União Europeia e EUA pressionam Brasil por mais informações sobre o escândalo da carne
Embaixador da UE no país diz que é preciso saber se problema é "pontual" ou afeta sistema João Cravinho afirma que achados da Operação Carne Fraca são "perturbadores"
A União Europeia demonstrou preocupação e cobrou o Governo Michel Temer a respeito do escândalo deflagrado na sexta-feira pela Operação Carne Fraca, que investiga um esquema de fraude e propina envolvendo fiscais e frigoríficos no Brasil, maior exportador de carne do mundo. O embaixador da UE no país, João Cravinho, informou que uma carta foi enviada de Bruxelas a Brasília com dois questionamentos centrais: a extensão do problema, se pontual ou com capacidade para ameaçar o sistema de controle brasileiro, e a existência ou não de carregamentos destinados a Europa que podem estar sob suspeita.
Cravinho foi convidado a se reunir com o presidente Temer neste domingo em um encontro de emergência para discutir o tema do qual devem participar ainda o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, e representantes do setor. "Temos um comércio intenso, que funciona 24 horas, e precisamos ter todas as garantias de que os consumidores europeus não correm risco", disse Cravinho ao EL PAÍS neste sábado. O Brasil exportou cerca de 2,5 bilhões de dólares de carne, frango e derivados para a União Europeia em 2016. Nos dois primeiros meses de 2017, foram 42 milhões de dólares só em carne bovina, de acordo com a associação de exportadores brasileiros, só atrás de Hong Kong e China.
A operação da PF teve como alvo 29 companhias do setor, incluindo as duas gigantes JBS, das marcas Friboi, Seara e Big Frango, e a BRF, dona da Sadia e Perdigão. De acordo com os investigadores, um lote de carne da BRF, com origem no frigorífico de Mineiros, em Goiás, agora interditado, foi barrado na Itália por suspeita de contaminação por salmonela, bactéria que causa vômito e diarreia. Cravinho classificou a informação de "profundamente perturbadora". "Estamos investigando a matéria. Nós temos um mecanismo de alerta sobre salmonela e outras ameaças à saúde na União Europeia", diz o embaixador.
Reembalagem de produtos fora do prazo de validade, substituição de carne por mercadorias mais baratas, como soja e frango, e até injeção de produtos potencialmente cancerígenos para disfarçar o mal estado da comida estão entre as irregularidades descritas na Carne Fraca. Três dos 21 estabelecimentos sob suspeita foram interditados, mas o Governo e o ministro Maggi tem insistido que se trata de um problema pontual _foram afastados 33 servidores da Agricultura num universo de mais de 10 mil_ e que é seguro comer carne.
As autoridades em Brasília não tem disfarçado o desconforto pelo que consideram ser uma espetacularização da PF numa operação que ameaça um comércio bilionário. Além da União Europeia, os EUA também informaram que estão monitorando a situação e pedindo informações ao Ministério da Agricultura. A agência responsável norte-americana tentou tranquilizar os consumidores afirmando que tudo o importado ao mercado doméstico passa por uma reinspeção. Neste sábado, o Planalto informou que o presidente Temer teve uma conversa telefônica, já previamente agendada, com o colega Donald Trump _a segunda desde que o republicano assumiu_, mas a nota não menciona o escândalo.
Negociações União Europeia-Mercosul
O escândalo atinge a indústria da carne brasileira num momento particularmente ruim, quando o país batalha para conseguir novos mercados para os produtos brasileiros enquanto pautas protecionistas ganham força catapultadas por Trump. A investigação também coincide com o renovado esforço do Governo Temer e Mauricio Macri, da Argentina, de fazer avançar o acordo de livre-comércio Mercosul-União Europeia. Nas negociações que se arrastam por quase uma década, um dos temas pendentes é justamente a inclusão da exportação de carnes do bloco à UE.
Na sexta-feira, uma fonte do Governo brasileiro disse ao jornal Valor Econômico que a administração teme que a operação da Polícia Federal dê munição ao lobby protecionista dos produtores europeus, que buscam barrar a concorrência de brasileiros e argentinos. "Claro que não vou lhe dizer que (o escândalo) torna o ambiente de negociação mais alegre", afirma o embaixador Cravinho, mas insiste, no entanto, que não é possível avaliar, sem saber a escala do problema, o impacto. "São duas questões inteiramente diferentes. Estamos falando de uma negociação para os próximos 20 anos", afirma ele, que diz esperar que todas as dúvidas sejam sanadas em breve. Mercosul e União Europeia tem uma nova rodada de negociações agendada entre os dias 20 e 24 em Buenos Aires.
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