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Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

O que esperar do PL do Licenciamento Ambiental?

Ainda que a aprovação do texto na Câmara dos Deputados acenda o alerta de todos aqueles preocupados com o desmonte das políticas de proteção ambiental no Brasil, há elementos para esperar um debate mais democrático e responsável no Senado Federal

Um trator da fazenda Minuano, No fundo, uma das parcelas da vegetação que lei obriga a preservar nesta zona de Amazonia.Apenas 20% da  propriedade é de área cultiváveis.
Um trator da fazenda Minuano, No fundo, uma das parcelas da vegetação que lei obriga a preservar nesta zona de Amazonia.Apenas 20% da propriedade é de área cultiváveis.Victor Moriyama

A Câmara dos Deputados aprovou na última quarta-feira (12.5.2021) o PL 3729/200, na redação do substitutivo proposto pelo relator, o deputado Neri Geller (PP-RS), a partir das emendas de plenário. O PL é polêmico por alterar de forma significativa a política de licenciamento ambiental no país. Dentre as mudanças que serão efetuadas caso a proposição seja aprovada no Senado Federal, estarão dispensadas de licenciamento ambiental um conjunto de atividades agropecuárias, obras menores ou relativas a setores específicos, como saneamento básico. Além disso, o PL torna o licenciamento ambiental mais célere e flexível, incluindo uma nova modalidade, o Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC). Os movimentos e organizações ambientalistas consideram que essas mudanças desmontam a fiscalização ambiental com impactos potencialmente devastadores para a política de proteção ecológica do país.

Mais informações
AME9002. BRASILIA (BRASIL), 19/05/2021.- El ministro de Medio Ambiente de Brasil, Ricardo Salles, camina tras salir del evento "Camino al desarrollo sostenible de la industria de residuos sólidos en Brasil", hoy, en Brasilia (Brasil). La Policía Federal brasileña inicio este miércoles una operación en varias ciudades del país para determinar el grado de participación del ministro de Medio Ambiente, Ricardo Salles, y otras autoridades ambientes en un esquema de exportación ilegal de madera a Europa y Estados Unidos. EFE/ Joédson Alves
EUA entregaram ao Brasil detalhes que levaram PF a Salles por suspeita de contrabando de madeira ilegal
Brazil's Environment Minister Ricardo Salles (2-L) delivers a speech next to President Jair Bolsonaro durind a demonstration by farmers against the Supreme Court and calling for the end of COVID-19 restrictions, in Brasilia, on May 15, 2021 - The rally's organizers have called for conservative "soldiers" to protest the "craziness" of pandemic stay-at-home measures and Brazil's Supreme Court, which allowed local authorities to impose such policies over Bolsonaro's objections. (Photo by EVARISTO SA / AFP)
Ricardo Salles é alvo de operação da Polícia Federal que apura contrabando de madeira brasileira
02/03/2020 - Moradores da Reserva Extrativista Verde Para Sempre, no município de Porto de Moz (PA) estão preocupados com as pressões para diminuir a área da unidade de conservação e até mesmo a mudança de status do seu território. O temor deles é que haja especulação financeira com a exploração da área por latifundiários e madeireiros. Os extrativistas e ribeirinhos defendem a manutenção da reserva e seu modo de vida atual. No território, eles têm atividades como o manejo sustentado de madeira, a criação de búfalos, a pesca e a extração de frutos.  
- Na foto, búfalos criados em área alagada do rio Uiui (um furo do rio Amazonas), dentro da Reserva Extrativista Verde Para Sempre.                                                                                     Foto: Lilo Clareto/El País
Câmara afrouxa licenciamento ambiental e projeto criticado por especialistas vai ao Senado

O PL do licenciamento não chegou a receber pareceres das comissões designadas durante sua tramitação em legislaturas anteriores à atual. Em 2019, ele foi desarquivado e em julho de 2019 entrou no regime de urgência, segundo o artigo 155 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD). Sua tramitação praticamente cessou desde então, devido à gestão da agenda legislativa pelo antigo presidente Rodrigo Maia (DEM), voltada para os efeitos da pandemia, até ser trazida à ordem do dia em março de 2021. Estando em regime de urgência, a proposição dispensou pareceres das comissões a que fora designada no início de sua tramitação e em menos de dois meses recebeu o parecer de seu relator de plenário.

Uma vez aprovado na Câmara dos Deputados, o PL 3729/2004 aguarda agora seu envio para o Senado. Há a expectativa por parte de ambientalistas de que essa casa possa revisar ou mesmo arquivar o projeto aprovado na Câmara. De fato, o Senado Federal, em contraste com a Câmara dos Deputados, tem adotado postura mais crítica e autônoma em relação ao governo desde a eleição da nova Mesa Diretora e de seu novo presidente, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Diferentemente de Arthur Lira (PP-AL), cuja eleição para a presidência da Câmara dependeu do apoio ostensivo do Planalto, Pacheco foi eleito com apoio de ampla coalizão de senadoras e senadores, inclusive oposicionistas.

Existem sinais contundentes de distanciamento entre Senado e Planalto, sendo o mais expressivo deles a CPI da COVID-19. A comissão elegeu o relator Renan Calheiros (MDB-AL), crítico contumaz do governo de Jair Bolsonaro, em uma indicação clara de que a maioria de seus membros é independente do governo ou mesmo oposicionista. A diferença hoje existente entre Câmara e Senado, portanto, pode ter efeitos sobre a tramitação do PL sob exame. Vejamos, por exemplo, o destino do PL 948/2021, que libera a compra de vacinas pelo setor privado. O projeto foi aprovado por maioria esmagadora na Câmara no início de abril, em regime de urgência, e encaminhado em seguida para o plenário do Senado Federal - ou seja, sem a previsão de pareceres oriundos das comissões permanentes, sujeito, portanto, a uma tramitação acelerada. Entretanto, devido à resistência de senadoras e senadores de diferentes matizes partidários e à manifestação por ofício do Conselho Nacional de Direitos Humanos, a proposição foi retirada da ordem do dia, sem previsão de retorno.

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Nos próximos dias a Mesa Diretora do Senado receberá o PL do licenciamento ambiental e deverá decidir, então, o caminho de sua tramitação na casa. Com o retorno das comissões permanentes, após longo período de suspensão devido ao funcionamento remoto do Congresso durante o ano de 2020, é improvável que o projeto seja diretamente encaminhado ao plenário. Afinal, a proposição não trata de tema relacionado à pandemia. O fato de ter sido considerado urgente na Câmara dos Deputados foi, acima de tudo, um indicativo de sua prioridade para o governo, não havendo nada que justificasse a tramitação apressada de uma proposição com tamanho impacto sobre o meio ambiente. Nesse sentido, é interessante notar que a Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado é hoje presidida pelo senador oposicionista Jaques Wagner (PT-BA), algo que pode contribuir para mudanças significativas no teor dado ao projeto pela CD.

Desse modo, ainda que a aprovação do PL do licenciamento ambiental na Câmara dos Deputados acenda o alerta de todos aqueles preocupados com o desmonte das políticas de proteção ambiental no Brasil, há elementos para esperar um debate mais democrático e responsável no Senado Federal. Para isso, é fundamental que a proposição siga o trâmite normal. Com o retorno das comissões permanentes, não se justifica mais o emprego da urgência regimental como forma de se passar apressadamente matérias de interesse do Governo ―a famosa boiada―, sem relação direta com a pandemia e de que efeitos longevos e potencialmente nocivos não só ao país, mas também a parte significativa do globo terrestre.

Fabiano Santos é professor associado e pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ), coordenador do Núcleo de Estudos sobre o Congresso (NECON) e do Observatório Legislativo Brasileiro (OLB), ambos do IESP/UERJ. Pós Doutorado pela Universidade da Califórnia em San Diego.

Leonardo Martins Barbosa é doutor em Ciência Política pelo IESP/UERJ e pesquisador do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) e do Núcleo de Estudos sobre o Congresso (NECON).

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