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O breve discurso de Bolsonaro decepciona em Davos

Falta de detalhes sobre medidas concretas gera frustração na audiência do Fórum. “Foi um pouco decepcionante, mas a verdade é que as metas que fixou foram alentadoras”, avaliava o economista-chefe da seguradora de riscos IHS

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Havia expectativa no Fórum Econômico Mundial quanto à estreia de Jair Bolsonaro no cenário internacional, em sua primeira viagem desde a posse como presidente, no último dia 1º. E, se o que os investidores esperavam de seu discurso era algum detalhe sobre as prometidas reformas, a decepção foi inevitável. Bolsonaro estimulou os investidores a apostarem num novo Brasil livre de corrupção e se comprometeu com a abertura comercial e econômica da maior economia latino-americana.

Num dos discursos mais curtos já vistos numa sessão inaugural do fórum de Davos –15 minutos ao todo, incluindo a apresentação feita pelo fundador do evento, Klaus Schwab, e as perguntas posteriores–, Bolsonaro repetiu suas principais promessas eleitorais e demonstrou suas raízes populistas. “Tendo como lema Deus acima de tudo, acredito que nossas relações trarão infindáveis progressos para todos.”, disse ao concluir sua intervenção inicial. “Não queremos uma América bolivariana como havia antes no Brasil com outros Governos. Quero lhes deixar claro que a esquerda não vai prevalecer na América Latina, o que é muito positivo para a região e para todo o mundo”, acrescentou ao final de sua fala no auditório principal do centro de convenções de Davos.

No discurso, o presidente brasileiro fez uma inflamada defesa da abertura comercial do Brasil —“Nós nos necessitamos mutuamente”, admitiu— e de uma melhoria no ambiente de negócios. “Pedi ao meu ministro da Economia que faça o necessário para situar o Brasil entre os 50 melhores países para fazer negócios”, comparado à 109ª colocação que o país ocupava na última pesquisa do Banco Mundial. Contrariando as posições protecionistas que o Brasil tradicionalmente manteve nas reformas comerciais globais, Bolsonaro defendeu a integração do Brasil no mundo “com uma defesa ativa da segurança jurídica e da Organização Mundial do Comércio” — um posicionamento tão enfático que é inédito a um líder brasileiro. Também se comprometeu a reduzir a presença do Estado na economia, a promover uma reforma tributária e eliminar “qualquer viés ideológico para fazer negócios”.

Se sua intervenção serviu para medir quais serão suas prioridades de Governo, como aponta William Jackson, economista-chefe de mercados emergentes da Capital Economics, o presidente do Brasil pôs o comércio à frente da reforma fiscal e da reforma previdenciária, tão esperada por parte dos investidores. Em troca, suavizou sua posição com relação ao meio ambiente e à utilização das terras protegidas para a agricultura e a pecuária. “O Brasil é um modelo a seguir na proteção do meio ambiente. É um paraíso natural que não é suficientemente conhecido”, disse Bolsonaro, o mesmo que indicou para o ministério do meio ambiente o advogado Ricardo Sallles, apoiado por ruralistas e alvo de ação de improbidade administrativa, acusado de manipular mapas de manejo ambiental do rio Tietê.

Além disso, ele se comprometeu a combater a corrupção, a lutar contra a lavagem de dinheiro e a melhorar a segurança nas cidades, “para que venham nos visitar”. Sobre detalhes, apelou à presença do ministro da Justiça, o ex-juiz Sergio Moro, responsável por levar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à prisão, e que também participa da delegação brasileira que viajou à Suíça. Prometeu ainda “proteger a família, os verdadeiros direitos humanos e o direito à vida”.

Bolsonaro falou a investidores de forma mais descontraída na noite desta terça-feira

“Você ouviu o Bolsonaro? Acho que foi péssimo”, comentou um executivo bancário com investimentos na América Latina.

“Foi um pouco decepcionante que não houvesse muitos dados concretos sobre o que ele pensa fazer, mas a verdade é que as metas que fixou foram alentadoras”, avaliava, muito mais positivamente, o economista-chefe da seguradora de riscos IHS, Nariman Behravesh. Robert Shiller, prêmio Nobel de Economia e professor na Universidade de Yale, resumiu: "Ele me dá medo"."O Brasil é um grande país. Merece alguém melhor."

No Brasil, a Bolsa, que havia aberto o dia em baixa, aprofundou a tendência após o discurso de Bolsonaro e o real também retrocedeu frente ao dólar. Foi o segundo revés econômico do dia vivido pelo novo presidente: nesta terça, a Arábia Saudita suspendeu a importação de carne de frango de 33 dos 58 frigoríficos habilitados pelo Ministério da Agricultura para exportar para o país. A Arábia Saudita faz algumas exigências para reabilitá-los, mas a ação é interpretada como um recado ao novo Governo dos negócios que deverá perder se insistir na aproximação com Israel e na ideia de mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém.

*com agências internacionais

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