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Regime de Ortega promove caçada a jornalistas sob pretexto de combater lavagem de dinheiro

Perseguição à pré-candidata presidencial Cristiana Chamorro também é usada para intensificar pressão sobre comunicadores e veículos na Nicarágua

A pré-candidata presidencial Cristiana Chamorro depois de comparecer à sede do Ministério Público da Nicarágua.
A pré-candidata presidencial Cristiana Chamorro depois de comparecer à sede do Ministério Público da Nicarágua.Carlos Herrera

O processo em que o Governo de Daniel Ortega e Rosario Murillo acusa a líder oposicionista Cristiana Chamorro de lavagem de dinheiro está sendo usado agora como guarda-chuva para intensificar a pressão sobre jornalistas e veículos de comunicação na Nicarágua. Nesta segunda-feira, o Ministério Público do país centro-americano, leal ao regime sandinista, emitiu uma série de intimações contra repórteres e diretores das publicações, no que foi interpretado como uma escalada nos esforços para calar a imprensa independente, num ano em que a Nicarágua tem eleições gerais que até agora não gozam de nenhuma garantia de credibilidade e livre concorrência.

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Os jornalistas intimados pelo Ministério Público são Fabio Gadea Mantilla, diretor da Rádio Corporação, uma das emissoras de maior audiência do país, em especial nas zonas rurais, María Lilly Delgado, correspondente da TV Univision, Verónica Chávez, ex-diretora-executiva do confiscado canal 100% Notícias, e Lourdes Arróliga, ex-funcionária da Fundação Violeta Barrios de Chamorro. Também foi chamado Guillermo Medrano, ex-diretor da área de direitos humanos da mesma fundação.

A pré-candidata presidencial Cristiana Chamorro é ré no processo por sua condição de ex-diretora da Fundação Violeta Barrios Chamorro, organização não governamental que fechou as portas em fevereiro para não se submeter à Lei de Agentes Estrangeiros promulgada pelo regime, uma normativa que criminaliza as doações e o financiamento a meios de comunicação. A Fundação Violeta Chamorro era uma referência na defesa e a promoção da liberdade de imprensa na Nicarágua, um país onde esse direito fundamental é atacado sistematicamente pelo Governo.

Segundo o regime de Ortega, “a Fundação Violeta Barrios de Chamorro para a Reconciliação e a Democracia descumpriu gravemente suas obrigações perante o Órgão Regulador, e pela análise dos Estados Financeiros no período de 2015 a 2019 se obtiveram claros indícios de lavagem de dinheiro; por isso o Ministério de Governo [Casa Civil] informou [a suposta irregularidade] ao Ministério Público para a investigação correspondente”.

Cristiana Chamorro compareceu na semana passada ao Ministério de Governo e ao Ministério Público para apresentar a documentação que, segundo ela, contradiz as acusações de lavagem. A ex-diretora da fundação cataloga o caso “como uma monstruosidade jurídica” contra ela, com o objetivo de tolher suas aspirações políticas. Chamorro é a presidenciável mais popular segundo as pesquisas, e sua estatura moral – na qualidade de filha da ex-presidenta Violeta Chamorro e de Pedro Joaquín Chamorro, mártir das liberdades públicas assassinado pela ditadura de Anastasio Somoza – faz dela a figura ideal para dar coesão à cindida oposição nicaraguense.

“Esta não é uma acusação contra a minha pessoa, e sim contra todos os que queremos democracia. Neste momento o ditador está demonstrando que tem medo de mim. Asseguro a vocês que também tem medo de todos nós, porque seremos capazes de nos unir e o derrotaremos junto com povo”, afirmou a líder oposicionista.

Caçada a jornalistas

Além da possível intimidação a Chamorro, o Governo de Ortega aproveitou a suspeita de lavagem de dinheiro para perseguir outros jornalistas e veículos de comunicação. No dia em que a pré-candidata foi denunciada, a revista Confidencial teve sua redação invadida por policiais pela segunda vez em três anos. Carlos Fernando Chamorro, diretor dessa revista investigativa e irmão de Cristiana, alegou que sua publicação não tem nenhum vínculo com a Fundação Violeta Chamorro, como alega o regime.

Nas redes sociais e nos meios de comunicação oficiais surgiu uma campanha de difamação que justifica a ação de lavagem contra jornalistas sob o nome de “a lavanderia dos Chamorro”. Nesta segunda-feira, começaram a ser emitidas as intimações contra jornalistas por parte do Ministério Público – uma instituição sem credibilidade, à qual organismos de direitos humanos atribuem a fabricação de processos políticos que são disfarçados como delitos comuns desde 2018, quando começaram os protestos populares contra a Administração Ortega.

Nas intimações aos jornalistas consta que eles estão envolvidos no suposto caso de lavagem de dinheiro da Fundação Violeta Chamorro e da ex-executiva da organização. Até agora os jornalistas foram chamados apenas para “esclarecimentos”, um passo que geralmente antecede à abertura de um processo penal.

“Dentro do plano para silenciar a imprensa independente na Nicarágua, fui intimada nesta tarde a uma diligência amanhã às 8h. Pretendem me implicar no mesmo processo arbitrário de suposta ‘lavagem de dinheiro’ contra Cristiana Chamorro”, disse a jornalista María Lilly Delgado.

Também na noite de segunda-feira, Cristiana Chamorro informou que suas contas bancárias foram congeladas pelo Governo. “Em meio a toda esta grotesca farsa, a ditadura congelou minhas contas bancárias e suspendeu meu sigilo bancário. Rejeito e denuncio esta arbitrariedade”, escreveu a pré-candidata presidencial.

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