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Indústria da moda pede esclarecimento sobre couro brasileiro após crise na Amazônia

Compradores, que incluem marcas como Dolce & Gabbana, Gucci e Timberland, cogitaram cancelar pedidos, afirma entidade representante dos curtumes

Fogo consome floresta em Novo Progresso, no Pará.
Fogo consome floresta em Novo Progresso, no Pará.Leo Correa (AP)

A crise ambiental desencadeada pelo aumento das queimadas na Amazônia e pela reação tardia do Governo começa a ter reflexo no mercado brasileiro. Na terça-feira o Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil enviou um comunicado ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, informando que ao menos 18 marcas estrangeiras —dentre elas Timberland e Vans— haviam suspendido a importação do couro nacional em função das queimadas. Nesta quarta-feira a assessoria de imprensa da entidade divulgou novo texto afirmando que não houve “suspensão” de compra, mas apenas “pedidos de informação sobre a procedência do couro”.

“As grandes marcas internacionais são clientes nossos, Dolce & Gabbana, Gucci... Eles são muito exigentes com relação às certificações", afirmou José Fernando Bello, presidente do Centro. “Neste momento em que há clamor mundial pela Amazônia acendeu a luz vermelha pra eles. Num primeiro momento eles nos contataram e informaram que poderiam cancelar. Mas não houve cancelamento e, sim, pedido de informações adicionais”. De acordo com Bello, os curtumes brasileiros “se modernizaram”, e possuem todas as certificações necessárias, algumas concedidas por órgãos europeus. No entanto, ele afirma que “é preciso um cuidado na comunicação: para construir uma imagem é difícil, para destruir são dois minutos”.

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A nota inicial endereçada a Salles e assinada por Bello dizia que “recentemente, recebemos com muita preocupação o comunicado de suspensão de compras de couros a partir do Brasil de alguns dos principais importadores mundiais”. De acordo com Bello, este cancelamento “foi justificado em função de notícias relacionando queimadas na região amazônica ao agronegócio do País”. Ainda segundo o presidente do Centro, a escalada do boicote pode ser desastroso “para uma nação que exporta mais de 80% de sua produção de couros, chegando a gerar 2 bilhões de dólares em vendas ao mercado externo em um único ano”. Por fim, o texto afirma que “é inegável a demanda de contenção de danos à imagem do país no mercado externo sobre as questões amazônicas”.

A nova nota, divulgada após a repercussão do anúncio da suspensão das exportações, adota outro tom: “Recebemos a solicitação de levantamento de informações por parte de importadores mundiais de couro acerca do produto brasileiro, em função de notícias relacionando queimadas na região amazônica ao agronegócio do país. O indicativo de suspensão de pedidos, no entanto, não se confirmou”. O texto prossegue, dizendo que “os curtumes brasileiros têm total segurança sobre a origem de sua matéria-prima, manejo e processos”.

Preocupação com as exportações

O gesto da indústria da moda é o primeiro sinal público de uma possível consequência econômica diante da crise amazônica. O temor aflige até setores menos verdes, como o agronegócio, que teme ações como embargo à carne e aos grãos produzidos aqui nos mercados europeus. A Finlândia, que ocupa a presidência rotativa da União Europeia, chegou a sugerir que o bloco analise a possibilidade de proibir a entrada da carne brasileira no mercado comum europeu. ”Quando se trata de mudança climática, a situação é extremamente séria e precisamos agir rapidamente”, afirmou o primeiro-ministro Antti Rinne. Até o momento, no entanto, a UE não embarcou na sugestão finlandesa.

Blairo Maggi, um dos maiores produtores de soja do mundo, afirmou em entrevista ao Valor Econômico que as queimadas e o desmatamento podem levar a um “boicote às nossas exportações”. “O mundo depende de nós agora, mas, daqui a pouco, se inverte e ficamos chupando o dedo”, afirmou. De acordo com Maggi, a retórica inflamada de Bolsonaro apenas prejudica o setor. “Quando estou exportando, eles [importadores] querem saber mais do que nunca a origem da certificação do meu produto”, explica. “Os importadores, principalmente europeus, vêm visitar mais as lavouras, a produção, e querem saber mais como produzimos. E, se plantamos em área desmatada, eles não compram. Então, o discurso só atrapalha”.

Além do risco de um boicote aos produtos agropecuários brasileiros, outro revés financeiro já está em curso. A Noruega e a Alemanha suspenderam repasses de quase 300 milhões de reais ao Fundo Amazônia, entidade responsável por fomentar e gerir projetos ambientais na região. Os dois países acusam Bolsonaro de falta de compromisso com a preservação. Recursos internacionais são responsáveis por quase 99% do dinheiro do Fundo, que é utilizado pelos governos estaduais para a compra de viaturas e aeronaves de combate a incêndio, e também por ONGs conservacionistas.

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