_
_
_
_
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

Havan no Vasco, a história em jogo por um patrocínio

Potencial patrocinador expõe encruzilhada de um clube com vocação popular atrelado à imagem do empresário que repele ativismo em prol das minorias

Alexandre Campello e Luciano Hang negociam patrocínio da Havan ao Vasco.
Alexandre Campello e Luciano Hang negociam patrocínio da Havan ao Vasco.
Mais informações
Luciano Hang e o pelotão de empresários ‘anticomunistas’ pró-Bolsonaro
A cínica homenagem do Vasco ao cartola que serviu à ditadura
Como o Flamengo se tornou instrumento político da extrema direita

Na última terça-feira, o presidente vascaíno Alexandre Campello visitou a sede da Havan, em Santa Catarina, para tratar com Luciano Hang de um possível patrocínio. O empresário se interessou em expor sua marca no uniforme do time carioca após um grupo de torcedores subir a hashtag #HavanNoVasco. No mundo ideal, instituições esportivas rejeitariam investimentos de empresas com as quais não partilham valores. No sistema mercantilista do futebol, porém, dinheiro está acima da própria história dos clubes. A aproximação entre Vasco e Havan se encaixa nesse contexto.

A questão vai além do pragmatismo, do “pagou, levou”. Contratos de publicidade da Havan, em geral, estão atrelados ao alinhamento ideológico com patrocinados. Entre vários exemplos, a empresa vetou recentemente propagandas na Globo por discordar da linha editorial da emissora. Várias personalidades com as quais mantém acordos publicitários se engajaram durante a última eleição na campanha do presidente Jair Bolsonaro, a quem Hang permanece fiel. O Athletico Paranaense, outro time da primeira divisão patrocinado pela Havan, chegou a ser multado em 70.000 reais pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) por fazer manifestação política ao usar uma camisa semelhante à confeccionada pelo empresário com mensagem de apoio subliminar a Bolsonaro.

Como agiria o Vasco, clube que se tornou popular por agregar negros, pobres e operários no início de sua trajetória pelo futebol, vinculado a uma empresa cujo dono tacha de “mimimi” a luta contra o racismo e a desigualdade? É verdade que o time de São Januário está sufocado por dívidas, deve pelo menos dois meses de salários ao elenco principal e não consegue pagar em dia nem mesmo o salário de seus funcionários mais humildes, que têm sofrido com privações diante de tantos atrasos. Novas receitas, neste momento, são essenciais para as contas cruzmaltinas.

Porém, é bom que os dirigentes saibam onde estão pisando. Por toda sua história, o Vasco tem a obrigação de expressar claramente a qualquer patrocinador potencial —sobretudo a um peculiar como a Havan, dirigida por empresário bolsonarista e caricato agitador da extrema direita no país— os princípios corroborados por boa parte da torcida antes de celebrar os termos do acordo. Até porque a adesão a causas sociais é uma página em aberto no presente do clube, que, para realmente honrar a tradição, demanda engajamento ainda maior a favor das minorias que configuram sua identidade.

Depois de uma mobilização que rendeu mais de 150.000 novos sócios nas últimas semanas, a gestão Campello, em que pese o aperto nas finanças, precisa ponderar se as cifras oferecidas compensam o desgaste de associar a imagem do time a um patrocinador que atrela marketing à militância por valores opostos aos que deveriam nortear a instituição. Enquanto uma parcela apoia o patrocínio, muitos vascaínos que reverenciam o imaginário de clube inclusivo —e têm aderido a campanhas de enfrentamento ao racismo e cânticos homofóbicos nas arquibancadas— se posicionam contrários ao acerto com a Havan.

O futebol, como outras atividades, obedece à lógica impositiva das relações econômicas, em que dinheiro no bolso não costuma ver cara nem coração. Mas o Vasco, como outros times que simbolizam a paixão pelo esporte mais popular do país, carrega o valor intangível de milhões de torcedores representados por suas cores. Princípios são inegociáveis. Independentemente do desfecho das tratativas com a Havan, o clube sempre deve prevalecer sobre os caprichos de investidores e empresários.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_