“Segunda independência do Brasil”: a Paulista comemora o triunfo de Bolsonaro
Cenário das manifestações que deram início à derrocada do PT reúne eleitores do ex-capitão irmanados contra o comunismo, movimentos sociais e até Pablo Vittar
Símbolo das manifestações de 2013 que culminaram com o impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, a avenida Paulista foi palco da comemoração pela vitória bolsonarista em São Paulo. Centenas de apoiadores do candidato Jair Bolsonaro (PSL) se concentraram principalmente no quarteirão onde está localizado o MASP. No entorno, eles soltavam rojões e cantavam o hino nacional reiteradas vezes.
A designer de interiores Samantha Thomaz decidiu ir ao local comemorar a vitória de Bolsonaro junto com o marido, Carlos Eduardo Moreira. Apesar de acreditar que o resultado eleitoral representa esperança para o Brasil, ela não acredita que haverá muitas mudanças nos próximos quatro anos. “Ele não vai conseguir arrumar um país que esteve mais de 12 anos nas mãos de uma facção como o PT”, opina. Para ela, a ação mais urgente do novo presidente deve ser combater a corrupção. “Tem que drenar o que está saindo pelo ralo para ter receita e melhorar de fato a vida do brasileiro”, defende.
Um pouco mais adiante, a turismóloga Ivanir Evaristo pulava com uma faixa na cabeça onde está escrito “Ele Sim”, também comemorando o resultado eleitoral. Mais otimista, ela diz que o novo presidente vai conseguir “limpar o governo da corrupção e tirar a petralhada do poder”. Segundo ela, saúde e educação são as medidas mais urgentes do novo presidente. “Principalmente a educação”, reforça, pouco antes de retomar os gritos de apoio a Bolsonaro.
No palanque, ativistas e políticos de movimentos como o Direita Brasil se revezavam nos discursos, citando a “refundação” e a “segunda independência do Brasil”, alguns versículos bíblicos e criticando a imprensa. Eles reiteravam o discurso de Jair Bolsonaro e afirmavam que este momento significa o fim da era do PT e do comunismo no Brasil. Atribuíam o resultado eleitoral ao “fim de uma luta” iniciada com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Pediam para que os famosos que afirmaram que deixariam o Brasil caso o candidato fosse eleito cumprissem a promessa, em especial a cantora Pabllo Vittar – que nunca prometeu se mudar do país. “Cuba te espera, Haddad e Manuela”, gritavam os apoiadores em resposta. Militantes também levavam bandeiras de Israel, o país mais reverenciado por Bolsonaro no exterior. Os últimos presidentes petistas também foram lembrados pelos puxadores do ato. “Vai pro inferno, Dilma!” e “Lula vai morrer na cadeia” arrancaram gritos fervorosos do público.
Na avenida Paulista, dezenas de manifestantes fazem fila para tomar fotos com os policiais que fazem a segurança do ato pela vitória de Jair Bolsonaro. O corpo policial foi aplaudido varias vezes, ao atuar em pequenos conflitos que ocorreram no local. pic.twitter.com/LaUlQrxBE1
— Beatriz Jucá (@beatrizjuca) October 29, 2018
A poucos metros do carro de som, próximo ao Parque Trianon, o analista de operações comerciais Caique Damasceno esperava com dois amigos em uma fila de dezenas de pessoas que tentavam tomar uma fotografia com um grupo de policiais escalados para fazer a segurança do ato pela vitória de Bolsonaro. Esteve cerca de dez minutos no local para conseguir a foto e ressaltou a importância desses profissionais para resolver o problema da segurança pública no Brasil, um dos mais graves na opinião dele, mas não necessariamente o mais irremediável. “A mudança mais urgente é lutar contra a corrupção e resgatar o patriotismo no Brasil”, afirmou. Damasceno também criticou a imprensa que trata o candidato do PSL como um político autoritário e de ultradireita. “Ele não é bem assim”, defendeu.
Pensamento semelhante ao do contador Alípio Pereira, 34, que saiu de Osasco para levar a mulher Marcileide e os dois filhos à celebração da vitória de Bolsonaro na Paulista. “Ele não é homofóbico nem preconceituoso. Apenas diz o que o povo pensa, fala como a gente.” Alípio é piauiense de São João do Piauí, cidade de 20.000 habitantes que rendeu 69% de votos a Haddad no primeiro turno. Ele, que votou duas vezes em Lula e Dilma, reconhece que “o PT ajudou o povo do Nordeste”, mas se desiludiu com o partido após a última eleição. Servidor concursado em São Paulo, onde vive desde 2010, ele lamenta apenas a eleição de João Doria ao governo estadual. “O PSDB massacra o funcionário público”, diz. Filho de pedreiro e uma costureira, Alípio se orgulha de poder pagar uma escola particular para o primogênito Gabriel, de 8 anos, e deseja viver em um país mais seguro. “Ladrão tem que ficar preso, não pode sair da cadeia. Estudei muito o Bolsonaro. Não votei nele por ser anti-PT, mas por ter as melhores propostas para o país.” Enquanto o pai dava entrevista, Gabriel gritava o lema de Bolsonaro correndo pela avenida: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.
O corpo policial que fazia a segurança no local foi aplaudido várias vezes pelos manifestantes. Houve dois princípios de tumulto durante o ato, mas a Polícia Militar contornou a situação: um pela presença de um grupo supostamente contra Bolsonaro que fazia um rolezinho no vão livre do Masp e por um rapaz que queimava uma lixeira na Avenida Paulista e foi detido pelos policiais. Nas duas ocasiões, manifestantes gritavam: “Viva a PM”.
Medo da repressão
Sem se importar com o fluxo crescente de pessoas vestidas de verde-amarelo, um grupo de moradores e artistas de rua, que expunha seus artesanatos na calçada da Paulista, gritava “Ele não” e “Somos a resistência”. “Bolsonaro não nos representa”, afirma Priscila Tappes. Na sexta-feira, eles alegam ter sofrido com uma ação violenta de guardas e fiscais, que teriam agredido uma mulher e levado objetos à força no local.
“Teve policial batendo no peito dizendo que hippie não vai pode trabalhar. A gente teme que a repressão aumente ainda mais com Doria e Bolsonaro no poder”, diz Gabriela Gomes, que se define como moradora de rua. Para a baiana Thaís Araújo, 22, que está em São Paulo há menos de um ano, e é mãe de Safira, de um ano, Bolsonaro representa um risco para as pessoas que vivem ou trabalham nas ruas. “Nossa existência está ameaçada. Votei contra ele por todos nós, mas, principalmente, pela minha filha.”
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