O abandono da Primeira Liga
Presidente da competição, Marcus Salum cogitou fazer a competição durante a Copa do Mundo. Mas ele oficializou a decisão de não realizá-la nesta terça-feira (27)
Quando o Fluminense derrotou o Atlético-PR, em abril de 2016, e se sagrou campeão da edição inaugural da Primeira Liga, muitos especulavam sobre o valor histórico daquele fato. Dali a cinquenta anos, o título do tricolor carioca poderia ser lembrado como o primeiro de uma era moderna na qual o futebol brasileiro enfim teve um campeonato nacional organizado pelos clubes, sem a influência da CBF ou de emissoras de televisão. Mas, para que tal cenário fosse possível, era preciso que a competição aumentasse sua repercussão e cativasse o público – algo que, já no segundo ano, não aconteceu. Tão esvaziada foi a edição de 2017 que colocou em dúvida a realização de uma terceira, em 2018. Afinal, vai ter Copa? “Entendemos que está muito em cima para colocar a Primeira Liga no calendário da forma que queremos neste ano”, responde Marcus Salum, presidente do América-MG e da Primeira Liga desde dezembro do ano passado. A nota oficial, divulgada nesta terça (27), confirma: “a competição não será realizada em 2018”.
A ideia do campeonato surgiu ainda em 2015, formada primeiro por equipes do Sul do Brasil e de Minas Gerais, que logo ganharam o apoio de Flamengo e Fluminense, rompidos com a FERJ (Federação Estadual de Futebol do Rio de Janeiro). “A Liga surgiu por conta da insatisfação de muitos clubes com a atratividade de seus campeonatos estaduais”, explica Eduardo Bandeira de Mello, presidente do Flamengo desde 2013 e um dos mandatários à frente do projeto em seu início. “Nunca ficou explícito que a Primeira Liga seria um embrião de uma liga nacional. O objetivo era fazer algo mais atrativo que os estaduais, do ponto de vista esportivo e econômico”. Ao lado de Bandeira de Mello, Gilvan Tavares, presidente do Cruzeiro, Nilton Machado, do Avaí, Mario Celso Petraglia, do Atlético-PR, e Alexandre Kalil, ex-presidente do Atlético-MG, apareciam como os mais destacáveis na organização.
Os últimos meses de 2015 ainda reservaram confusões àqueles que queriam colocar a Primeira Liga em prática. A CBF chancelou a competição, recuou em meados de outubro e mudou de ideia outra vez em dezembro, depois de alguns clubes envolvidos com a Liga colaborarem para a eleição de Coronel Nunes, substituto do investigado Marco Polo Del Nero na presidência da Confederação. Kalil ainda deixou a organização alegando “sabotagem” no fim do ano.
Já 2016 começou com Gilvan anunciando um acordo com a Rede Globo para a transmissão da Liga, que iniciaria no dia 27 de janeiro. Três dias antes, a CBF afirmou em nota oficial que não autorizava o início do campeonato, declaração que não atrasou o primeiro jogo e nem intimidou a cúpula. “Tivemos muitas dificuldades com a CBF”, comenta Salum, membro do conselho do América-MG na época, que já participava da competição. “Infelizmente, com o processo político da Confederação, há uma supervalorização das federações”, argumenta ele para reforçar que é de interesse da CBF que competições mais atrativas não substituam os estaduais.
Depois de um primeiro ano no qual a Primeira Liga foi realizada ao longo de três meses e teve relativo sucesso, 2017 começou com uma diferença brusca de datas reservadas para jogos do torneio. Com o aumento de clubes (12 para 16) e a extensão da Libertadores no calendário brasileiro, a competição se tornou espaçada. “Tivemos que fazer o campeonato em duas partes. Os mata-matas foram quatro meses depois da fase inicial”, explica Bandeira de Mello. O Fluminense abriu a competição contra o Criciúma no dia 24 de janeiro e concluiu sua primeira fase apenas no dia 26 de abril, contra o Brasil de Pelotas. A fase seguinte só aconteceu em 30 de agosto. “A Primeira Liga ficou desacreditada pelo ‘estica e puxa’ pelo qual passou”, acredita Marcus Salum. Naturalmente, as equipes que chegaram às fases finais, como Flamengo, Cruzeiro e Atlético-MG, pouparam seus principais nomes, o que resultou em baixos números de audiência e público, mesmo em jogos decisivos. “Essa queda de prestígio se deve ao fato da Liga não ter sido incluída no calendário da CBF. O ano ficou muito carregado para as equipes mais importantes e elas não puderam ser representadas pelos melhores jogadores”, diz Salum.
Procurada pelo EL PAÍS, a CBF afirmou não estar interessada em ter outra competição no calendário. “A inclusão de um novo torneio requer análise, estudo e a certeza de que terá continuidade. A CBF está satisfeita com o trabalho e quer aumentar o valor das competições já criadas”, diz a nota da entidade.
No entanto, a declaração oficial divulgada pela Primeira Liga no último dia 27 fala em negociações com TV e CBF para a realização de um campeonato “forte e estruturado” já no começo de 2019. “Na última semana, reuniões com a Confederação Brasileira de Futebol e com a Rede Globo deixaram adiantadas as tratativas para um torneio no início da temporada 2019, com quatro a sete datas, com término até março”. Assim como a nota, o presidente enxerga com otimismo a volta da Copa: “Primeiro, temos que recuperar a competição, colocá-la no eixo e deixar claro o que queremos. Vamos valorizar o campeonato e tenho certeza de que os clubes vão comprar a ideia”. Bandeira de Mello, mesmo mais distante da cúpula, tem opinião parecida. “Sabíamos que o movimento enfrentaria dificuldades e poderia inexistir nos primeiros anos”, afirma. “Os clubes terão que demonstrar união, mas vejo a Primeira Liga sendo aperfeiçoada ao longo dos anos”.
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