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Com eleições sem incidentes, Barroso refuta ilação de Bolsonaro sobre eficiência: “Não controlo imaginário”

Enquanto sugere fraude no sistema, presidente busca partido para iniciar sua campanha pela reeleição. Ministro do TSE diz que há pessoas que acreditam até que a Terra é plana

O presidente Jair Bolsonaro, ao votar no Rio no segundo turno das eleições municipais, neste domingo.
O presidente Jair Bolsonaro, ao votar no Rio no segundo turno das eleições municipais, neste domingo.Antonio Lacerda (EFE)

Após o susto no primeiro turno, com ataque hacker e atraso de quase três horas nas apurações, as eleições deste domingo voltaram ao eixo. Pouco mais de quatro horas após a conclusão da votação na maior parte do país, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concluiu a apuração da totalidade dos votos das 57 cidades onde ocorreram segundos turnos para prefeituras. Oficialmente, a apuração terminou às 21h11, de acordo com o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso. Mesmo assim, não faltou espaço para que o presidente da República, Jair Bolsonaro, voltasse a imitar a estratégia frustrada do presidente Donald Trump sobre potenciais fraudes no pleito. “Espero que possamos em 22 ter um sistema de votação seguro ao eleitor de que, em quem ele votou, o voto efetivamente foi para aquela pessoa. A questão do voto impresso é uma necessidade. Está na boca do povo”, disse Jair Bolsonaro sem base na realidade.

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Barroso não deixou por menos: “Não tenho controle sobre o imaginário das pessoas. Tem gente que acha que a Terra é plana, tem gente que acha que o homem não chegou à Lua e tem gente que acha que o Trump venceu [a eleição] nos EUA”, disse ele em clara insinuação ao próprio Bolsonaro, que repete sem embasamento a mesma tese do candidato republicano derrotado nas eleições americanas.

Mais informações
AME1859. SAO PAULO (BRASIL), 29/11/2020.- El alcalde de Sao Paulo y candidato a la reelección para las elecciones municipales, Bruno Covas (d), del Partido de la Social Democracia Brasileña (PSDB), posa con gobernador paulista, Joao Doria, tras votar hoy, en un colegio electoral en Sao Paulo (Brasil). Los colegios electorales para escoger a los alcaldes de 57 urbes brasileñas, entre ellas las metrópolis Sao Paulo y Rio de Janeiro, comenzaron a abrir este domingo sus puertas a las 07:00 hora local (10:00 GMT) en la segunda vuelta de las elecciones municipales. EFE/Sebastiao Moreira
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No primeiro turno, uma investigação iniciada pela ONG Safernet e revelada pelo EL PAÍS apontou que hackers tentaram macular a imagem do TSE invadindo o site do órgão para criar teorias conspiratórias de que as urnas eletrônicas não seriam seguras. Poucos minutos após a tentativa de invasão, que falhou, dezenas de militantes bolsonaristas usaram suas redes sociais para difundir desinformação. Todos os dados foram entregues à PF e à Procuradoria Geral da República. No sábado, um hacker foi preso em Portugal como um dos líderes do ataque. A investigação foi conduzida pela Polícia Federal em parceria com a polícia portuguesa.

No mesmo dia, uma falha no supercomputador do TSE que compilava os votos resultou no atraso da apuração em quase três horas. O fato resultou em outra onda de boatos sobre a falta de segurança do sistema. Nenhum ataque ou alteração de votos foi comprovado, contudo. “As reclamações são demais. Não tem como alguém bater no peito e dizer que é seguro. Não tem como comprovar”, bradou Bolsonaro a jornalistas após votar no derrotado Marcelo Crivella (Republicanos) no Rio de Janeiro.

Mas no direito há uma máxima: a prova cabe a quem acusa. E nem mesmo sua base abraçou essa tese. Nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp de bolsonaristas não houve a difusão com a mesma intensidade da que ocorreu na primeira etapa eleitoral. A fala do presidente foi mais uma clara tentativa de Bolsonaro de desviar o foco de sua derrota eleitoral. Nas capitais brasileiras, apenas um dos quatro candidatos que se identificavam com o bolsonarismo foi eleito, o delegado Lorenzo Pazolini (Republicanos), que derrotou o ex-prefeito João Coser (PT).

Indagado sobre a fala do presidente, Barroso respondeu que ele respeita a opinião de todos os cidadãos, mas não entraria neste debate. “A retórica política faz parte de um jogo que não me cabe jogar”. O ministro reafirmou também que, caso o presidente traga alguma prova de fraude, o Tribunal determinará a abertura de uma investigação. Barroso celebrou que o segundo turno ocorreu sem imprevistos e que, apesar dos discursos contrários, pode tentar explicar a segurança das urnas para quem não entendeu o sistema, mas não para quem não quer entender. “Quem não quer entender não tem remédio na farmacologia jurídica para resolver”, afirmou em tom de ironia.

Sobre a ideia de voto impresso, há rejeição clara na cúpula do TSE. “Objetivamente não existe no Brasil a possibilidade de voto impresso, porque há uma decisão unânime do Supremo Tribunal Federal em sentido contrário”, afirmou o presidente da Corte eleitoral, o ministro Luís Roberto Barroso. Hoje, no Congresso Nacional, tramitam 12 projetos de lei e duas propostas de emendas constitucionais que tratam do regresso do voto impresso.


Os ministros Roberto Barroso e Edson Fachin, no TSE.
Os ministros Roberto Barroso e Edson Fachin, no TSE.Antonio Augusto/ASCOM/TSE

Desafio partidário

Mesmo empenhado em semear dúvidas, Bolsonaro tem pela frente desafios muito maiores antes de 2022. O primeiro deles é saber a qual partido ele se filiará. Desligado do PSL desde o ano passado, ele está com sérias dificuldades em criar sua sigla, a Aliança pelo Brasil. Internamente, deu até março do ano que vem para que seus articuladores obtenham o registro. Caso não ocorra, ele pretende se filiar a um partido que já exista.

Em Brasília, lideranças políticas veem três ou quatro possibilidades para o presidente. A que mais lhe agrada é assumir um partido que possa comandar, como o Patriota, legenda que já paquerou em 2018, antes de se filiar ao PSL. Outros dois partidos sinalizaram interesse em tê-lo em suas hostes, o Progressistas e o Republicanos. Os presidentes dessas legendas, respectivamente Ciro Nogueira e Marcos Pereira, são próximos de Bolsonaro e aderiram ao Governo quando o centrão passou a ser beneficiado com cargos nos diversos escalões da máquina pública. Nenhum deles, porém, lhe cederiam o comando partidário.

Há ainda um grupo que tenta convencê-lo a ingressar no PSD, mas essa hipótese é mais frágil, já que ele enfrentaria resistência de lideranças regionais que refutam um extremista como Bolsonaro. O resultado das eleições deste domingo deve ser levado em conta na decisão do presidente definir o seu partido. Dependendo de quem ele escolher, aumenta ou diminui o número de potenciais cabos eleitorais com a máquina pública municipal nas mãos daqui a dois anos.

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