_
_
_
_
Análise
Exposição educativa de ideias, suposições ou hipóteses, baseada em fatos comprovados (que não precisam ser estritamente atualidades) referidos no texto. Se excluem os juízos de valor e o texto se aproxima a um artigo de opinião, sem julgar ou fazer previsões, simplesmente formulando hipóteses, dando explicações justificadas e reunindo vários dados

A história vazia

As imagens de Trump e Kim em sua cúpula de Singapura já são históricas, mas, ao contrário de todas as outras, esta é uma cúpula vazia, sem acordos firmes nem tratados

Lluís Bassets
Kim e Trump no Hotel Capella Sentosa de Singapura, durante sua reunião desta terça-feira.
Kim e Trump no Hotel Capella Sentosa de Singapura, durante sua reunião desta terça-feira.REUTERS
Mais informações
Trump impõe à força a nova ordem mundial
Trump enfrenta o cara a cara com o líder da Coreia do Norte ignorando as violações de direitos humanos
Por que o brutal Kim Jong-un baixou a guarda? A precária economia norte-coreana explica

As imagens de Trump e Kim em sua cúpula de Singapura já passaram ao álbum da história. Encontram-se ali com as de Reagan e Gorbachov em Reikjavik, Nixon e Mao em Pequim, e tantas outras, até a de Yalta com Churchill, Stálin e Roosevelt, com a qual se fundou em 1945 a época que agora termina.

Ao contrário de todas as outras, esta é uma cúpula vazia, sem acordos firmes nem tratados. Se é histórica, isso é porque foi preparada e fabricada para que esteja junto às outras no álbum da história. Este é o conteúdo do insólito encontro entre o ditador da Coreia do Norte e o presidente dos Estados Unidos, e não uma conversa ou um acordo que simplesmente não aconteceram.

Tudo vem determinado pela originalidade do método diplomático escolhido por Trump, que permite compreender o “sucesso impressionante”, nas palavras presidenciais, apenas três meses depois da maior troca de insultos e ameaças que o mundo contemporâneo já viu entre mandatários internacionais. Em vez de transformar o encontro no momento da rubrica e conclusão de um acordo longamente negociado, ambos chegaram à cúpula de mãos vazias, dedicaram seu encontro a trocar banalidades e elogios e terminaram assinando um comunicado cheio de ótimos propósitos, mas quase sem conteúdo.

Dos quatro pontos do comunicado, os três primeiros, dedicados ao restabelecimento de relações diplomáticas, retorno à paz em uma península formalmente em guerra e desnuclearização, não contêm compromissos, nem concreção, nem datas. O quarto é um compromisso, também sem datas, de ordem humanitária, embora muito concreto em relação à recuperação e repatriação dos prisioneiros de guerra e desaparecidos. Há resultados colaterais: o gesto de boa vontade prévio de Kim Jong-un, com o desmantelamento do campo de testes nucleares de Punggye-Ri, e o prêmio posterior de Trump quando declarou que “não haverá mais jogos de guerra” na Coreia do Sul, referindo-se às manobras anuais conjuntas cuja suspensão Pyongyang exige.

Kim sai crescido. Conseguiu, com seu encontro com o presidente, algo que nem sequer seu avô Kim Il-sung, o fundador da ditadura totalitária e da monarquia comunista, havia obtido. Trump, por sua vez, sai mais Trump. É sua apoteose, para a qual vinha preparando-se toda a sua vida. Isto é ser presidente, aparecer junto a mandatários perversos que foram convencidos a assinar simulacros de acordos ou de alianças favoráveis; entrar no álbum da história, junto dos grandes, mesmo sem ter feito nada grande.

Seria bom para os Estados Unidos e para o mundo um rápido e bem-sucedido desenrolar dos quatro pontos do acordo. O mundo será mais estável e mais seguro com uma Coreia do Norte desnuclearizada, com plenas relações diplomáticas com os Estados Unidos e com uma península da Coreia definitivamente pacificada. Mas não pede tanto a época das notícias falsas e das pós-verdades, da diplomacia do tuíte e da cultura instantânea, que olha a história como um mero qualificativo hiperbólico sem relação com o passado. Basta-lhe uma cúpula vazia.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_