Intervenção federal trouxe o populismo de volta pelas mãos da direita, diz marqueteiro político
Estudo realizado por André Torretta aponta que a maioria da população acha que é preciso fazer algo para combater a violência, mas não acredita no sucesso da ação


Antes mesmo da trágica execução da vereadora Marielle Franco, a intervenção federal no Rio trazia mais dúvidas que alento à população, segundo levantamento feito pelo marqueteiro político André Torretta, da Ponte. Embora a maior parte dos brasileiros acredite que é necessário tomar medidas para combater a violência no Rio de Janeiro, são poucos os que confiam no êxito da intervenção federal que completou um mês na semana passada. Com base em pesquisas quantitativas e qualitativas, Torretta concluiu que a população não está certa sobre o sucesso da operação. "A interpretação é que a população realmente tem dúvida se temos uma bala de prata ou se essa intervenção foi apenas um tiro de festim", diz o marqueteiro.
Ele cruzou dados, entrevistou pessoas e se embasou em números para concluir o estudo intitulado Rio de Janeiro e a violência: O grande fato político do momento. Na interpretação de Torretta, a ação no Rio simboliza "a volta do populismo pelas mãos da direita". Até então, o populismo sempre foi um termo associado à esquerda, por meio de programas como o Bolsa Família ou Luz para Todos.
Agora, muitos dos entrevistados dizem que a intervenção federal é uma "ação de marketing eleitoral para melhorar a imagem do presidente". Nesta esteira, o estudo questiona a falta de credibilidade do presidente Michel Temer - com apenas 4% de aprovação - para realizar uma "ação drástica como essa". "A grande pergunta é: o Governo Temer sairá vitorioso desta ação?", avalia o especialista. Temer já deixou claro a interlocutores que não desistiu de se candidatar para 2019. Assim, a ação no Rio tem um peso grande para suas ambições políticas.
O tempo da intervenção também é um fator importante para medir seu êxito. "Será que temos tempo eleitoral para mostrar resultados no Rio?", questiona Torretta. "E como será medido o sucesso da operação? O Governo tem credibilidade para apontar números positivos?". Essas duas variáveis, diz ele, são importantes na hora de calcular o triunfo da operação.
Para muitos dos entrevistados pelo estudo, a sensação é de que algo precisa ser feito, mas ninguém conseguiu apontar uma medida específica a ser tomada. "Não sei se vai resolver... não sei mesmo. Sei que precisa fazer alguma coisa... do jeito que estava, não podia ficar", foi o que disse um deles. A frase dá o tom da falta de crença na intervenção, ao mesmo tempo em que mostra a necessidade por alguma atitude do Governo.
Esta descrença no sucesso da intervenção federal se baseia nos seguintes fatores, segundo o levantamento: na falta de planejamento da ação e no fato de não englobar todas as questões necessárias para solucionar, de fato, o problema da violência - desemprego, educação, a questão do armamento e o tráfico. Também foram mencionados os possíveis problemas de convivência dos militares com a população, lembrando de uma experiência passada em que o Exército esteve no Complexo da Maré, em março de 2014. "Vou dar um exemplo: as forças militares ficaram 14 meses no Complexo da Maré... foram gastos milhões e milhões de reais. Após estes 14 meses, o Complexo da Maré continua a mesma coisa", exemplificou outro entrevistado.
Muitos lembram que a problemática não é tão simples assim de ser resolvida. "Se vai resolver? Isso eu não sei. Espero que sim... Mas só o Exército não vai funcionar", afirmou uma das entrevistadas para o estudo. "O problema é maior, o Exército já esteve lá. O problema passa por educação, emprego, saúde, tanta coisa", disse. Ainda assim, os entrevistados fazem uma ressalva: "esperam, com muita esperança, estarem errados [quanto à descrença na intervenção]".
O levantamento também detectou a falta de esperança em relação aos rumos políticos do país. Concluiu que as notícias sobre a retomada da economia não causam nenhum efeito na população, que sente que nada tem mudado desde o Governo Dilma Rousseff. Os principais problemas do Brasil seguem sendo educação, corrupção, desemprego e saúde, nesta ordem, segundo o estudo. "Mas o que chama a atenção é a falta de otimismo, de uma luz no fim do túnel", diz a pesquisa.