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Anvisa autoriza volta de testes de vacina contra covid-19 após ‘guerra de versões’ com Butantan

Acusada de agir com motivação política, agência reafirma que tomou decisão técnica e diz que agora tem informações suficientes para liberar a continuidade dos estudos da Coronavac pelo instituto

Pesquisador do laboratório chinês Sinovac em Pequim trabalha na produção da vacina Coronavac, em 24 de setembro.
Pesquisador do laboratório chinês Sinovac em Pequim trabalha na produção da vacina Coronavac, em 24 de setembro.WU HONG (EFE)
Daniela Mercier

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A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) anunciou nesta quarta-feira a autorização para a retomada dos testes da vacina Coronavac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria, no Brasil, com o Instituto Butantan, vinculado ao Governo de São Paulo. O órgão federal havia suspendido os testes da imunização contra a covid-19 na noite de segunda-feira, após ser informado pelo instituto de um evento adverso grave não relacionado ao produto —dando início a uma guerra de versões entre as duas entidades e à suspeita de politização da agência pelo Governo Bolsonaro.

Em nota, a agência afirma que avaliou novos dados apresentados pelo instituto paulista depois da suspensão do estudo e que agora entende ter subsídios suficientes para permitir a retomada da aplicação experimental da vacina. Na terça, em entrevista coletiva, o órgão federal havia declarado que as informações enviadas pelo Butantan foram consideradas insuficientes pela área técnica para liberar a continuidade dos estudos. “A decisão tomada ontem [segunda-feira] pela gerência geral de medicamentos era a única a ser tomada. Em sede de dúvidas, para o teste”, afirmou Antônio Barra Torres, diretor-presidente da Anvisa, na ocasião.

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Bolsonaro celebra como uma vitória a suspensão dos testes da Coronavac

No comunicado desta quarta, a agência federal reitera que a iniciativa anterior de interromper os testes teve “caráter exclusivamente técnico” e levou em consideração dados que eram de conhecimento da agência até aquele momento, além dos “preceitos científicos e legais que devem nortear as nossas ações, especialmente o princípio da precaução que prevê a prudência, a cautela decisória quando conhecimento científico não é capaz de afastar a possibilidade de dano”.

A Anvisa afirma ainda que a suspensão de qualquer estudo não significa que o produto sob investigação não tenha qualidade, segurança ou eficácia. “A suspensão e retomada de estudos clínicos são eventos comuns em pesquisa clínica e todos os estudos destinados a registro de medicamentos que estão autorizados no país são avaliados previamente pela Anvisa com o objetivo de preservar a segurança para os voluntários do estudo”, declarou.

A ordem de paralisar os ensaios com a vacina alimentou suspeitas de disputa política em torno da luta pelo combate ao coronavírus. A Coronavac é uma vitrine do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), tornado desafeto do presidente Jair Bolsonaro. Na manhã de terça, Bolsonaro chegou a celebrar como uma vitória a paralisação dos testes. “Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Doria queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”, escreveu o mandatário do país no Facebook, usando afirmações sem nenhuma evidência até agora. Em outubro, a vacina já havia sido motivo de tensão política quando o presidente obrigou o Ministério da Saúde a desfazer um acordo para comprar a Coronavac —desautorizando seu terceiro ministro na área, Eduardo Pazuello, que havia anunciado o plano de aquisição de doses na véspera.

Na terça, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse que soube pela imprensa sobre a proibição. “É uma notícia que causa surpresa, insegurança e, no nosso caso, causa até indignação”. Segundo a entidade paulista, a agência federal foi informada desde o início que o evento adverso grave não estava relacionado à aplicação da imunização —conforme noticiado por diversos veículos de imprensa, o voluntário cometeu suicídio.

Em nota após a notícia da liberação dos testes, o chefe do Butantan comemorou a decisão e agradeceu à agência federal pela “compreensão e pela rapidez com que foi autorizada a retomada dos estudos clínicos”. “Acabamos de receber um comunicado da Anvisa autorizando a retomada dos estudos clínicos com a vacina Butantan/Sinovac. Uma excelente notícia no dia de hoje”, afirmou. “Isso vem ao encontro com o que temos afirmado que essa é uma das vacinas mais seguras que está em desenvolvimento nesse momento. A Anvisa compreendeu nossos argumentos.  O óbito referido não tem relação com a vacina e, portanto, o estudo pode ser retomado”, disse no comunicado.

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