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Juiz auxiliar do Supremo mantém prisão de Daniel Silveira até que Câmara avalie medida

O parlamentar bolsonarista foi preso em flagrante por ordem do ministro Alexandre de Moraes. Posteriormente o plenário do STF referendou a decisão por unanimidade

Gil Alessi
O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) durante sessão na Câmara.
O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) durante sessão na Câmara.Vinicius Loures (Câmara)
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AME6340. BRASILIA (BRASIL), 17/02/2021.- Fotografía de archivo fechada el 26 de noviembre de 2020 que muestra al diputado brasileño Daniel Silveira, que integra la base aliada del presidente Jair Bolsonaro, mientras habla. Silveira, que integra la base aliada del presidente Jair Bolsonaro, fue preso este martes después de divulgar un vídeo en sus redes sociales en los que insulta con palabras de grueso calibre a varios magistrados de la Corte Suprema del país. Por determinación del magistrado Alexandre de Moraes, que ordenó la detención inmediata del congresista, independiente del horario, Silveira fue arrestado poco antes de la medianoche por agentes de la Policía Federal en la ciudad de Petrópolis, en la región serrana de Río de Janeiro. EFE/ Joédson Alves ARCHIVO
STF mantém prisão controversa de deputado Daniel Silveira e cria constrangimento à Câmara

O juiz Aírton Vieira, integrante do gabinete do ministro Alexandre de Moraes, determinou nesta quinta-feira durante audiência de custódia manter a prisão do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar foi preso em flagrante na noite de terça-feira horas após postar um vídeo no qual incitava a violência contra os integrantes do Supremo Tribunal Federal e defendia a volta do Ato Institucional 5, um dos mais duros da ditadura militar. Vieira determinou que Silveira continue detido até que a Câmara analise a questão, o que deve ocorrer na sexta-feira.

A ordem para sua detenção partiu do próprio Moraes, responsável pelo controverso inquérito que apura ataques e disseminação de fake news contra a Corte ―o procedimento teve origem no próprio Supremo, e não no Ministério Público, como de praxe. Na tarde de quarta-feira os ministros referendaram por unanimidade a prisão de Silveira, mas o ordenamento jurídico brasileiro prevê que o preso em flagrante tenha o direito de ser ouvido por um juiz até 24 horas após sua detenção para que o magistrado analise a legalidade da detenção, a chamada audiência de custódia. Durante esta audiência o magistrado pode transformar a prisão em preventiva (sem tempo determinado), temporária (cinco dias, prorrogáveis por mais cinco dias) ou colocar o encarcerado em liberdade.

De praxe, a audiência de custódia é conduzida pelo juiz encarregado do processo, que no caso seria o próprio Moraes. Mas ao delegar a tarefa para um magistrado de seu gabinete o ministro evita acusações de suspeição ou impedimento, tendo em vista ter sido ele mesmo o autor do pedido de prisão em flagrante e também uma das vítimas dos ataques de Silveira no vídeo.

Em nota, a assessoria do deputado afirmou que a prisão é “política”, porque avalia que suas falas não “configuram crime, uma vez que estão acobertados pela inviolabilidade de palavras, opiniões e votos que a Constituição garante aos deputados federais e senadores”. Moraes, no entanto, utilizou a Lei de Segurança Nacional —um mecanismo jurídico que remonta aos anos da ditadura militar defendida pelo próprio parlamentar— para enquadrá-lo. A legislação 7.170/83 criminaliza condutas que “expõem a perigo de lesão” os chefes de qualquer um dos três poderes da República.

Agora o destino de Silveira se encontra nas mãos da Câmara dos Deputados. Será de seus colegas de parlamento a última palavra sobre a prisão, já que a Constituição delega aos membros do Congresso decidir sobre a detenção de seus pares. Divididos entre o corporativismo e o desejo de não ampliar conflitos com o STF, os parlamentares devem tomar uma decisão sobre o assunto em breve. A cúpula da Casa, sob a presidência de Arthur Lira (PP-AL), já fez algumas movimentações no sentido de mostrar à Corte que não compactua com o teor do discurso de ódio de Silveira: o Conselho de Ética foi reativado imediatamente, e foi protocolada uma representação contra o bolsonarista, como informou o repórter Afonso Benites.

Uma das passagens mais agressivas durante os quase 20 minutos de vídeo gravados por Silveira é dedicada ao ministro Edson Fachin: “Todo mundo tá cansado dessa tua cara de filha da puta (...) por várias e várias vezes já te imaginei levando uma surra. Quantas vezes eu imaginei você e todos os integrantes dessa Corte aí. Quantas vezes eu imaginei você na rua levando uma surra”.

O vídeo de Silveira foi gravado como uma resposta ao ministro Fachin. Dias antes o magistrado criticou trecho do livro biográfico recém-lançado do ex-comandante do Exército Eduardo Villas-Bôas. Trata-se de uma passagem na qual o militar relembra tuíte postado em 2018, às vésperas do julgamento de um pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: em um recado velado, mas com intenção de pressionar o STF, Villas-Bôas escreveu que as Forças Armadas compartilhavam do “anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”. O ministro Fachin divulgou nota nesta terça para dizer, à luz do que o general detalhou em seu livro, que a manifestação de Villas-Bôas foi uma “intolerável e inaceitável” pressão das Forças Armadas no Judiciário. À partir daí Silveira resolveu disparar contra o STF.

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O teor raivoso e inconstitucional das falas de Silveira despertaram até mesmo a ojeriza do ministro Marco Aurélio Mello, um crítico contumaz do inquérito das fake news comandado por Moraes: “Estou com 74 anos de idade, 42 em colegiados judicantes, e jamais imaginei presenciar ou vivenciar o que vivenciei, jamais imaginei que uma fala pudesse ser tão ácida, tão agressiva, tão chula, no tocante às instituições”.

Logo após a decisão do STF de referendar a prisão em flagrante e sem direito a fiança de Silveira, o deputado bolsonarista sofreu outro golpe, desta vez das mãos da Procuradoria-Geral da República. Ele foi denunciado ao Supremo por “praticar agressões verbais e graves ameaças contra ministros da Corte para favorecer interesse próprio, em três ocasiões, incitar o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário, por duas vezes, e incitar a animosidade entre as Forças Armadas e o STF, ao menos uma vez”. A peça foi assinada pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, que recomenda medidas cautelares contra o deputado, como o uso de uma tornozeleira eletrônica e que ele mantenha distância do Supremo e seus integrantes.

A prisão de Silveira provocou debate no meio jurídico, tendo em vista que a definição de flagrante utilizada por Moraes foi alargada para abranger conteúdos que estão online. Juristas ouvidos pelo EL PAÍS afirmaram que o ministro “forçou a barra” neste caso, além de abrir um precedente perigoso para a prisão de críticos do Governo por comentários feitos nas redes sociais. Além disso, o próprio inquérito das fake news é considerado temerário, uma vez que tem como vítima, acusador e juiz o STF, sem participação do Ministério Público Federal. Os críticos de Moraes afirmam que ele usa esta investigação a seu bel-prazer para contra-atacar quem antagoniza com a Corte.

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