Raul Guimarães: “O Brasil fez uma quarentena às cegas, sempre olhando para trás”
O pesquisador em Geografia da Saúde, que estuda a pandemia do coronavírus, afirma que o Brasil não conseguiu implementar um sistema de testagem em massa. País falhou no rastreio de casos

No início da crise do coronavírus, o pesquisador Raul Guimarães se surpreendeu com a velocidade de contagio. Especialista em geografia da saúde da Universidade Estadual Paulista (Unesp), tinha experiência em analisar outras epidemias sob a ótica da geografia, mas não sobre uma doença viral altamente contagiosa. Passou a integrar diversos grupos de pesquisa para conseguir entender a trajetória do vírus pelo interior de São Paulo e pelo país. Ao longo de mais de sete meses de pandemia, ajudou especialistas a entenderem cidades vetores de transmissão e identificar gargalos no sistema de saúde. Em entrevista ao grupo de trabalho Geografia e covid-19, da USP ―da qual participou o EL PAÍS― Guimarães disse que o país nunca conseguiu colocar em prática um programa de testagem em massa. “O Brasil fez uma quarentena às cegas, sempre olhando para trás”, analisa.
Nem mesmo a Atenção Básica e o exército de agentes de Saúde que o SUS já tinha foram utilizados para rastrear casos e quebrar cadeias de contágio no país. “De que adianta o agente de saúde bater na porta das pessoas se não há testagem em massa?", questiona. Mas, segundo ele, foi graças à capilaridade do SUS, presente nas mais remotas cidades brasileiras, que evitou um cenário ainda mais catastrófico do que as cerca de 154.000 mortes registradas no país.
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Para ele, num país tão extenso e desigual e que não tem a figura do Ministério da Saúde coordenando as políticas nacionalmente, a solução para frear o vírus só virá com a vacinação em massa. Atualmente, há quatro vacinas em testes no Brasil. O Governo Federal firmou um contrato para adquirir a vacina da Astrazeneca e, nesta terça-feira, anunciou parceria com o Insituto Butantan para distribuir também a vacina da Sinovac. Mesmo quando houver vacina, alerta Guimarães, o país terá que melhorar seu sistema de imunização.
A entrevista foi concedida em um programa desenvolvido por pesquisadores da Universidade de São Paulo sobre as particularidades locais e as estruturas de enfrentamento à crise sanitária em um país diverso como o Brasil, que vivencia diferentes pandemias em seu extenso território. O tema desta edição foi “Brasil e a pandemia da covid-19: um olhar a partir da geografia da saúde”.
O intuito do grupo é oferecer à sociedade subsídios para uma leitura crítica sobre que está ocorrendo no panorama atual, fortemente impactado pela pandemia da covid-19. No dia 3 de novembro, o programa de entrevistas receberá o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Roraima, Eloi Martins Senhoras, para falar sobre "A geopolítica e a pandemia da covid-19.
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