funcionando bem”.

No caso da fome há interferência tanto de aspectos subjetivos quanto fisiológicos, por isso não há uma única via de ataque, pelo contrário”
José Maria Delgado, neurocientista

Aos efeitos secundários adversos se soma que os mecanismos naturais são mais eficazes e complexos, envolvendo muitas regiões do cérebro e de outras partes do corpo, por isso é difícil articular uma terapia única com uma consequência singular. Neste sentido, o neurocientista explica que “o mecanismo subjetivo de regulação da fome é mais rápido inclusive que o mecanismo fisiológico. Quando você começa a comer, o estômago se distende e, momentaneamente, elimina-se a sensação de fome. Isso já é um freio. Depois, com a digestão, liberam-se substâncias e hormônios [leptinas, insulina, colecistoquinina] que, seja pelo sangue ou através de nervos periféricos, sobretudo o nervo vago, atuam sobre o centro da saciedade. Todo esse mecanismo funciona de forma inconsciente. E há também o componente consciente: se você vir uma comida com péssima aparência, você perde o apetite, e aí não interveio nada de metabolismo, só a percepção visual. Também ao contrário, mesmo que você não tenha muita fome, se lhe colocarem uma comida com aspecto espetacular, você come. Essas segundas regulações já são de tipo psicológico”.

Delgado conclui: “Não, não há uma solução fácil, não há um atalho. Algumas lesões cerebrais podem ser prevenidas ou evitar que se propaguem ou se agravem. Mas se já houver uma lesão neuronal e for muito extensa, a capacidade de recuperação depende de outros mecanismos compensatórios. Se você tiver uma paralisia do braço direito, pode se adaptar e escrever com o braço esquerdo. O cérebro se adapta às mudanças induzidas, mas no caso da fome há interferência tanto de aspectos subjetivos quanto fisiológicos, por isso não há uma única via de ataque, pelo contrário”.

Necessidade ou vontade

Yong Xu, professor de nutrição e biologia molecular e celular na Faculdade de Medicina Baylor (Waco, Texas), concorda quanto à complexidade de regular inclusive os comportamentos de ingestão por necessidade ou prazer. Em um estudo publicadona revista Molecular Psychiatry, sua equipe descobriu que, embora o cérebro controle ambos os comportamentos através de neurônios produtores de serotonina no mesencéfalo (porção superior do tronco encefálico), cada tipo de alimentação está conectado com seu próprio circuito independente.

Yong Xu explica: “O circuito que se projeta para o hipotálamo regula principalmente a alimentação impulsionada pela fome, mas não influi no comportamento alimentar impulsionado pelo prazer. E vice-versa. Isto indica que, em nível de circuito, o cérebro conecta os dois tipos de comportamento alimentar de maneira diferente”. O trabalho permite estudar a identificação de possíveis alvos moleculares associados aos circuitos que poderiam servir para tratar a superalimentação.

Na linha da complexidade de fatores envolvidos na fome, um experimento com ratos modificados geneticamente, publicado na Nature e dirigido por Bradford B. Lowell, endocrinologista do centro médico israelense Beth, acrescenta um elemento a mais à complexa interação neuronal que governa esta sensação. Lowell, também professor em Harvard, concentrou-se nos neurônios AgRP, que se encontram no hipotálamo. Janet Berrios, coautora do estudo, explica que “estes neurônios se ativam ao jejuar e causam sensação de fome. Ao ativá-los artificialmente em um camundongo recém-alimentado, ele ingere grandes quantidades de comida, como se não tivesse comido há dias”. Embora a presença de alimentos ou um sinal vinculado à presença de alimentos iniba instantaneamente a atividade do neurônio e alivie a sensação de fome, se ele não comer em um curto período de tempo, a atividade neuronal se recupera e a fome volta aos seus níveis anteriores.

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