Debate da Previdência se alonga e primeiro teste na Câmara deve ser nesta quinta
Proposta de reforma teve novas alterações, mas não houve concessões para policiais, apesar de aceno de Bolsonaro. “Foi um jogo de cena do Governo”, avaliou líder de agentes penitenciários
Pela segunda vez em uma semana, o relator Samuel Moreira (PSDB) alterou o seu parecer sobre a reforma da Previdência que tramita na Câmara dos Deputados. Desta vez, tentou-se chegar a um acordo com algumas categorias para que todo o texto fosse votado e aprovado no colegiado ainda na noite de quarta-feira. Em vão. O debate entrou madrugada adentro e a votação na comissão especial, o primeiro teste do projeto na Casa, foi convocada para esta quinta-feira às 9h. O presidente da comissão Marcelo Ramos abriu o procedimento de votação antes mesmo de encerrar a sessão por volta da 1h30 da manhã, o que deve impedir que novas alterações sejam feitas no texto.
Apesar de os líderes governistas, a mando do presidente Jair Bolsonaro, e de representantes do Centrão terem tentado construir um acordo com policiais civis, federais, rodoviários e agentes penitenciários para suavizar as regras de aposentadoria da categoria, nada andou. A estrutura básica da reforma, como a idade mínima de aposentadoria de 65 para homens de 62 para mulheres, com tempo de contribuição de ao menos 20 anos para ambos, foi mantida.
Ainda assim, balões de ensaio, o jargão para quando os protagonistas fazem circular versões para testar aceitação ou tumultuar negociações, foram lançados ao longo do dia. Um deles, previa que os servidores da segurança pública teriam a idade mínima de aposentadoria reduzida (de 55 anos 52 para as mulheres e 53 para os homens). Essa mudança envolveria um pagamento de pedágio de 100% para os trabalhadores que estão próximos de se aposentar. Ou seja, se faltassem dois anos para um policial se aposentar, ele teria de trabalhar mais quatro anos para receber o benefício de forma integral. A tentativa de negociação ocorreu um dia após policiais fazerem um protesto no Congresso no qual chamavam Bolsonaro de "traidor" –a base política do presidente tem nos agentes de segurança um bastião crucial.
Pouco antes do início da sessão que debateria o tema, o presidente da Câmara e principal articulador da reforma no Congresso Nacional, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que o acordo havia naufragado. “Em relação aos policiais, não teve acordo”, disse Maia. “Eu não acredito que o governo esteja trabalhando, já que não houve acordo, não vai trabalhar, para o destaque (sobre policiais) ser aprovado, quer dizer, derrubar as categorias do texto”, explicou o presidente da Câmara, argumentando que se uma categoria cai da reforma, podem cair todas.
De fato, quem negociou pelo governo com as lideranças partidárias foi o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que na prática perdeu a função de articulador do Executivo desde que Bolsonaro redistribuiu essa atribuição para a secretaria de Governo. Essa pasta, contudo, ainda está vaga. Seu titular, o general Luiz Eduardo Ramos, está sendo empossado na função nesta quinta-feira. O responsável por elaborar a proposta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, absteve-se de negociar neste momento.
Em princípio, parecia que os responsáveis pelo não andamento da proposta teriam sido os policiais. Mas, na prática, o Governo Bolsonaro não colocou sua sugestão no papel e os servidores queriam, na verdade, outros benefícios como a integralidade e a paridade já aos 55 anos de idade, com 30 de contribuição. Também queriam regras semelhantes à dos militares, como o pedágio de 17%, que estão em um projeto a parte enviado pelo Governo Bolsonaro. “A idade mínima nunca foi nosso problema. Queríamos mudanças nas nossas regras de transição”, diz o presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais Deolindo Paulo Carniel.
“Foi um jogo de cena do Governo, mas não deu certo”, avaliou o presidente da Federação Nacional dos Sindicatos dos Agentes Penitenciários (Fenaspen), Fernando Anunciação. Os sindicalistas agora contam que conseguirão aprovar um destaque de número 40, que trata especificamente da categoria dos agentes de segurança pública e os equipara aos militares. As entidades dizem que podem ter o apoio de até 35 dos 49 deputados da comissão.
No fim do dia, Bolsonaro admitiu que sugeriu mudanças para a aposentadoria de policiais que servem a União, mas reconheceu que a proposta não foi acatada. “Eu fiz uma excelente proposta, não aceitaram. Agora vai para o voto. O problema é que ninguém quer perder nada”, afirmou ao Estadão.
Sem contribuição extra para Estados e municípios
Apesar da falta de acordo com a categoria dos policiais, o relator atendeu ao pedido dos líderes partidários, e excluiu na nova versão do texto a possibilidade de Estados e municípios cobrarem contribuições extraordinárias de seus servidores. No antigo parecer do relator, havia uma brecha para que as unidades federativas aprovassem leis próprias para a cobrança dessas alíquotas em caso de déficits.O tema era um entrave para que a reforma avançasse na Câmara. A possibilidade desse tipo de contribuição ficou apenas para os servidores da União.
Após muitas críticas da oposição, Moreira também escreveu uma nova ressalva quanto às exigências para o recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) — já havia sido retirada a proposta de mudança que veio da equipe de Paulo Guedes. Nesta terceira versão do texto, ele garante que mudanças nos critérios de vulnerabilidade social poderão ser feitas por lei. Hoje, o benefício é um pagamento assistencial de um salário mínimo para idosos a partir dos 65 anos ou para deficientes físicos que tenham renda inferior a um quarto do salário mínimo.
Por fim, o relator alterou ainda a regra em relação à Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL). O novo texto restringiu o aumento dessa alíquota de 15% para 20% apenas para os bancos. Na versão anterior, o aumento da cobrança valeria para todas as instituições financeiras, menos para a Bolsa de Valores.
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