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Instituto Butantan repudia suspensão de estudos da Coronavac pela Anvisa e questiona motivação

Governo de São Paulo e autoridades médicas do Instituto reagem com “surpresa” e “indignação” à decisão da Agência e reafirmam segurança da vacina

Uma pesquisadora do SinoVac trabalha em um laboratório de desenvolvimento da Coronavac em Pequim.
Uma pesquisadora do SinoVac trabalha em um laboratório de desenvolvimento da Coronavac em Pequim.Ng Han Guan (AP)

O presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou em coletiva de imprensa nesta terça-feira que o “evento adverso grave” observado em um voluntário do estudo clínico da Coronavac ―a vacina desenvolvida em parceria com o laboratório chinês Sinovac, não teve relação com o imunizante e que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)― foi notificada disso no dia 6 de novembro. Na noite de segunda-feira, a cúpula do Instituto Butantan, ligado ao Governo de São Paulo, disse ainda que soube pela imprensa que a Anvisa suspendeu os testes com a vacina, e cujo desenvolvimento está em fase três. “É uma notícia que causa surpresa, insegurança e, no nosso caso, causa até indignação”, disse Covas, sem dissimular sua chateação.

O presidente do Butantan não deu detalhes dos argumentos apresentados pela Anvisa para a suspensão dos testes, limitando-se a dizer que a Agência solicitou informações adicionais sobre o ocorrido. Pelo contrato de confidencialidade com os voluntários do ensaio clínico, e “em respeito aos seus familiares e amigos”, a única informação divulgada é que o voluntário era do centro de estudo do Hospital das Clínicas da USP e o “evento adverso grave” teria ocorrido 25 dias após ele ter participado do teste —não se sabe se ele recebeu a vacina ou um placebo. De acordo com a TV Globo, que obteve o boletim de ocorrência do caso, a causa da morte do voluntário, um homem de 33 anos, teria sido suicídio.

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FILE PHOTO: A worker performs a quality check in the packaging facility of Chinese vaccine maker Sinovac Biotech, developing an experimental coronavirus disease (COVID-19) vaccine, during a government-organized media tour in Beijing, China, September 24, 2020. REUTERS/Thomas Peter/File Photo
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Covas reiterou que a Coronavac é “a vacina mais segura das que estão em estudo até o momento” e garantiu que os outros voluntários brasileiros que participam do estudo não terão nenhuma reação adversa. Ele também explicou que um “evento adverso” não é o mesmo que “reação adversa”, esta sim geralmente relacionada à própria vacina. Um evento adverso poderia ser um atropelamento, conforme exemplificaram Covas e o secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn: “Uma pessoa é atropelada quando sai de casa e morre —e não estou dizendo que foi esse o caso—, isso é um evento adverso. Isso é reportado, mas é um óbito pelo acidente, pela causa externa, sem nenhuma relação com a vacina”.

Com a decisão da Anvisa, a Coronavac, que continua sendo testadas em outros países —como a própria China e a Indonésia, onde a farmacêutica Bio Farm conduz testes com 1,6 mil pessoas— não pode mais ser aplicada em voluntários brasileiros. “Suspenderam o estudo, causaram medo nas pessoas, fomentaram um ambiente que já não é muito propício pelo fato dessa vacina ser feita em associação com a China. Fomentar isso a troco de quê? Não seria mais justo ligar e falar que reunião estava marcada pra esclarecer isso. Não seria mais justo, ético e compreensível?”, questionou Covas.

Apesar de sua “indignação”, o presidente do Butantan disse que confia e acredita na lisura da Anvisa. "Não quero acreditar que esse episódio represente alguma mudança [na postura técnica]. Vou atribuir isso a uma dificuldade de comunicação, preocupação exagerada e fatores que podem ser resolvidos rapidamente. “Quero acreditar que a Anvisa seja técnica e independente. Desde a sua constituição, essa independência e parte técnica do órgão é fundamental”, disse.

Já João Gabbardo, secretário-executivo do Centro de Contingência do combate ao coronavírus em São Paulo e ex-número 2 do Ministério de Saúde —durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta— criticou, sem mencioná-lo diretamente, a reação do presidente Jair Bolsonaro, que, ao saber da suspensão do estudo clínico, afirmou que “ganhou” de João Doria, governador de São Paulo. “O que nos choca é que enquanto estamos fazendo todo o possível para levar a vacina à população, coincidentemente no mesmo dia em que o Governo anuncia a chegada das primeiras doses da vacina e início de obras no Instituto Butantan, algumas pessoas festejam o fato de ter aparecido um óbito e criado essa confusão para tentar desmoralizar com a vacina que está sendo fabricada e produzida", disse.

Em comunicado divulgado nesta terça, a Sinovac diz que entrou em contato com o Butantan após descobrir sobre a suspensão dos testes pela imprensa. “O diretor do Instituto nos disse que acredita que esse evento adverso grave não tem relação com a vacina. A Sinovac vai continuar falando com o Brasil sobre o assunto. O estudo clínico no Brasil é feito de acordo com o padrão internacional de Boas Práticas Clínicas (GCP, na sigla em inglês) e estamos confiantes na segurança da vacina”, afirmou o laboratório.

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