_
_
_
_

De ‘ouro verde’ a ‘diamante de sangue’: a queda em desgraça do abacate

Saciar a fome mundial de abacate tem um preço: florestas derrubadas e cartéis no México que entram no negócio de seu cultivo. Restaurantes da Irlanda e Grã-Bretanha pedem que a fruta tropical não seja mais utilizada por critérios éticos e ambientais

Vários restaurantes ingleses retiraram o abacate de seus menus.
Vários restaurantes ingleses retiraram o abacate de seus menus. GETTY

Versatilidade. Bom gosto. Valores nutricionais imbatíveis. Propriedades como ingrediente em seus cremes. E uma vistosa cor verde que serve para inúmeras composições no Instagram. Na era do food porn e da comida saudável, o abacate tinha tudo para dar certo. Mas sua reputação está em perigo justamente por conta da voracidade que desperta: somente na União Europeia as importações dessa fruta milenar se multiplicaram por quatro entre 2000 e 2017, chegando a 486.063 toneladas nesse ano de acordo com a base de dados Comtrade da ONU.

Mais informações
Como ser vegetariano e sobreviver às celebrações natalinas
O melhor e o pior do jejum intermitente, a dieta que fez sucesso em 2018
Quatro alimentos que aguçam o cérebro (e outros que põem tudo a perder)

Um chef com estrela Michelin, JP McMahon, levantou a polêmica ao fazer um pedido aos restaurantes irlandeses para que eliminem ou pelo menos reduzam a presença dos “diamantes de sangue do México” em seus menus em uma entrevista ao jornal Irish Independent. Compara sua produção à dos frangos em grande escala. Ele não usa abacates “pelo impacto que têm nos países de onde vêm: desmatamento no Chile, violência no México”. Faz referência a informações publicadas, entre outros veículos de imprensa, no The New York Times, que em março já alertava que os cartéis de droga entraram com tudo nesse próspero negócio. O principal país exportador é o México, onde falam de “ouro verde”, com um terço da produção global: são cultivados o ano inteiro na rica terra vulcânica de Michoacán. “É um dos milagres do comércio moderno que em 2017, que teve o recorde de ser o ano mais violento no México, esse Estado cheio de cartéis exportasse mais de 1,7 bilhão de libras de abacates Haas aos Estados Unidos”, afirmou o artigo.

Não são poucos os restaurantes, especialmente na Grã-Bretanha, que decidiram não utilizar abacates em suas cozinhas por motivos éticos e ambientais. Um dos últimos foi o Wild Strawberry Cafe, no condado de Buckinghamshire, após servir 1.000 pratos por semana com a fruta. Como disseram em sua conta no Instagram, vai contra os critérios de sazonalidade e proximidade, ao contrário de produtos locais como as abóboras e as maçãs. “As florestas estão diminuindo para dar lugar a plantações de abacate. A agricultura intensiva a essa escala contribui com o lançamento de gases do efeito estufa na atmosfera e pressiona os fornecimentos locais de água”, afirmaram. Espécies como a borboleta monarca, conhecida por suas longas migrações dos Estados Unidos e Canadá ao México, ficam em perigo com a destruição de seu ecossistema para o cultivo de abacates.

Até mesmo um restaurante vegetariano, o Wildflower, no sul de Londres, se arriscou a prescindir de suas excelentes gorduras. Seu chef, Joseph Ryan, vê semelhanças com a quinoa, que também sofreu uma queda vertiginosa de preços após se tornar moda anos atrás. O dono do Franks Canteen, Paul Warburton, também entrou no boicote. Como disse ao Express, o abacate se transformou no símbolo “chato” da globalização já que pode ser encontrado em qualquer café do mundo. “Além disso consome muita água e significa muitas árvores cortadas. Aqui tentamos trabalhar sazonalmente, e como os abacates serão sazonais no norte de Londres?”.

Mas nem todos os abacates vêm da América do Sul. A controvérsia por enquanto não chegou à Espanha, único país na Europa que se destaca em seu cultivo, com 107.000 toneladas exportadas em 2017: 17% a mais do que ano anterior e 79% a mais do que há cinco anos, de acordo com a Federação Espanhola de Associações de Produtores de Frutas e Verduras. Granada, Málaga e especialmente as Ilhas Canárias têm a temperatura ideal, mas a falta de água impede a expansão do abacate, que os agricultores pedem que seja aliviado com mais infraestrutura. Porque a cremosidade que fez do abacate um hit mundial - pode ser o ingrediente de molhos, comido com pão e batido - se deve justamente a sua grande necessidade hídrica. Uma plantação dessa fruta tropical precisa de quase o dobro em relação a uma floresta de tamanho equivalente, o que transforma sua produção em grande escala em pouco sustentável.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_