Planalto omite da CPI da Pandemia agenda que mostraria aglomerações de Bolsonaro em Brasília

Senadores buscam saber quantas vezes o presidente circulou pela capital e encontrou apoiadores, mas Governo diz que saídas foram de caráter privado. Empresas de comunicação devem fornecer dados

O presidente Jair Bolsonaro em manifestação no dia 15 de maio, em Brasília.Eraldo Peres (AP)
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O Palácio do Planalto se recusou a repassar à Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia informações sobre a agenda do presidente Jair Bolsonaro no Distrito Federal desde o dia 1º de março de 2020, quando o coronavírus passou a se alastrar pelo Brasil. O pedido era para que o gabinete presidencial informasse em quais ocasiões o presidente circulou pelo comércio de Brasília e do entorno a cidade, o que pode servir para mostrar como Bolsonaro promoveu aglomerações em plena pandemia de covid-19. Mas, em um ofício enviado ao colegiado, o chefe do gabinete pessoal do Presidente, Célio Faria Júnior, afirmou que não havia nenhum compromisso oficial do mandatário aos moldes do solicitado pelo requerimento assinado pelo senador bolsonarista Eduardo Girão (Podemos-CE). “Informo à vossa excelência que eventuais deslocamentos do senhor presidente da República, no período indicado, realizados em caráter privado, não fazem parte de sua agenda oficial”, diz o assessor.

Desde que foi declarada a pandemia é comum ver o presidente promovendo aglomerações em diversas regiões do país. No caso da CPI, a ideia inicial era mostrar em quais ocasiões, mesmo fora de compromissos públicos, Bolsonaro participou de aglomerações no Distrito Federal contrariando as recomendações sanitárias de distanciamento social e de uso de máscaras faciais como medidas para evitar a transmissão do coronavírus.

Uma das principais queixas de membros da CPI é que o Governo tem se recusado a responder diretamente alguns dos requerimentos ou, quando o faz, impõe sigilos que não deveriam ser impostos. “Não podemos permitir de jeito algum que haja espaços cinzentos. O que pudermos fazer para tornar essa investigação pública, vamos fazer”, disse o relator da comissão Renan Calheiros (MDB-AL), em uma entrevista coletiva na tarde desta sexta-feira. Quase um terço dos mais de 500 documentos entregues ao colegiado possuem esse segredo. No entanto, há a possibilidade de parte deles ser levantado, mediante análise prévia de técnicos da comissão e com a aprovação dos senadores.

Diante da negativa do Planalto de repassar as informações sobre a agenda do presidente, a comissão aprovou nesta semana um requerimento no qual pede que sete emissoras de televisão brasileiras entreguem imagens dos momentos em que o presidente não respeitou as recomendações sanitárias. O requerimento é de autoria do senador oposicionista Randolfe Rodrigues (REDE-AP). “Já que o Planalto inventou uma desculpa, buscamos alternativamente que esses meios digitais sejam fornecidos pelas emissoras”, afirmou Rodrigues.

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Ainda que as emissoras não forneçam esses dados, é simples obter essas comprovações. Em uma rápida busca nas redes sociais de Bolsonaro e no YouTube é possível encontrar diversas situações em que o presidente circulou pelo Distrito Federal sem máscaras ou promovendo aglomerações. Nos últimos dois meses, Bolsonaro produziu provas contra si mesmo e registrou em seu Twitter ao menos cinco ocasiões que poderiam resultar em algum tipo de responsabilização. No dia 20 de março, ele esteve em na comunidade de Chaparral, em Taguatinga, onde tirou foto com apoiadores. No dia 10 de abril foi a São Sebastião, conversou com uma família de venezuelanos exilados no Brasil e discursou em uma igreja. Em 24 de abril, visitou a favela do Sol Nascente e o comércio de Ceilândia. Em 9 de maio, esteve em um passeio de motocicletas com centenas de motoqueiros pela região central de Brasília. Por fim, em 15 de maio, participou a cavalo de uma manifestação que produtores rurais em seu apoio.

Como o requerimento inicial da CPI tratava de dados referentes aos passeios de Bolsonaro por Brasília, o levantamento feito pelo EL PAÍS nas redes do presidente não leva em conta os atos públicos em que ele promoveu aglomerações ou a “motociata” no dia 23 de maio, no Rio de Janeiro, da qual participaram cerca de 2.000 motociclistas, entre eles o ex-ministro da Saúde e general da ativa do Exército, Eduardo Pazuello. O militar discursou sem máscara no evento, poucos dias após depor na CPI e pedir desculpas por não usar a proteção facial em um shopping de Manaus. A participação de Pazuello no ato pró-Governo, aliás, resultou na sua reconvocação para a CPI, o depoimento deve ocorrer ao longo do mês de junho. “A nova convocação do Pazuello tem um caráter pedagógico fundamental, se não ocorresse ela soaria, na prática, como um desrespeito ao trabalho desta comissão”, disse o relator Calheiros.

Após um mês de trabalhos, a CPI inicia nesta semana a fase de oitivas de especialistas. Nesta terça-feira será ouvida a médica Nise Yamaguchi, conselheira informal do presidente e defensora da ineficaz cloroquina no tratamento de coronavírus. Na quarta, outros quatro nomes comparecerão, entre eles o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Clóvis Arns da Cunha, e a presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família, Zeliette Zambom. O microbiologista e youtuber de divulgação científica Átila Iamarino também foi convidado.

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